Reportagem no Vaticano
A carta oficial do Papa terá chegado sem aviso prévio à secretária de um chefe de dicastério da Cúria Romana. A ordem começava de forma clara: “Peço-lhe, por favor, que dispense…”, especificando em seguida os nomes dos três funcionários que Francisco pretendia afastar, enviando-os de volta à diocese ou à companhia religiosa de origem. O responsável máximo do mesmo departamento estranhou a instrução: confiava nos três homens, reconhecia-lhes competência. Atrasou a concretização do pedido até falar com o Pontífice para tentar perceber o motivo da decisão. Quando, por fim, a conversa aconteceu, Francisco terá sido lacónico: “Sou o Papa. Não tenho de justificar nenhuma das minhas decisões. Decidi que eles têm de sair e têm de sair.”
A história, contada desta forma, sem identificar fontes, nem protagonistas, foi publicada no dia 26 de dezembro de 2016, no blogue Stilum Curiae (O estilo da Cúria). O texto do vaticanista Marco Tosatti — que, a par do colunista Sandro Magister, é uma das vozes mais críticas de Francisco na imprensa italiana — dava conta de uma “febre autocrática” que parecia ter tomado conta do Vaticano. Garantia ainda que “a atmosfera por dentro de muros e palácios não era serena” e questionava “que crédito daria este facto à longa e elaborada fanfarra sobre a misericórdia” do Papa.
Na prática, Tosatti dava voz à mesma dúvida que seria expressada daí a dois meses, nos famosos cartazes anti-Papa espalhados por Roma. “Oh, Francisco, intervieste em Congregações, demitiste sacerdotes, decapitaste a Ordem de Malta e os franciscanos da Imaculada, ignorando cardeais… Mas onde está a tua misericórdia?”, questionavam os posters, ilustrados com uma fotografia do Papa, de rosto fechado. A notícia haveria de espalhar-se pelo mundo inteiro, antes de as autoridades retirarem os cartazes das paredes e prometerem investigar quem estivera por detrás da campanha. (Até agora, não houve novidades relativamente a esta matéria).
Ainda que Francisco goze de uma assinalável popularidade por todo o mundo, não é novidade que desperta desconfianças junto dos setores mais conservadores da Igreja. No início, as críticas surgiram de forma envergonhada, mas, com o tempo, tornou-se evidente que alguns círculos não se reviam (nem reveem) no Pontificado de Jorge Mario Bergoglio.
“Não há absolutamente nada de novo relativamente à questão de nem todos os bispos cantarem “Aleluia” relativamente àquilo que o Papa diz ou faz”, escreveu o vaticanista americano John L. Allen Jr., numa crónica publicada no site católico Crux. Na verdade, todos os Papas enfrentaram um certo grau de oposição. “Houve uma tremenda resistência interna durante quase três décadas a São João Paulo II (…). Um eixo de prelados moderados ou progressistas que ocupavam postos importantes (…) constituíam, mais ou menos uma ‘oposição leal’ a partes importantes da agenda de João Paulo II”, prossegue o jornalista. Segundo Allen, Bento XVI enfrentou ataques muito mais duros do que Francisco. “A certa altura, dois respeitados jornalistas italianos lançaram um livro chamado ‘Ataque a Ratzinger’, documentando as formas como várias forças da Igreja, incluindo alguns oficiais do Vaticano e bispos de todo o mundo, não só tinham criticado, mas subvertido ativamente a agenda de Bento”, explica.
O que é inédito, no tempo de Francisco, é que “num mundo dominado pelos media, as queixas que outrora ficavam confinadas a círculos reservados tornam-se agora causes celèbres globais num instante”. Analistas de peso, como o italiano Andrea Tornielli, vaticanista do diário La Stampa e coordenador do site Vatican Insider, garantem que a oposição é diminuta em termos de números, mas amplificada pela Internet.
Nello Scavo, autor do livro “Os inimigos de Francisco”, recentemente publicado em Portugal, não está tão certo que a oposição seja assim tão circunscrita, pelo menos fora do Vaticano. “Conta‑se que um dia Estaline perguntou aos seus interlocutores de quantas divisões armadas dispunha o Papa. Hoje passaria antes o tempo a procurar calcular quantos são os inimigos de Francisco”, escreve no livro.
