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(da esquerda para a direita) O advogado Diogo Lacerda Machado, o ex-primeiro-ministro António Costa, o advogado João Tiago Silveira e Vítor Escária, ex-chefe de gabinete de António Costa
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(da esquerda para a direita) O advogado Diogo Lacerda Machado, o ex-primeiro-ministro António Costa, o advogado João Tiago Silveira e Vítor Escária, ex-chefe de gabinete de António Costa

(da esquerda para a direita) O advogado Diogo Lacerda Machado, o ex-primeiro-ministro António Costa, o advogado João Tiago Silveira e Vítor Escária, ex-chefe de gabinete de António Costa

Operação Influencer. O que foi perguntado e o que respondeu António Costa no DCIAP

Ex-PM recusou favorecimento da Start Campus, desconhecia o envolvimento de Lacerda Machado com a empresa e explicou, entre questões sobre os 75,8 mil euros, o que Vítor Escária fazia em São Bento.

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António Costa foi considerado suspeito pelo Ministério Público da alegada prática do crime de prevaricação em novembro de 2023, mas certo é que, volvidos seis meses e após uma inquirição de hora e meia, a procuradora Rita Madeira não viu indícios suficientes para constituir o ex-primeiro-ministro como arguido.

Ao que o Observador apurou, a procuradora titular dos autos, que nasceram de uma certidão extraída dos autos da Operação Influencer, não confrontou António Costa com qualquer suspeita conta si nem com as mais de 20 escutas telefónicas que foram enviadas para o Supremo Tribunal de Justiça por envolverem o ex-governante de forma acidental e indireta.

António Costa foi questionado sobre os principais arguidos da Operação Influencer, nomeadamente Diogo Lacerda Machado (seu amigo e consultor da Start Campus), Vítor Escária (seu ex-chefe de gabinete) e João Tiago Silveira (coordenador do processo legislativo do Simplex Industrial e do Licenciamento). Mas sempre numa perspetiva de testemunha, e nunca como suspeito de algo.

O ex-primeiro-ministro recusou qualquer favorecimento à Start Campus e diz que a lei que foi aprovada é genérica, promove a desburocratização, o dinamismo económico e não foi feita à medida da empresa do mega data center projetado para Sines.

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A diligência no DCIAP

Eram cerca das 15h do dia 24 de maio quando António Costa e o seu advogado João Lima Cluny entraram nas instalações do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), localizadas mesmo em frente à sede nacional da Polícia Judiciária, no centro de Lisboa. Identificaram-se junto do segurança, logo à entrada, entraram no elevador e subiram ao 5.º piso do edifício que serve de casa profissional ao departamento de elite do Ministério Público criado em 1999 — um pouco antes de o próprio António Costa ter sido promovido a ministro da Justiça no segundo Governo de António Guterres.

[Já saiu o terceiro episódio de “Matar o Papa”, o novo podcast Plus do Observador que recua a 1982 para contar a história da tentativa de assassinato de João Paulo II em Fátima por um padre conservador espanhol. Ouça aqui o primeiro episódio e aqui o segundo episódio.]

Como em todos pisos do DCIAP, com a exceção do piso onde funciona a secretaria do departamento, a porta de entrada nos gabinetes do 5.º piso necessita de uma autorização especial para entrar no corredor de acesso aos gabinetes — e é neste piso que o diretor do DCIAP, o procurador-geral adjunto Francisco Nascimento, tem o seu gabinete.

Influencer. Costa suspeito de prevaricação devido a “lei malandra” negociada por Galamba e João Tiago Silveira

Um funcionário judicial abriu a porta de segurança do 5.º piso e orientou o ex-primeiro-ministro e os seus advogados (João Lima Cluny fazia-se acompanhar do seu colega Diogo Serrano) por um corredor. Passaram por uma porta para um gabinete à esquerda e entraram na melhor sala de reuniões do departamento.

Trata-se de uma sala que costuma ser utilizada em diligências por diversos procuradores — Costa não foi alvo de nenhum tratamento especial. O que foi perguntado pela procuradora Rita Madeira, coordenadora do DCIAP, e o que foi dito pelo ex-primeiro-ministro durante a hora e meia que demorou a diligência?

