Quietos. Os críticos internos de Luís Montenegro – que os há – nada farão para organizar qualquer tipo de movimento que se assemelhe a um embrião de oposição ao novo presidente social-democrata. O plano é não dar qualquer pretexto ao antigo líder parlamentar para se vitimizar e agarrar o discurso que serviu de combustível às três vitórias internas de Rui Rio – o de que o partido nunca o deixou verdadeiramente liderar.
O Observador sabe que nenhum dos nomes que se perfilam como fazendo parte da resistência interna a Luís Montenegro organizarão listas ao Conselho Nacional do PSD, órgão máximo do partido entre Congressos. Nos últimos anos, de resto, foi aí que se travaram algumas das mais duras disputas internas, uma vez que Rui Rio nunca teve maioria naquele que é considerado o parlamento do partido.
À cabeça, Jorge Moreira da Silva, que disputou as últimas eleições contra Luís Montenegro, não vai encabeçar qualquer lista ao Conselho Nacional, apurou o Observador. Não que isso signifique que tenha desistido de ser a grande reserva do partido para o futuro. No núcleo duro do antigo ministro existe a profunda convicção de que Moreira da Silva é o quadro em melhores condições para suceder a Montenegro quando o momento chegar.
Havia a hipótese de Carlos Eduardo Reis, o grande artífice da candidatura de Moreira da Silva, organizar uma lista ao Conselho Nacional. O deputado e um dos homens mais influentes do partido (sobretudo no distrito de Braga) desenha equipas que o acompanham no parlamento do partido há eleições consecutivas – uma demonstração de força que já lhe valeu um papel decisivo durante o consulado de Rui Rio e que o ajudou a construir a rede de apoios de que hoje dispõe.
De resto, nas últimas eleições, havia a expectativa de que Carlos Eduardo Reis, já formal e assumidamente um apoiante de Rio, integrasse as tropas do ainda líder social-democrata. Mas, ainda assim, e em coordenação com o núcleo duro do presidente do partido, o homem forte de Barcelos – uma das maiores estruturas do partido – acabou por desenhar uma equipa própria – foi a quarta lista mais votada, conseguindo eleger 9 conselheiros em 70 possíveis.
Agora, em entrevista ao Observador, no programa “Sofá do Parlamento”, Carlos Eduardo Reis explica que prefere ficar de fora dessa equação. “Acredito que com o quadro político difícil nos próximos dois anos, estar a tentar corporizar algum tipo de oposição dentro do Conselho Nacional não serve o partido. Estaríamos a atrapalhar a vida durante o mandato. Não acredito nisso”, argumentou.
A outra novidade é a ausência de Miguel Pinto Luz nestas contas. O Observador sabe que o vice-presidente da Câmara de Cascais não vai apresentar qualquer lista ao Conselho Nacional do PSD, ao contrário do que aconteceu no último Congresso, em dezembro de 2021. Nessa altura, Pinto Luz conseguiu ter a segunda lista mais votada, superando a equipa apresentada por Luís Montenegro e capitaneada pelo madeirense Pedro Calado, presidente da Câmara Municipal do Funchal.
Nos dias que antecederam o Congresso, a oposição interna a Rui Rio ainda se tentou unir em torno de uma lista única ao Conselho Nacional, mas as negociações acabaram por falhar. A aposta acabou por compensar Pinto Luz: com 161 votos, o número dois de Carlos Carreiras elegeu 14 conselheiros, quase duplicando o número de conselheiros conseguidos antes.
De resto, os dois, Pinto Luz e Montenegro, partiram para esse congresso com estratégias diferentes: o vice de Cascais, que tinha sido o grande apoiante de Paulo Rangel nesse confronto com Rio, apareceu com um discurso de rutura; Montenegro, já depois de ter aparecido com grande pompa e circunstância ao lado de Rio durante a campanha para as legislativas, preferiu aproveitar a reunião magna para fazer um apelo à união em torno de Rio.
Apesar de tudo, Pinto Luz decidiu não ir a jogo desta vez e vários dos seus apoiantes apoiaram Luís Montenegro nas eleições que ditaram o fim de ciclo de Rui Rio. Agora, também se resguarda, não deixando margem para que, no futuro, seja acusado de ter sido um obstáculo para a afirmação de Luís Montenegro.
A dúvida Moedas e a ideia de esperar que o montenegrismo caia sozinho
Também Paulo Rangel, apurou o Observador, ficará de fora destas contas. O eurodeputado deve ir ao Porto, mas não deve discursar no Congresso e nem vai encabeçar qualquer lista ao Conselho Nacional. Nas últimas diretas, Rangel foi pressionado para a avançar, mas decidiu que este não era o seu tempo, sobretudo depois de ter perdido as eleições da forma como perdeu. Era tempo de dar oportunidade a outros protagonistas para que pudessem ir a jogo. Cumprido o plano, agora será o tempo de Montenegro.
Carlos Moedas, de quem muitos esperam que possa vir a ser o futuro do partido — o presidente da Câmara Municipal de Lisboa foi desafiado a avançar por muita gente, mas acabou por resistir –, não vai apresentar qualquer lista alternativa ao Conselho Nacional.
No entanto, não é de excluir que o autarca venha a liderar a lista afeta a Luís Montenegro. O Observador sabe que os dois já conversaram, mas que, até à data de publicação deste artigo, nada ficou definitivamente fechado — nem para um lado, nem para o outro.
Nas próximas horas, é possível que tudo se desenrole e que Moedas, aceitando o convite, dê um sinal de unidade interna — decisão que o colocaria entre os que ajudaram o próximo líder a governar o partido, logo isento de críticas e acusações de fazer parte de qualquer conspiração interna. Em contrapartida, o autarca também teria mais dificuldade em descolar-se de Montenegro se ou quando isso acontecer.
Depois de ter ficado quieto nas últimas diretas, seria impensável que Moedas organizasse qualquer estratégia que se assemelhasse a uma centelha de oposição interna. No último congresso, o autarca foi de longe o mais aplaudido pelos sociais-democratas e será um sinal a ter em conta o nível de adesão que o discurso do edil terá no Pavilhão Rosa Mota.
Não é segredo para ninguém que, nos bastidores do PSD, há muito boa gente a apostar na queda de Luís Montenegro logo depois das europeias. Como existe a convicção de que o próximo líder do PSD se vai estampar já em 2024, na cabeça dos adversários internos de Montenegro pode não ser desprovido de senso deixar que o antigo líder parlamentar caia sem ser empurrado.
Acontecendo, Montenegro ficaria sem qualquer margem para dizer que o partido conspirou contra si. Sem essa narrativa – em que assentou sempre a estratégia de Rui Rio –, o cimento que une o montenegrismo, e que sempre defendeu que os problemas do PSD se deviam em grande medida ao fraco desempenho de Rio, ficará automaticamente desfeito. Caberá ao novo líder mostrar que os adversários internos estão errados ao apostarem nessa estratégia.