A origem das críticas
Mas, afinal, de onde vêm as críticas a Francisco? “O próprio Papa respondeu a essa questão, numa entrevista ao diário argentino La Nación. Nessa conversa, invoca os inimigos que se escondem na sombra, no Vaticano, os ultra conservadores. Aqueles que querem que ninguém se mexa, que permaneça tudo imóvel, que a Igreja seja uma espécie de monolito, sem evoluir com o tempo. O Papa diz, com sentido de humor, que há que deixar os seus opositores fazerem o seu trabalho, enquanto ele faz o dele”, explica ao Observador o jornalista suíço Arnaud Bédat, autor do livro François, seul contre tous, ainda sem tradução portuguesa.
Na referida entrevista ao jornal argentino, Francisco acrescenta ainda: “Desejo uma Igreja aberta, compreensiva, que acompanhe as famílias feridas. Eles dizem que não a tudo. Eu sigo o meu caminho sem olhar para trás. Não corto cabeças. Nunca gostei de o fazer. Repito: recuso o conflito.”
Os ultra conservadores têm uma opinião diferente e dão o exemplo concreto do cardeal norte-americano Raymond Burke, que Francisco afastou do Tribunal da Assinatura Apostólica, em novembro de 2014. O cardeal, muito próximo dos círculos tradicionalistas da Igreja, seria uma força de bloqueio contra as alterações à lei da anulação do matrimónio que o Pontífice queria introduzir.
Os mesmos opositores viram com desagrado a destituição de Burke do cargo de patrono da Ordem de Malta, na sequência de uma polémica que se instalou no interior da organização, levando ao afastamento do grande chanceler Albrecht von Boeselager. O alemão terá apoiado a distribuição de preservativos em ações de assistência médica prestada pela Malteser International, a agência humanitária da Ordem. Suspenso pelo grão-mestre Matthew Festing, von Boeselager recorreu ao Papa.
Francisco criou uma comissão para averiguar a situação, mas como o líder máximo da Ordem de Malta se recusou a colaborar, considerando que se tratava de uma ingerência inadmissível, acabou por ser demitido. Para acompanhar de perto a evolução do conflito, Francisco nomeou um delegado pontifício da sua inteira confiança, o arcebispo Angelo Becciu, o Substituto da Secretaria de Estado, responsável pela secção de Assuntos Gerais. Quando a estabilidade regressar, os cavaleiros devem eleger um novo soberano vitalício.
Mas este está longe de ser o único foco de resistência. Num artigo publicado no Vatican Insider em outubro de 2016, os vaticanistas Andrea Tornielli e Giacomo Galeazzi, identificam pormenorizadamente os antagonistas de Francisco. Há os que preferiam um Papa europeu, os nostálgicos de Ratzinger e os conservadores que não suportam a abertura de certas atitudes pastorais de Bergoglio.
“A oposição ao Papa, une pessoas e grupos muito distintos entre si. Há a crítica suave expressada pelo jornal online La Bussola Quotidiana e pelo Il Timone. O Papa argentino é ainda repreendido quase diariamente pelo antigo especialista em assuntos do Vaticano da revista L’espresso, Sandro Magister”, escrevem os jornalistas.
Tornielli e Galeazzi fazem também referência aos comentários sarcásticos do site Chiesa e post concilio, onde se publicam títulos como: “Se o próximo Papa for Bergogliano, o Vaticano vai tornar-se um eixo Catomaçónico.” As críticas mais violentas vêm, porém, de católicos ultra-tradicionalistas e sedevacantistas, que consideram que o Vaticano está em Sede Vacante (o período entre a morte ou a resignação de um Papa e a eleição do seu sucessor) desde que Pio XII morreu. Há ainda o caso de Antonio Socchi, que defendeu publicamente a nulidade do Conclave que elegeu Bergoglio, devido à existência de um boletim de voto a mais no escrutínio.
É na Internet e em encontros privados entre clérigos que se definem as estratégias de argumentação. Para Tornielli e Galeazzi, a Fundação Lepanto, uma organização que luta pela defesa dos valores da civilização cristã, é o quartel-general da resistência a Francisco. Segundo declarações do presidente da instituição, Roberto de Mattei, ao Vatican Insider, “a Igreja está a passar por um dos momentos de maior caos na sua história e o Papa é uma da causas disso. A oposição não parte apenas dos chamados círculos tradicionalistas, estende-se a bispos e teólogos que foram treinados de acordo com as escolas de pensamento de Ratzinger e Wojtyla.”