Costa duplamente em choque: pela existência dos 75,8 mil euros em dinheiro vivo e por saber que a origem dos fundos está sob investigação na Operação Influencer

António Costa foi questionado sobre o seu conhecimento dos aspetos centrais da Operação Influencer, nomeadamente sobre o seu envolvimento no processo legislativo do novo Regime Jurídico de Urbanização e Edificação que foi aprovado no Conselho de Ministros do dia 19 de outubro de 2023, e que foi coordenado por João Tiago Silveira. Mas também sobre a relação com o seu amigo Diogo Lacerda Machado e sobre o trabalho exato de Vítor Escária no Governo enquanto chefe de gabinete do primeiro-ministro.

O ex-governante rejeitou sempre qualquer espécie de favorecimento à Start Campus ou irregularidade no processo legislativo do chamado Simplex Industrial — e defendeu o trabalho do seu Governo na captação de investimento internacional fundamental para o desenvolvimento do país.

Explicando por partes — e começando por Escária.

Origem dos 75.800 euros está a ser investigada no âmbito da Operação Influencer

Costa foi questionado sobre as competências de um chefe de gabinete do primeiro-ministro. A procuradora Rita Madeira quis saber com algum grau de pormenor qual era o trabalho exato de Vítor Escária. Entre elogios à competência e capacidades profissionais de Escária, Costa explicou o quotidiano complexo de uma pessoa que lidera um gabinete do chefe de Governo — e que nada tem a ver questões de secretariado.

Na prática, além de toda a coordenação do gabinete de São Bento (que, por sua vez, também coordena a atividade dos vários ministérios), um ex-chefe tem particular influência na abertura ou no fecho de portas a quem quer aceder ao primeiro-ministro e na filtragem da informação que lhe chega. É um cargo de grande importância em qualquer Governo e o seu titular carece de uma grande confiança pessoal — confiança que António Costa considerou “traída” numa declaração ao país no dia 11 de novembro de 2023.

A magistrada titular do inquérito que desceu dos serviços do MP no Supremo Tribunal de Justiça quis ainda colocar perguntas sobre os 75.800 mil euros em dinheiro vivo encontrados pelo procurador Rosário Teixeira no gabinete de Vítor Escária.

Além de ter reafirmado o que já tinha dito publicamente em várias ocasiões (ver aqui e aqui), nomeadamente que ficou em “choque” com o dinheiro descoberto no gabinete de Escária, António Costa afirmou que tinha a ideia de que esse tema não tinha relação com a Operação Influencer. Perante uma resposta em forma de pergunta da procuradora Rita Madeira (“e se tivesse?”), o ex-primeiro-ministro disse que, então, ficaria duplamente chocado.

Além de ter reafirmado que ficou em "choque" com o dinheiro descoberto no gabinete de Vítor Escária, António Costa afirmou que tinha a ideia de que esse tema não tinha relação com a Operação Influencer. Perante uma resposta em forma de pergunta da procuradora Rita Madeira ("e se tivesse?"), o ex-primeiro-ministro disse que, então, ficaria duplamente chocado.

Já na entrevista que deu ao programa de Cristina Ferreira na TVI no início de maio, António Costa tinha afirmado que o “Ministério Público já esclareceu que esse dinheiro [os 75.800 euros em dinheiro vivo] não tem nada a ver com este processo”.

Ora, não só nunca houve nenhum esclarecimento oficial do Ministério Público sobre essa matéria, como o Observador já tinha noticiado a 12 de abril que a origem de tais fundos estava, e está, efetivamente sob investigação dos procuradores João Paulo Centeno, Hugo Neto e Ricardo Lamas nos autos originais da Operação Influencer — e que nada têm a ver com António Costa.

O advogado Tiago Rodrigues Bastos, defensor de Vítor Escária, confirmou que nunca tais factos relacionados com a apreensão dos 75.800 euros foram separados dos autos do caso Influencer.

A amizade com Diogo Lacerda e o almoço no Solar dos Presuntos

Tendo em conta que o inquérito aberto nos serviços do Supremo Tribunal de Justiça visava o próprio António Costa, a partir de vários indícios e do conteúdo de 20 escutas telefónicas que envolvem indiretamente ou acidentalmente o ex-primeiro-ministro, seria natural que a procuradora Rita Madeira tivesse confrontado Costa com as suspeitas originais de prevaricação. Contudo, tal não aconteceu.

