“Apaga a luz do quarto”, “Estás a tomar banho há meia hora!”, “Fecha a torneira enquanto escovas os dentes” – estas são frases que a maioria dos pais e educadores já deve ter dito aos filhos. E será que alguns filhos também dizem aos pais? Talvez. Pelo menos, os “miúdos” que participaram na terceira edição do Prémio Energy Up têm mais ideias sobre sustentabilidade do que muitos “graúdos”.

“Os projetos que temos recebido são cada vez mais interessantes. Nesta terceira edição, recebemos diversos projetos de protótipos e soluções de energia que acabam por ir ao encontro de caminhos que estamos a percorrer dentro do nosso ecossistema de startups – o que significa que os alunos, desde cedo, estão a trabalhar focados nas soluções e com ideias que têm potencial de crescimento”, explica Sandra Aparício, responsável de impacto social da Galp e Fundação Galp, que em parceria com a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), Agência para a Energia (ADENE), Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) e Direção-Geral da Educação (DGE), têm promovido o Prémio Energy UP

“Pina Manique Circular”, apresentado pelo Centro de Educação e Desenvolvimento (CED) Pina Manique, da Casa Pia de Lisboa, foi o grande vencedor do maior concurso nacional para a transição energética nas escolas. Segundo Maria João Ulrich, professora do CED Pina Manique, este projeto “serve de chapéu a sub projetos em várias áreas”: “Temos uma horta pedagógica, um projeto de parceria com o MAAT [Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia], reciclando resíduos e dando-lhes movimento; queremos certificar a nossa escola como ‘escola lixo zero’; temos um projeto ligado à EPAL e a um melhor consumo de água da rede pública; temos outro do prémio Infante D. Henrique… Temos 6 a 7 projetos que têm este chapéu ‘Pina Manique Circular’ a funcionar como um todo”.

O CED Pina Manique dedica-se a estes temas desde 2019 e, agora que ganhou o primeiro prémio – a instalação de painéis fotovoltaicos Galp Solar no valor de 20 mil euros -, quer ir mais longe: “Para o futuro, pretendemos criar um residuário na escola, melhorar o solo – apesar de termos a horta pedagógica, queremos melhor o solo porque a nossa escola é muito grande – e fazer a redução do consumo energético, onde este prémio nos vai ajudar imenso”, acrescenta a professora. Exemplo disso é a escola EB 2/3 D. Francisco Manuel de Melo, na Amadora, que venceu a edição do Prémio Energy Up do ano passado e está a conseguir poupar 1.500 euros por mês com a redução do consumo de energia proporcionado pelos painéis.

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De acordo com Sandra Aparício, “um dos critérios do prémio é que os próprios projetos, dentro da comunidade, envolvam outros parceiros. O que significa que trabalhar o tema da energia vai além dos limites da escola: envolvem câmaras, juntas de freguesia, associações de pais, outras organizações sociais. Na verdade, a transição energética depende desta cooperação. E é isso que estamos a querer promover nas escolas: que o impacto extravase a própria sala de aula para ter impacto na comunidade”.

O espírito de cooperação e o envolvimento da comunidade foram dois fatores que também distinguiram o vencedor: “O projeto tem vindo a crescer na sua dinâmica e diversidade e a envolver cada vez mais docentes, alunos, técnicos e funcionários”, explica Margarida Zoccoli, professora do CED Pina Manique. Além disso – sublinha – “a esmagadora maioria das pessoas está no projeto voluntariamente porque acredita que vale a pena e percebe que, com os miúdos, o retorno é muito grande”.

Além do grande vencedor foram ainda atribuídos prémios em três categorias: a escola E.B. da Conceição ganhou na categoria do 1º ciclo com o projeto “À descoberta da energia”; a escola básica Aver-o-Mar foi a vencedora da categoria 2º e 3º ciclo com o projeto “Apolo” e a Escola Técnica Empresarial do Oeste venceu na categoria secundário e profissional com o projeto “Potência sobre Rodas”. Cada um destes premiados ganha 1000 euros em ticket educação e as restantes escolas das dez finalistas apuradas pelo júri neste prémio, foram distinguidas com um ticket educação de 500 euros, para continuar a investir nestes desafios.

O Prémio Energy Up realiza-se desde 2020 e, só este ano, contou com candidaturas válidas de 65 escolas.

“Metade das ideias ainda não foram inventadas”

Durante a cerimónia de entrega de Prémios Energy Up, promovidos pela Fundação Galp e pela Galp Solar, foram muitas as palavras de incentivo ao empreendedorismo, sustentabilidade e defesa do ambiente, numa conversa moderada por Joana Petiz, diretora do Dinheiro Vivo, Pedro Ruão, fundador e CEO da Omniflow, startup que desenvolve soluções de energia eólica e solar, contou que a empresa “não nasceu do dia para a noite”: “Eu estava a desenvolver peças para o setor automóvel – uma bicicleta – e, na altura, ninguém agarrou naquilo e eu deixei na gaveta. Passados dois anos, vi uma patente ser anunciada por uma marca conhecida que ganhou a Volta a França – era exatamente o mesmo conceito. Aquilo deu-me confiança. Pensei que não ia deixar passar a próxima ideia”. A ideia nasceu, mais tarde, “numa volta de bicicleta” e, até conseguir concretizá-la, Pedro ficou “fechado durante dois ou três meses”. Por isso mesmo, José Sousa, diretor de Serviços Educativos da DGE, garante que “o erro é muito importante e não tem que ser negativo”. E frisa: “O Pedro não fez à primeira. Teve a capacidade de não se resignar e não desistiu”.

Além da persistência e capacidade de resiliência, Pedro Ruão acredita que é preciso “pedir ajuda” e “acreditar nos próprios projetos”. “Os especialistas de Eólica olharam para o meu desenho e disseram ‘Isto não vai funcionar’. Só quando viram a funcionar, acreditaram. Têm de acreditar nos vossos projetos e, dentro do razoável, ouvir os professores”.

Também Manuel Andrade, diretor de Open Innovation da Galp, partilha um episódio em que duvidou da viabilidade de um projeto: “Era uma ventoinha num telhado, que funcionava para iluminar o corredor da escola. Eu achava que não ia funcionar. Mas, um dia, uma professora enviou-me um e-mail a dizer “As luzes do corredor estão acesas’”.

O diretor de Open Innovation da Galp assegura que “metade das ideias que vão ser necessárias para combater as alterações climáticas ainda não foram inventadas”. Por isso, deixa o incentivo: “Não percam a vontade de trabalhar nisto”. Manuel Andrade lembra também que a eficiência energética está nas mãos de todos nós, em pequenos gestos do dia-a-dia: “A eficiência energética é o que depende de nós. Eu não vou inventar um avião a hidrogénio, mas posso desligar a luz em casa. Há uma parte da energia que só gastam, se quiserem”.