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O ministro de Estado e das Finanças, João Leão, fala durante a sua audição perante a Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução, na Assembleia da República, em Lisboa, 02 de junho de 2021. MANUEL DE ALMEIDA/LUSA
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João Leão diz que seguiu a recomendação do Tribunal de Contas e mudou a rubrica em que estava registada a transferência do Fundo de Resolução para o Novo Banco

MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

João Leão diz que seguiu a recomendação do Tribunal de Contas e mudou a rubrica em que estava registada a transferência do Fundo de Resolução para o Novo Banco

MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

Por entre muito "drama", Leão explicou como contornou travão à injeção no Novo Banco (até o Tribunal de Contas ajudou)

Afinal a "bomba atómica" que apagou a linha que autorizava a despesa com o Novo Banco em 2021 não foi drama. Governo mudou diploma e aprovou operação sem Parlamento e o Tribunal de Contas até ajudou.

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Como é que de uma decisão do Parlamento, que o Governo comparou a uma “bomba atómica” no final do ano passado, se chegou uma operação autorizada, calmamente no recato do Conselho de Ministros, sem precisar de mexer no Orçamento, nem convencer a oposição?

Foi a primeira e a mais insistente das perguntas colocadas ao ministro das Finanças pelos deputados da oposição na comissão parlamentar de inquérito às perdas do Novo Banco esta quarta-feira.

Governo ainda tem dúvidas sobre 112 milhões de euros da injeção no Novo Banco

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O PSD falou em dramatização quando afinal não existiam razões para tal. “Não há, nem nunca houve drama nenhum” porque o Governo conseguiu aprovar o que quis sem precisar de ir ao parlamento alterar o que quer que fosse, disse Hugo Carneiro. “Quem criou um problema foi o Governo, que criou as metáforas e chamou as crises. O parlamento lidou com a maior sensatez, como apontou o Tribunal de Contas. Este não é um problema orçamental, é um problema político”, afirmou a deputada do Bloco de Esquerda. Para Mariana Mortágua, a iniciativa do Bloco nunca impediu o cumprimento do contrato de venda do Novo Banco (que prevê a injeção) apenas queria condicionar essa operação ao resultados das auditorias e a uma nova votação parlamentar.

Cecília Meireles do CDS lembrou a pressão criada — pelo PS — sobre os deputados do PSD da Madeira para mudarem o voto e fazerem cair a proposta do BE que eliminou a transferência do Fundo de Resolução para o Novo Banco no último dia da votação da proposta orçamental de 2021.

Pausas, pressões e telefones a tocar. Como o PS tentou até ao fim salvar transferência para o Novo Banco – e falhou

Duarte Alves do PCP perguntou o que acontece se o Tribunal de Contas ou outra entidade disser que este mecanismo viola o disposto no Orçamento. O Governo tem algum plano para esse cenário?” Deixando alertas sobre medidas “para dar a volta” ao parlamento.

Numa audição muito política, João Leão respondeu que houve sim “um drama significativo” porque se levantaram dúvidas nas instâncias internacionais, em particular Comissão Europeia e Banco Central Europeu, sobre o cumprimento dos contratos em Portugal que afetaram a credibilidade do Estado português e que o Governo teve de resolver o problema. Para além dos esclarecimentos prestados várias vezes e das perguntas das agências de rating, António Costa falou ao telefone com a presidente do BCE, Christine Lagarde, para garantir que o contrato de venda do Novo Banco, ao abrigo do qual são feitas transferências anuais de capital, era para cumprir.

Costa telefonou a Lagarde. Como o BCE é decisivo na bomba que ameaça o Novo Banco

Foi também preciso convencer os bancos a emprestar mais do que estava previsto (na verdade quase o dobro) porque o Fundo de Resolução deixou de poder contar com a receita das contribuições do setor bancário para financiar a injeção no Novo Banco.

O ministro das Finanças reafirmou o que já tinha dito. “Não há nenhuma norma no Orçamento do Estado que proíba” a injeção no Novo Banco. Mas como resolveu o “apagão” que o Parlamento impôs ao eliminar a linha do quadro de despesas autorizadas ao Fundo de Resolução e cuja informação deve ser explicitada, de acordo com a lei de enquadramento orçamental.  Segundo João Leão, o Governo teve de fazer duas coisas: alterar o acordo quadro com o Fundo de Resolução para financiar as necessidades de capital do Novo Banco, permitindo que isso fosse assegurado por um empréstimo da banca (em vez do Estado) e alterar o orçamento do próprio Fundo de Resolução para incluir essa despesa.

Cumprir recomendação do Tribunal de Contas (feita no passado, mas retomada na auditoria) contornou a limitação do Parlamento

Só quando o tema chegou ao deputado da Iniciativa Liberal é que Leão tornou mais claro que afinal o Governo teve de fazer outra coisa. Cotrim de Figueiredo perguntou: “Quando estes 429 milhões forem transferidos o Fundo de resolução vai inscreve-lo em que rubrica?”

Na rubrica ‘transferências de capital’”, responde João Leão, acrescentando que nos orçamentos anteriores estavam inscritas em “ativos financeiros”, mas que o Tribunal de Contas considerou que esta inscrição “não era adequada”. É um “efeito estatístico que não tem impacto”. 

Cotrim de Figueiredo interrompe: “Tem um impacto naquilo que é a decência. (…) Porque a rubrica que foi reduzida a zeros pelo parlamento foi a dos ativos financeiros”. O deputado salienta ainda que está “à vontade” para falar do assunto porque votou ao lado do Governo no sentido de não travar as injeções, mas que “não gosta que o Governo esteja a brincar com decisões tomadas pelo parlamento”.