O ex-primeiro-ministro foi questionado sobre vários aspetos da Operação Influencer, mas sempre numa perspetiva de testemunha — ou de “declarante”, citando o comunicado da defesa. Costa nunca foi confrontado com qualquer suspeita sobre si, o que revela uma evolução muito significativa da análise que o MP faz dos indícios reunidos contra o ex-governante.

Por outro lado, uma das curiosidades da procuradora Rita Madeira prendeu-se com a relação de António Costa com Diogo Lacerda Machado. Confirmando que é seu amigo próximo e seu padrinho de casamento, o ex-primeiro-ministro declarou que não sabia que Diogo Lacerda Machado estava a colaborar com a Start Campus.

“Um primeiro-ministro não tem amigos”. Costa diz que não autorizou Lacerda Machado a fazer nada

É certo que se recorda de o ter visto na cerimónia do projeto do data center da Start Campus, que ocorreu no dia 23 de abril de 2021 e que teve a honra da presença e do discurso do então primeiro-ministro, mas só quando a operação de buscas da Operação Influencer foi desencadeada, a 7 de novembro de 2023, é que Costa percebeu que Lacerda Machado estava ligado à empresa do projeto Sines 4.0

A procuradora Rita Madeira questionou ainda António Costa sobre um almoço que terá tido com Lacerda Machado no verão de 2023 — encontro esse que os seus colegas João Paulo Centeno, Hugo Neto e Ricardo Lamas invocaram no seu despacho de promoção das medidas de coação, em novembro de 2023, para indiciarem a pressão e a influência que Lacerda Machado teria junto do primeiro-ministro António Costa.

O próprio Lacerda Machado, quando interrogado pelo juiz de instrução criminal aquando da sua detenção, confirmou o almoço, mas garantiu que nunca falou sobre a Start Campus com o então primeiro-ministro, mas sim sobre outras questões relacionadas com Sines.

António Costa, por seu lado, confirmou à procuradora Rita Madeira que efetivamente aconteceu um almoço no restaurante Solar dos Presuntos, que o convite partiu dele próprio e deveu-se a razões pessoais.

Nesse almoço, segundo Costa, Lacerda Machado terá falado dos elevados preços de arrendamento que existiam em Sines, o que dificultava a deslocalização e a contratação de trabalhadores para as empresas que estavam a investir na zona industrial. Mas nunca da Start Campus.

António Costa, por seu lado, confirmou à procuradora Rita Madeira que efetivamente aconteceu um almoço no restaurante Solar dos Presuntos, que o convite partiu de si e deveu-se a razões pessoais. Nesse almoço, segundo Costa, Lacerda Machado terá falado dos elevados preços de arrendamento que existiam em Sines, o que dificultava a deslocalização e a contratação de trabalhadores para as empresas que estavam a investir na zona industrial. Mas nunca da Start Campus.

Ao que o então primeiro-ministro terá comentado que a mesma informação lhe terá sido transmitida por um representante da Repsol, que, inclusivamente, terá dado o exemplo de que o preço de arrendamento por m2 em Sines equivalia ao preço do mercado de arrendamento no centro de Madrid.

Respondendo a todas as perguntas que lhe foram feitas pela procuradora Rita Madeira, sendo que o seu advogado João Lima Cluny também interveio para aprofundar alguns pontos, António Costa revelou ainda que teve conhecimento de que Lacerda Machado e o seu chefe de gabinete Vítor Escária se encontravam uma vez por outra. E como sabia disso? Porque Escária lhe transmitia os cumprimentos que Lacerda Machado costumava enviar.

Questionado sobre se existia algum conflito de interesses no facto de o seu amigo Diogo Lacerda Machado contactar com vários membros do seu Governo (que tinham consciência da proximidade entre o primeiro-ministro e o próprio Lacerda Machado), António Costa disse que não via qualquer espécie de conflito de interesses.

A reunião com João Tiago Silveira

A garantia de que nunca abordou o tema da Start Campus com Diogo Lacerda Machado ou Vítor Escária foi repetida por António Costa quando as perguntas da procuradora titular dos autos se virou para João Tiago Silveira, coordenador do processo legislativo do Simplex Industrial e igualmente arguido no processo Influencer.