O britânico Austen Ivereigh, autor da biografia Francisco, o grande reformador, explica que “os ataques a este Papa vêm de um setor que costumava criticar o Catolicismo de cafetaria. As críticas são mais contundentes, porque eles estão convencidos de que a tradição está do lado deles e acreditam que o Papa é herético. Não o dizem muitas vezes, mas é o que pensam.” O autor vai mais longe: “Há um atrevimento moral que só vi mais uma vez na Igreja, num período em que alguns teólogos da libertação, totalmente marxistas, falavam de João Paulo II com este tipo de desrespeito. É muito interessante que a era do respeito pelo Pontificado tenha terminado por ação das mesmas pessoas que criticavam o Catolicismo de cafetaria.”
Críticas variadas
Uma simples ronda pela Internet é suficiente para ter noção da opinião dos católicos tradicionalistas e conservadores sobre Francisco. Nos sites OnePeterFive, LifeSiteNews e Rorate Caeli, ao contrário do que sucede na maioria dos media laicos e progressistas, Bergoglio é descrito como um líder implacável, vingativo e em constante contradição com a visão tradicional da Igreja que professam. Há quem, como o jornalista e investigador Alessandro Gnocchi, acuse o Papa de basear o pontificado “num exercício de poder brutal.” No limite, insinuam que Francisco é herético.
“A oposição a Francisco centra-se nalguns focos: na América católica conservadora, na Europa de Leste (em países como a Polónia, a Hungria e a Croácia) e, até certo ponto, em África”, diz Austen Ivereigh ao Observador. Trata-se de uma minoria proveniente sobretudo de uma elite cultural e financeira, que se sente ameaçada pela modernidade e pelo secularismo.
“É por isso que o Sínodo da Família e a [exortação apostólica] Amoris Laetitia se tornaram o coração da oposição. Manter a linha que defendem para o matrimónio foi uma das principais batalhas do conservadorismo católico americano, por exemplo. Daí que entendam Amoris e o Sínodo como uma capitulação às forças da modernidade”, justifica Ivereigh.
O motivo de tanta discórdia em redor do Sínodo e do documento do Papa prende-se com a discussão sobre assuntos controversos, como o papel dos homossexuais na Igreja e a possibilidade de acesso à Comunhão dos divorciados que voltam a casar.
É um facto que, no voo de regresso do Rio de Janeiro, em 2013, Francisco proferiu a célebre frase “Quem sou eu para julgar?” em relação aos homossexuais. Porém, Francisco reafirmou várias vezes que o matrimónio é a união de um homem e uma mulher.
O Capítulo VIII da exortação Amoris Laetitia não diz, taxativamente, que todos os católicos divorciados e recasados podem comungar, há quem leia no texto uma abertura a essa possibilidade em casos muito específicos, depois de penitência e grande discernimento pessoal. Mas a existência desta hipótese é algo inadmissível para os guardiões do dogma.
O cardeal Gerhard Müller, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, foi peremptório numa entrevista concedida à revista Il Timone: o matrimónio é indissolúvel e quem volta a casar comete adultério, que “é sempre um pecado mortal”.
Na linha da frente da oposição a Francisco nesta matéria estão os quatro cardeais que escreveram a dubia, uma carta enviada ao Papa a pedir esclarecimentos relativamente a algumas afirmações de Amoris Laetitia. A missiva foi assinada por Carlo Cafarra, de Bolonha, Walter Brandmüller, presidente emérito do Comité Pontifício para as Ciências Sociais, Joachim Meisner, arcebispo emérito de Colónia e, mais uma vez, Raymond Burke, anterior patrono da Ordem de Malta.
“Francisco diz que não vê Burke como um inimigo pessoal, sem dúvida, mas não é ingénuo a esse ponto: trata-se de um adversário vingativo e muito duro. O Papa aprendeu a lidar com a resistência no tempo da ditadura argentina, sabe responder aos perigos”, diz Arnaud Bédat ao Observador.
Já nessa época, Bergoglio não foi um líder consensual. Enfrentou uma violenta oposição interna na Companhia de Jesus, quando foi provincial, e passou por uma autêntica via sacra quando o colocaram em Córdoba, entre 1990 e 1992, expondo-o a uma rejeição brutal. “Este período teve o efeito de o mudar a vários níveis. Um deles foi na forma como exerce a liderança”, diz Austen Ivereigh, que estudou ao pormenor a vida do Papa na Argentina e o seu percurso entre os jesuítas.
