Índice
Índice
O colégio de peritos independentes nomeado pelo Instituto Nacional de Medicina Legal confirmou que Ricardo Salgado padece com “elevada probabilidade” de “demência moderada” causada “por doença de Alzheimer”. Ou seja, o ex-líder do BES encontra-se no terceiro estágio clínico da doença, tendo já “dependência de terceiros para algumas actividades básicas”, de acordo o relatório entregue no Tribunal Cível de Cascais a que o Observador teve acesso.
O Observador sabe que o segundo relatório pedido pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa que está a julgar Ricardo Salgado por alegadamente ter corrompido Manuel Pinho aponta no mesmo sentido.
E agora? Quais são as consequências destas peritagens? O Observador responde a nove perguntas sobre o caso.
Quem foram os peritos que examinaram Ricardo Salgado?
O colégio de peritos foi liderado por Fernando Vieira, psiquiatra forense e um dos grande especialistas nacionais na área, sendo ainda composto pela Camila Nóbrega (neurologista) e Henrique Saraiva Barreto (neuropsicólogo).
Qual o processo que está em causa?
Uma ação cível que corre termos no Tribunal Cível de Cascais em que Ricardo Salgado é réu e no âmbito do qual a defesa do ex-líder quer impedir que o seu cliente deponha por não se encontrar em condições de o fazer.
Há mais processos em que já tenha sido pedida uma perícia médica independente?
Sim, num processo que corre termos no Tribunal Judicial de Lisboa e que envolve Ricardo Salgado como alegado corruptor ativo de Manuel Pinho, ex-ministro da Economia de José Sócrates e antigo administrador do GES.
O que dizem os peritos que enviaram um relatório para o processo de Cascais?
Depois de analisar todos os exames e os relatórios do médico particular de Ricardo Salgado, além de ter realizado várias entrevistas pessoais e feito exames, o colégio de peritos concluiu que o ex-líder do BES apresenta “critérios clínicos para Perturbação Neurocognitiva Major em fase de demência moderada e causa por Doença de Alzheimer”, com “elevada probabilidade.”
Isto significa que Salgado está no terceiro de quatro estágios da doença de Alzheimer, apresentando neste momento uma “demência moderada” e “dependendo de terceiros para algumas actividades básicas”
Quais as consequências dessa peritagem do Instituto Nacional de Medicina Legal?
O objetivo primeiro da defesa de Ricardo Salgado era impedir que ex-banqueiro prestasse testemunho no Tribunal Cível de Lisboa. Era essa a dúvida que o tribunal colocou ao Instituto de Medicina Legal: Salgado está em condições de testemunhar em audiência de julgamento?
Ora, os peritos não foram taxativos em declarar que tal testemunho era impossível, mas apontaram alguns problemas.
Isto é, os peritos escreveram no seu relatório que não existe real “impossibilidade” de Salgado “em comparecer” no julgamento, mas admitem claramente que, em termos médico-legais, podem estar “comprometidas as suas declarações”, devido à doença de Alhzeimer e à “situação que em si sempre será stressante para qualquer cidadão em abstrato, incluindo naturalmente o examinando em concreto”.
Por outro lado, os peritos também afirmam que, caso venha a acontecer, “pode (…) estar comprometida mas não impossibilitada a prestação de depoimento sobre matéria dos temas de prova, sendo que atenta a diminuição das funções cognitivas apuradas e descritas, é expectável dificuldade acrescida seja na prestação seja na devida valoração pelo Tribunal”.
Isso significa que está fora de questão o arquivamentos dos autos?
Sim, por uma razão óbvia: não está em causa a inimputabilidade de Ricardo Salgado.
Ou seja, nem a defesa de Ricardo Salgado alguma vez solicitou que o tribunal certificasse tal inimputabilidade, nem isso está em cima da mesa. O parecer do colégio dos peritos informa isso mesmo: “Não foi invocada pelo réu a existência de falta de capacidade judiciária [inimputabilidade]”.
Sempre foi claro em todos os processos que a defesa de Ricardo Salgado não contesta que o ex-líder do BES estava perfeitamente são no momento dos factos (sejam criminais, sejam cíveis) que lhe são imputados, logo tal hipótese está fora de questão.
Qual o objetivo da defesa de Ricardo Salgado com estas peritagens?
O primeiro objetivo dos advogados Francisco Proença de Carvalho e de Adriano Squilace é consolidar o diagnóstico de que o seu cliente padece da doença de Alzheimer, de modo a sustentar mais à frente a ideia de que a defesa não consegue conferenciar com o seu cliente.
E qual é o interesse desse ponto? Na perspetiva da defesa, tal ponto é crucial, visto que poderá estar em causa o princípio da defesa. Porquê? Porque se Salgado não tem capacidade para conferenciar com os seus advogados, tem os seus direitos de defesa (devidos a todos os arguidos) diminuídos.
O que diz a jurisprudência sobre casos semelhantes?
É claro para os diversos especialistas contactados pelo Observador nos últimos meses que a jurisprudência nacional impossibilita a leitura de que os autos devem ser arquivados.
Paulo Saragoça da Matta. “Ricardo Salgado não é inimputável” e “sem dúvida que terá cadastro”
Porquê? Porque tal só poderia acontecer se estivéssemos perante uma situação de inimputabilidade legal aferida por um conselho de peritos. Isto é, Salgado teria de padecer de uma doença degenerativa no momento da alegada prática dos ilícitos criminais que lhe são imputados.
Ora, tal não aconteceu.