Aqui é necessário algum contexto sobre os indícios do crime de prevaricação que foi originalmente imputado a António Costa, João Galamba (ex-ministro das Infraestruturas), João Tiago Silveira e Rui Oliveira Neves (administrador da Start Campus e sócio da Morais Leitão).

Todos estes suspeitos eram vistos como sendo co-autores de um alegado favorecimento à Start Campus por via da introdução de uma alínea no novo Regime Jurídico de Urbanização e Edificação, que foi aprovado no Conselho de Ministros do dia 19 de outubro de 2023, como o Observador revelou a 5 de janeiro de 2024.

“Já te disse: falaremos disso mais tarde!” Mais de 20 escutas telefónicas que envolvem António Costa foram juntas ao processo

Dias antes da aprovação pelo Governo, o ex-ministro João Galamba e João Tiago Silveira (coordenador do Simplex Industrial e do Licenciamento) terão negociado os pormenores da nova lei com Rui Oliveira Neves (administrador da Start Campus e colega de João Tiago Silveira na Morais Leitão) para que a construção do data center da empresa fosse beneficiada pela nova lei, ficando dispensada de um processo de licenciamento urbanístico.

João Tiago Silveira foi escutado no dia 13 de outubro a dizer a Rui Oliveira Neves que esteve “com o Costa quatro horas a ver isto na quarta-feira [dia 11 de outubro] e que o gajo está completamente entusiasmado com isto”.

O “isto” é, segundo o Ministério Público, uma “lei feita à medida” que foi classificada por Oliveira Neves como algo “muito malandro, mas é por aqui que a gente tem que ir”. E o “Costa” referido por João Tiago Silveira, é o primeiro-ministro António Costa, o que indicia que as alterações faladas por João Tiago Silveira com Rui Oliveira Neves terão sido discutidas com o chefe do Governo.

Confrontado com estes indícios, António Costa confirmou a reunião que teve com João Tiago Silveira. Ocorreu no dia 11 de outubro, mas, ao contrário do que o coordenador do Simplex afirmou nas conversas com Rui Oliveira Neves que foram alvo de interceção telefónica, Costa diz que o tema da Start Campus não fez parte da conversa.

António Costa confirmou a reunião que teve com João Tiago Silveira. Ocorreu no dia 11 de outubro, mas, ao contrário do que o coordenador do Simplex afirmou nas conversas com Rui Oliveira Neves que foram alvo de interceção telefónica, Costa diz que o tema da Start Campus não fez parte da conversa e que João Tiago Silveira se limitou a fazer uma apresentação genérica.

Segundo Costa, João Tiago Silveira fez uma apresentação genérica dos aspetos fundamentais do novo Regime Jurídico de Urbanização e Edificação que seria aprovado no Conselho de Ministros do dia 19 de outubro de 2023. Mas nunca o nome da Start Campus foi falado, garantiu o ex-primeiro-ministro.

Costa enfatizou, aliás, que a lei foi construída de forma genérica, tendo como objetivo a promoção da desburocratização e o dinamismo económico — e aplica-se a todas as empresas por igual, recusando, assim, a ideia de uma “lei feita à medida” (como os procuradores João Paulo Centeno, Hugo Neto e Ricardo Lamas suspeitam) ou, utilizando a expressão de Rui Oliveira Neves já citada pelo Observador, de “algo muito malandro”.

A procuradora Rita Madeira quis ainda explorar um eventual conflito de interesses de João Tiago Silveira, que assume uma dupla posição de coordenador de um processo legislativo por opção do Governo e a de sócio de um escritório de advogados, questionando António Costa sobre se era normal uma sociedade advogados produzir projetos de lei e se a Presidência de Conselho de Ministros não tem uma unidade orgânica que permita assegurar esse trabalho.

Costa, político com passagem por vários governos e com a experiência de oito anos como primeiro-ministro, respondeu que o Estado não está apetrechado como deveria de juristas para ter uma capacidade instalada de produção legislativa, daí a necessidade de recorrer ao outsourcing jurídico. Uma prática que é comum há muitos anos e em sucessivos governos.

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