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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Pedro Nuno respira, mas precisa de tempo. Viabilização do OE mais perto após Europeias

Discurso socialista sobre próximo Orçamento sofreu modelação nas últimas semanas e no partido já surge palavra "viabilizar". PS passa responsabilidade disso para Governo e afasta crise do seu nome.

Entre socialistas já se ouve a palavra viabilizar associada ao próximo Orçamento do Estado. Depois de dois meses de “praticamente impossível”, no topo do partido admite-se que os últimos tempos trouxeram uma “inflexão” da posição de Pedro Nuno Santos. Depois do resultado eleitoral de domingo existe agora a ideia generalizada de um líder aliviado, com mais tempo para gerir o papel de oposição e empenhado em manter-se longe da ideia de elemento desestabilizador. Mas no partido também se reclama que é preciso mais do que isso e que o PS tem de partir à reconquista do centro.

“Os resultados são simples: colocam PS e AD na casa da partida. Veremos quem gere melhor o próximo futuro”, refere ao Observador um alto dirigente numa leitura do que saiu da noite das Europeias. Os socialistas acreditam ter no ponto percentual de vantagem sobre a AD um balão de oxigénio temporário que permite que a liderança ganhe tempo. “A tónica deixou de estar na sua sobrevivência e pode olhar para o Orçamento de outra maneira“, comenta com o Observador um outro dirigente do partido: “Pode dizer que não tem medo de eleições mas que não as quer”.

“O resultado dá mais possibilidade de viabilizar o Orçamento”, acredita o mesmo dirigente que aponta o desanuviar que a vitória eleitoral trouxe sobre eventuais “pressões internas, desconfianças ou dúvidas dos militantes” em relação a Pedro Nuno. “A inflexão já aconteceu há mais tempo. A estabilidade política não se coloca”, acrescenta outro dirigente. Outro socialista considera que Pedro Nuno “percebeu que poderá ter de viabilizar o Orçamento” e outro ainda fala em “inversão: ao menos abriu espaço para que seja viabilizável”. “O Governo ganhou mais estabilidade“, comenta ainda um dirigente que salta até para outro ponto: “A pressão para aprovar o Orçamento recai agora sobre o Chega”.

No PS havia quem considerasse que, em caso de derrota nestas Europeias, o líder “estava quase obrigado a inviabilizar” o Orçamento. Já na AD agitava-se o contrário, que uma vitória socialista traria instabilidade. Certo é que qualquer uma das duas ideias colava o PS a uma crise política e isso fez soar alarmes, fazendo Carlos César saltar para a linha da frente, ainda em campanha, a aconselhar “paciência”, afastando eleições antecipadas: “A seu tempo, quando for tempo disso, será o das eleições para o novo Governo que ansiamos e que esperamos ser do PS.”

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No terreno, os socialistas que estiveram em campanha dizem ter “percebido que as pessoas não querem eleições”. A juntar a isso, o resultado também não foi “suficiente para acelerar o processo político e criar uma situação de instabilidade para o Governo”, analisa um quadro do partido ao mesmo tempo que considera que “a oposição não tem margem para continuar numa lógica muito agressiva“.

"Uma crise política antes das autárquicas atrasava novamente a execução de fundos que os autarcas querem executar para apresentarem resultados", analisa um socialista. Uma posição mais fechada do líder do PS "estava em contra-vapor com um dos principais motores do partido", os autarcas, considera a mesma fonte.

Na oposição interna a Pedro Nuno, forjada na batalha contra José Luís Carneiro nas diretas de dezembro passado, essa lógica já vinha sendo criticada. O próprio adversário de Pedro Nuno nessas eleições internas tinha-se distanciado de um anúncio de chumbo do Orçamento à partida, considerando que essa conversa não era “oportuna”. E entre autarcas, a presidente da ANMP, a socialista Luísa Salgueiro, também destoou da linha oficial ao defender em abril, numa entrevista ao Público, um “equilíbrio negocial” que permita a viabilização do Orçamento do Estado para o próximo ano. A presidente da Câmara de Matosinhos fazia, no entanto, depender um entendimento da disponibilidade demonstrada pelo Governo para um acordo.

Um sinal importante vindo de uma autarca a ano e meio de eleições para o poder local. “Uma crise política antes das autárquicas atrasava novamente a execução de fundos que os autarcas querem executar para apresentarem resultados”, analisa um socialista. Uma posição mais fechada do líder do PS “estava em contra-vapor com um dos principais motores do partido”, os autarcas, considera a mesma fonte.

[Já saiu o quinto episódio de “Matar o Papa”, o novo podcast Plus do Observador que recua a 1982 para contar a história da tentativa de assassinato de João Paulo II em Fátima por um padre conservador espanhol. Ouça aqui o primeiro episódio, aqui o segundo episódio, aqui o terceiro episódio e aqui o quarto episódio]

Ganhar tempo e avisos para desacelerar ritmo no Parlamento

Do que os socialistas contactados pelo Observador não têm dúvidas é que Pedro Nuno Santos precisava de tempo para se afirmar e ganhou esse tempo este domingo. “O resultado permite fazer maior pressão sobre o Governo para um relacionamento com o PS”, afirma um dirigente já citado.