Os detratores de Francisco alegam que o Papa nunca mudou e que continua governar com o mesmo estilo ditatorial que lhe trouxe problemas em Buenos Aires. Essa é, de resto, a linha descrita num artigo publicado no LifeSiteNews, em dezembro de 2016, segundo o qual se vive um clima de medo no Vaticano.
“Muitos têm medo de ser afastados dos seus lugares, despedidos dos seus empregos em agências do Vaticano ou de serem alvos de reprimendas em privado ou de acusações pessoais vindas feitas pessoas que estão à volta do Papa ou pelo próprio Francisco. Estão assustados e ansiosos quanto aos grandes danos que a Igreja está a sofrer, sentindo-se incapazes de os travar”, explicava o texto assinado pelo diretor, Steve Jalsevac.
O jornalista assegura também que a dubia foi “apoiada em silêncio por pelo menos outros 20 ou 30 cardeais, fazendo aumentar claramente uma atmosfera de intimidação e medo no Vaticano.” Segundo o LifeSiteNews, os oficiais da Cúria passaram a ter receio de dizer aquilo que pensam, temendo represálias.
“O Vaticano ainda é uma corte de virtudes milenares e vícios seculares. A velha guarda não quer renunciar aos privilégios e entretanto conspira contra o pontífice”, escreve Nello Scavo no livro Os inimigos de Francisco. “As reformas teológicas, os confrontos doutrinais, os ataques com o florete e os golpes de sabre internos na cúria são objeto das crónicas quotidianas dos vaticanistas. Blogues, portais, artigos de jornal, newsletters: muitas vezes é uma batalha campal entre teólogos. Outras vezes, uma luta pela sobrevivência dos velhos poderes na cúria. Não faltam os mexericos, as disputas entre intelectuais «pronto‑a‑vestir», as habituais cartas anónimas”, prossegue.
A animosidade de certos oficiais da Cúria remonta aos primeiros tempos do atual Pontificado e àquilo que muitos consideraram uma simplicidade excessiva do Papa. Como explica ao Observador o bispo D. Carlos Azevedo, “alguns elementos da Cúria têm uma conceção sacral do Papa e consideram que determinados gestos de Francisco desfazem essa sacralidade. Só que todas essas pequenas coisas aparentemente sem grande valor são [sinais de] uma atitude muito mais próxima do Evangelho.”
O desagrado foi crescendo à medida que Francisco ia proferindo discursos que expunham os pecados e vícios da Cúria, como aconteceu logo no Natal de 2014. No habitual cumprimento que dirige aos mais altos representantes do Vaticano nessa época do ano, o Papa argentino identificou 15 pecados, entre os quais “o terrorismo do mexerico”, “a patologia do poder” e “o Alzheimer espiritual”. No fim, em vez de um efusivo aplauso, Bergoglio ouviu palmas tímidas e confrontou-se com muitos sorrisos amarelos. A frontalidade do Papa caiu como uma bomba. Houve quem visse aquelas palavras como um desrespeito.
Habitualmente sorridente junto do “santo povo de Deus”, como chama aos fiéis, há quem diga que, em privado, Francisco assume uma expressão grave sempre que alguma coisa lhe desagrada. Para Arnaud Bédat, é impossível compreender o Papa Francisco sem mergulhar no seu passado em Buenos Aires para entender aquilo que enfrentou e como ultrapassou essas tormentas. “É um homem que sempre teve de lutar. O seu passado explica o presente e dá as chaves para o futuro”, diz o jornalista. Bergoglio não mudou com a chegada a Roma.
“Ele pode ser de uma grande dureza, corta a direito e pode demitir qualquer um sem pré-aviso, como aconteceu, por exemplo, com Daniel Anrig, comandante da Guarda Suíça, no fim de 2014”, reconhece Bédat. Acrescenta, no entanto, que “o Papa procura sempre primeiro soluções através do diálogo e da discussão. Quando a pessoa em causa não quer compreender, é preciso decidir. Ele também é um líder, o chefe de uma organização que quer que o trabalho seja bem feito.”