O deputado do Iniciativa Liberal (IL), João Cotrim de Figueiredo, intervém durante o debate parlamentar na Assembleia da República em Lisboa, 12 de maio de 2021. TIAGO PETINGA/LUSA

Deputado da Iniciativa Liberal, Cotrim de Figueiredo, lamenta que "Governo brinque" com decisões do Parlamento

TIAGO PETINGA/LUSA

João Leão insiste que está a dar seguimento a uma recomendação do Tribunal de Contas que até consta da auditoria que todos os partidos aprovaram, sobretudo os que questionam as injeções feitas no passado no Novo Banco. “Providenciar a correção do registo do financiamento público do Novo Banco pelo Fundo de Resolução, ao abrigo do Acordo de Capitalização Contingente, em contabilidade pública e na Conta Geral do Estado, de forma consistente com o registo desse financiamento em contas nacionais e na contabilidade patrimonial do Fundo de Resolução.”

“O Fundo de Resolução não pode deixar de cumprir uma recomendação”, afirmou o ministro das Finanças, omitindo contudo a indicação de que este reparo não é de agora. Já no parecer à conta geral do Estado de 2019, o Tribunal avisava que continuavam “a ser indevidamente inscritas como ativos financeiros as despesas relacionadas com o auxílio financeiro prestado pelo Fundo de Resolução ao Novo Banco, no âmbito do Acordo de Capitalização Contingente, no valor de 1 149,3 M€. Tal como referido no Parecer sobre a CGE 2018, reforça-se que este auxílio não é assumido contabilisticamente pelo Fundo como apoio reembolsável, ou seja, como um crédito sobre o Novo Banco e, portanto, não deve ser relevado na execução orçamental como ativo financeiro”..

Esclarecida o como o Governo conseguiu operacionalizar o que tinha sido travado, ficou ainda por saber o essencial sobre a injeção deste ano. Quanto e quando. Sobre os 429 milhões de euros aprovados na semana passada em resolução do Conselho de Ministros e a autorização dada esta semana ao Fundo de Resolução para realizar a despesa, o ministro das Finanças afirmou que se trata de um valor limite. O governo aprovou uma injeção “até” 429 milhões de euros, o montante proposto pelo Fundo de Resolução após todas as verificações contratuais e já 170 milhões abaixo do pedido feito pelo Novo Banco, o que acontece pela primeira vez.

As dúvidas do Governo que põem em causa 112 milhões dos 429 milhões autorizados

Mas João Leão confirmou também que há uma parte dessa despesa para a qual o Governo não deu ainda autorização ao Fundo de Resolução, como aliás tinha referido um dia antes o secretário-geral deste órgão. Em resposta a Mariana Mortágua, o ministro diz que o Governo e o Fundo têm dúvidas sobre o tratamento realizado pela gestão do Novo Banco à dívida pública e à cobertura de risco, que fez aumentar as necessidades de capital em 2020. A situação foi detetada na auditoria da Deloitte e levou a pedir mais explicações ao banco. Em dúvida estão 112 milhões de euros, disse João Leão, confirmando notícia do Observador.

Autorização para injetar 429 milhões no Novo Banco condiciona um quarto do pagamento

Por se saber ficou quando serão esclarecidas as dúvidas, se o Fundo pode avançar já com o pagamento dos apenas 317 milhões de euros autorizados, ou se vai esperar, atrasando ainda mais a injeção deste ano, o que pode levar à cobrança de juros pelo Novo Banco.

Mais injeções? “Esperamos que não”, mas há litígios e ativos por impostos diferidos de 700 milhões

Outra das frases que ficou desta audição foi a expetativa dita em tom de aviso para a administração liderada por António Ramalho. “Esperamos mesmo que não haja novas chamadas de capital. Achamos mesmo que o Novo Banco se deve concentrar na boa gestão e evitar novas chamadas.” Os deputados recordaram as palavras de António Ramalho, presidente executivo do Novo Banco, que referiu estar em aberto uma injeção de mais de 100 milhões de euros no próximo ano, mesmo que o banco cumpra a previsão de lucros para este ano, caso isso seja necessário para assegurar os rácios contratuais.

Enquanto decorria a audição, João Paulo Correia do PS citou um relatório da comissão de acompanhamento noticiado pela Lusa, segundo o qual o Novo Banco esperava lucros de 154 milhões este ano.

Novo Banco espera lucros de 154 milhões de euros este ano

Certezas sobre o fim das injeções o ministro não pode dar. Por um lado, há litígios em tribunal arbitral que podem aumentar as transferências caso a decisão seja positiva para o Novo Banco. Podem ser mais 380 milhões de euros.

Depois há ativos por impostos diferidos, um mecanismo pelo qual o Novo Banco já obteve o reconhecimento de 318 milhões de euros por parte da Autoridade Tributária e há pedidos por autorizar mais 318 milhões.

Os pedidos totais são 698 milhões. Mariana Mortágua diz que está em causa mais dinheiro dos contribuintes, para além do transferido pelo Fundo de Resolução. “É o equivalente a uma injeção anual” prevista no contrato. E se o Estado converter esses direitos em capital, isso irá diluir a posição do Fundo de Resolução. Gasta mais 600 milhões e mantém uma participação pública de 25%. O ministro das Finanças responde que este sistema se aplica a toda a banca e que decorre da lei .

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