"Não é proveitoso que o ritmo parlamentar seja o mesmo", diz um socialista sobre a quantidade de projetos aprovados em coligações anti-AD que têm passado no Parlamento. "Têm de ser agendamentos cirúrgicos e em momentos-chave. Num determinado tempo fez sentido, mas não faz a toda a hora e é importante transmitir serenidade. Tem de haver uma fase em que acaba a histeria parlamentar", diz a mesma fonte.

Os socialistas pretendem entrar na sala com a imagem de disponibilidade, só cedem uma viabilização consoante o tom encontrado do lado de lá. “A AD tem continuado na estratégia de choque“, diz o mesmo dirigente que, tal como muitos outros socialistas em conversa com o Observador, alimentam a narrativa de um Luís Montenegro empenhado em ser a cópia de Cavaco Silva, ou seja, apostado em provocar eleições para tentar uma maioria na sequência dessa crise. . “Quem tem a responsabilidade de resolver o problema é o PSD”, atira um dirigente já citado neste artigo.

“Abstenção só se o Governo der sinais de estar disponível para conciliações“, avisa um socialista que também considera importante o afrouxar do ritmo de obstáculos parlamentares com a mão do PS nesta altura. “Não me parece vantajoso“, continuar este ritmo, afirma em linha com um dirigente que também considera, em conversa com o Observador, que “não é proveitoso que o ritmo parlamentar seja o mesmo”, referindo-se à quantidade de projetos aprovados em coligações anti-AD que têm passado no Parlamento. “Têm de ser agendamentos cirúrgicos e em momentos-chave. Num determinado tempo fez sentido, mas não faz a toda a hora e é importante transmitir serenidade. Tem de haver uma fase em que acaba a histeria parlamentar”, diz a mesma fonte.

Ainda esta quarta-feira, no programa “Casa Comum” da Rádio Renascença, Mariana Vieira da Silva dizia que o PS tem “o caminho mais aberto” e que há condições para uma “maior normalidade na discussão parlamentar, que não é o que tem acontecido nas últimas semanas”. A frase aponta à AD, mas a deputada e membro da direção nacional do PS também diz que este é agora tempo de “apresentar trabalho e entrar num ritmo um bocado mais sereno da governação, de que o país precisa e os eleitores querem.”

Estados Gerais e reconquistar o centro

“Pedro Nuno Santos ganhou espaço político. E os Estados Gerais são oportunidade do PS abrir e caminhar para o centro. Ou então fica num bloco que só tem 25 ou 30% e não sai daí”. A consideração vem da ala menos alinhada com Pedro Nuno Santos, mas dentro do seu círculo também existem vozes a apontar para o copo meio vazio destas Europeias: não há espaço para crescer à esquerda.

“Esta vitória foi muito pequena”, diz um alto quadro do partido que diz que esta “é que é a transformação profunda verificada no país: em 2019 o resultado da Europeias, em termos de eurodeputados, foi 14 para a esquerda e sete para a direita. Agora foi 10 para a esquerda e 11 para a direita”.  “O PS tem de apontar medidas ao centro político porque é aí que está a margem de crescimento”, avisa outro dirigente.

Na frente da oposição interna — que sempre foi contra um posicionamento “frentista” do PS — olha-se para o resultado eleitoral como uma confirmação desta tese. “O alinhamento com a esquerda não tem espaço para crescer“, diz um socialista desta ala ao Observador.

Na direção há quem lembre a velha máxima de que "é ao centro que se ganham eleições" e coloca-se a iniciativa que Pedro Nuno Santos apresentou na noite de domingo como um passo nesse sentido. "O Estado Gerais vão tentar recuperar eleitorado e o voto jovem. São um esforço de abertura e para reposicionar o programa, encontrar novos públicos e protagonistas".

Num artigo de opinião publicado no Expresso, o socialista Ascenso Simões escreveu, na sequência das eleições, que “o posicionamento do PS, o mais à esquerda da esquerda de sempre, faz perder o centro e leva a que possa existir um período longo de afastamento do poder. Ora, Pedro Nuno Santos não é líder do PS para ocupar a cadeira do Rato, sim para continuar o muito que se construiu nas últimas encarnações de governo”, provocou.

Na direção há quem lembre a velha máxima de que “é ao centro que se ganham eleições” e coloca-se a iniciativa que Pedro Nuno Santos apresentou na noite de domingo como um passo nesse sentido. “O Estado Gerais vão tentar recuperar eleitorado e o voto jovem. São um esforço de abertura e para reposicionar o programa, encontrar novos públicos e protagonistas”.

Pedro Nuno “precisa de tempo e de se conectar e estabelecer uma relação de confiança com as pessoas”, acrescenta outro dirigente. Já Ascenso Simões, não pôs grande fé nessa iniciativa, ao escrever no artigo já citado que “há marcas que se não resolvem com Estados Gerais, estão dentro de nós e ou as dissipamos ou, a prazo, acabam connosco.”

Mas é nesse fórum de discussão e atração da sociedade civil — que deverá lançar ainda antes do Orçamento  ara 2025 — que Pedro Nuno Santos pretende jogar tudo para a construção da sua imagem política e de um futuro programa para tentar derrotar a direita de Montenegro. À imagem do que fez António Guterres, pelo menos na forma, com a direita vinda do cavaquismo.

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