Se tiver de dar recados, Francisco não se coíbe de o fazer, dentro ou fora da Cúria. “No plano mundial, diante de chefes de Estado, se for preciso, já não tem papas na língua. Pode dizer claramente o que entende na intimidade das conversas privadas. Em público, por vezes, também chega a mostrar sinais de manifesta irritação, mas é preciso observá-lo bem para perceber”, diz o autor.
Os inimigos fora de portas
As resistências ao Papa dentro da Cúria, levaram o cardeal alemão Walter Kasper, um teólogo muito apreciado pelo Papa, a falar de uma ‘guerra no Vaticano’. No entanto, para o jornalista Nello Scavo, o número de opositores do Pontífice é mais vasto fora dos muros do Vaticano do que dentro. No seu livro, Scavo cita uma frase curiosa do jornalista Francesco Antonio Grana, do jornal Il Fatto Quotidiano: “Francisco não está no primeiro lugar do Guinness dos pontífices que tiveram mais inimigos no Vaticano. O primeiro lugar, pelo menos no que se refere aos tempos recentes, é sem dúvida de São João XXIII, o ‘papa bom’ que revolucionou completamente a Igreja como hoje está a fazer Bergoglio.”
Os discursos de Francisco sobre assuntos económicos, ambientais e contra as novas formas de escravidão, a máfia e o tráfico de droga despertaram a ira de muitos lóbis globais. Grandes grupos empresariais, altas individualidades ligadas à indústria do armamento e a setores de atividade nocivos para o Planeta têm vindo a reagir com maior ou menor violência às palavras incisivas do Papa.
Na sequência da publicação da encíclica Laudato Si, em que Francisco acusa o homem de ser o causador das alterações climáticas, “o Earth Land Institute, uma dos mais importantes entidades com interesses relacionados com o ambiente nos Estados Unidos, disse que o Papa não percebia nada do assunto e que as alterações climáticas eram causadas pelo próprio ambiente”, exemplifica Scavo ao Observador.
Por seu lado, os conservadores norte-americanos, descontentes com as críticas de Francisco ao efeito do capitalismo selvagem sobre as pessoas, acusam o Papa de ser marxista. “Para compreender o que pensam verdadeiramente (…) das ‘declarações e ações’ de Bergoglio, basta ouvir as transmissões radiofónicas de Rush Limbaugh, um comentador e jornalista muitíssimo apreciado, cuja audiência não desce nunca abaixo dos quinze milhões de ouvintes”, escreve Scavo. Limbaugh não podia ser mais direto: “O Papa engana‑se de forma dramática, embaraçosa e desconcertante. (…) É triste, porque este Papa mostra claramente que não sabe do que está a falar quando se trata de capitalismo, socialismo e coisas do género. (…) É puro marxismo, aquilo que sai da boca do Papa. Capitalismo sem limites? Não existe em lado nenhum. O capitalismo sem limites é uma frase socialista para descrever os Estados Unidos”.
Há muito que o Papa sabe que pode estar na mira de vários grupos violentos, como a máfia, os narcotraficantes e o Estado Islâmico — escapou por pouco a um atentado nas Filipinas, desmantelado pouco antes da sua visita. Nada o demove. “Há um risco real de o Papa ser alvo de um ataque do Estado Islâmico, por exemplo. Mas a ida ao Egipto foi uma demonstração de que ele não tem medo. É um líder global. Algumas opiniões contrárias ao Papa não são violentas, mas é preciso pensar no impacto de certas palavras em pessoas perturbadas”, alerta ao Observador o jornalista Nello Scavo.
A viagem a Fátima, tendo em conta o historial de João Paulo II e o contexto atual, é vista como uma deslocação de alto risco. “Há um perigo real ao nível da segurança. Informações coerentes provenientes de vários serviços secretos deixam no ar a ameaça de um atentado terrorista em massa. Mas tudo é feito pelos serviços de segurança para que nada disso aconteça, apesar de o Estado Islâmico ter posto a prémio a cabeça do Papa. O perigo é real, não só para Francisco, mas também para os peregrinos de Fátima”, diz Arnaud Bédat.
O Papa permanece imperturbável. “Ele repete aos seus interlocutores que o Espírito Santo o protege e a Providência decide por ele. Não é homem para ter medo. É um Papa sereno, que segue o seu caminho.” Mesmo que os ataques sejam duros e venham de todos os lados.