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Esta é a última rentrée antes das europeias, agendadas para junho de 2024
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Esta é a última rentrée antes das europeias, agendadas para junho de 2024

Esta é a última rentrée antes das europeias, agendadas para junho de 2024

Relógio europeu de Costa e Montenegro começou agora a contar

Com europeias no horizonte, Costa e Montenegro entram em temporada decisiva para os respetivos futuros. PS tenta aproveitar acalmia pós-JMJ. PSD agarra-se a país real e tenta criar alternativa.

É o tiro de partida para um ciclo decisivo. Quando arrancarem para a temporada política 2023/2024, António Costa e Luís Montenegro sabem que terão no fim da meta umas europeias decisivas, que ou precipitam o fim de ciclo socialista ou alimentam a máquina de triturar líderes que é o PSD. Sendo que a partir dessas eleições, agendadas para junho de 2024, o calendário torna-se impiedoso, com autárquicas em 2025 e legislativas em 2026. Por isso, o que Costa e Montenegro fizerem ao longo dos próximos meses pode ditar muito mais do que o vencedor das europeias.

Luís Montenegro é o primeiro a entrar em jogo. O social-democrata atira-se esta segunda-feira para a histórica Festa do Pontal, devolvida desde o ano passado ao calçadão de Quarteira, apostado em recuperar o ímpeto pré-Jornada Mundial da Juventude e sabendo que esta não é uma rentrée qualquer: é a última festa de família antes das regionais da Madeira, que o partido tem obrigação de ganhar sem perder a maioria absoluta, e, sobretudo, das próximas eleições europeias, agendadas para 2024 – quando em agosto do próximo ano o partido se voltar a encontrar no Algarve, o ambiente pode vir a ser muito diferente.

Os sociais-democratas estão bem conscientes do quão importante será o próximo ano. No PSD, reconhece-se que é improvável que o clima de instabilidade que marcou o arranque da maioria absoluta de António Costa seja repetível – o que implica que o partido tenha de ir para lá do combate político corpo a corpo, à boleia dos pequenos e grandes escândalos. Tem de haver um rumo diferente para vender ao país.

Também reconhecem que António Costa tem a faca e o queijo na mão – dinheiro para distribuir, leia-se. Os investimentos do Programa Recuperação e Resiliência deverão começar a produzir os seus efeitos, a evolução da economia deverá começar a sentir-se nos bolsos dos portugueses e, em cima de tudo isto, o Governo terá no forno um Orçamento do Estado para 2024 “expansionista q.b.”, nas palavras de um destacado dirigente social-democrata.

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Ora, são fatores de natural preocupação para o PSD, que vem encurtando distâncias para os socialistas ao longo dos últimos meses. Se o PS conseguir inverter a marcha para o abismo, as europeias – um teste decisivo para a afirmação de Montenegro – podem aumentar de grau de dificuldade. É certo que entre sociais-democratas há quem desdramatize qualquer indício de recuperação de António Costa: este Governo já se mostrou incapaz de evitar os tiros nos pés, as expectativas criadas em torno do próximo Orçamento sairão inevitavelmente goradas, a bala de prata do PRR já falhou mais do que uma vez e o país real – Saúde, Escola, Habitação –, apesar das palavras socialistas, é como o azeite, virá sempre ao de cima.

Ainda assim, não basta ao PSD ser Cassandra. De resto, Montenegro tem tido dificuldades em contrariar a narrativa que se instalou de não ser capaz de apresentar e liderar uma alternativa a António Costa. Nos últimos tempos, os sociais-democratas até criaram uma secção especial no site do partido para mostrarem as propostas já apresentadas para as mais diferentes áreas. Sem grande sucesso. Neste Pontal, Montenegro mostrará parte do próximo ato social-democrata: agarrar uma bandeira clara e apresentá-la como parte do caminho para um país diferente.

A defesa de uma redução inequívoca dos impostos sobre os rendimentos será um desses sinais, ainda que não seja exatamente uma novidade no discurso social-democrata. No Orçamento do Estado para 2023, o PSD apresentou uma proposta de taxa máxima de IRS de 15% para todos aqueles que têm menos de 35 anos – excluindo o último escalão – e a redução do imposto até ao 6.º escalão num valor aproximado de 400 milhões de euros. A expectativa que existe no PSD, sabe o Observador, é de que a proposta a ser anunciada por Montenegro será muito mais ambiciosa do que aquela que foi apresentada na discussão do último Orçamento.

Os sociais-democratas sabem que a redução de impostos enquanto caminho alternativo ao PS não resolve todos os problemas de afirmação do partido. Primeiro, porque essa bandeira já está tomada pela Iniciativa Liberal e, mais importante, porque as promessas de choques fiscais são tradicionalmente recebidas com alguma desconfiança — pelos exemplos do passado — ou indiferença pelo eleitorado  — basta ver que quase 45% dos agregados familiares não pagam IRS em Portugal. A estratégia passa, por isso, por conjugar a apresentação deste tipo de propostas com a denúncia dos erros da governação socialista. No mês de setembro, logo a seguir ao Pontal, Montenegro arrancará um périplo pelas escolas para se colocar ao lado dos professores — e de Marcelo — no braço de ferro com o Governo. Todos os votos contam.

No PSD, reconhece-se que é improvável que o clima de instabilidade que marcou o arranque da maioria absoluta de António Costa seja repetível – o que implica que o partido tenha de ir para lá do combate político corpo a corpo, à boleia dos pequenos e grandes escândalos. Tem de haver um rumo diferente para vender ao país. Também reconhecem que António Costa tem a faca e o queijo na mão – dinheiro para distribuir, leia-se. Mas isso já não chega.

Respirar fora de água. Finalmente

A passagem do Papa Francisco por Portugal e sobretudo a onda da Jornada Mundial da Juventude deixou no PS um sentimento de descompressão. No partido o que se sente, tendo em conta os contactos feitos pelo Observador, é que neste momento há condições para respirar fora de água, depois de uma primeira metade do ano intensa, com inúmeras crises políticas e a ideia de dissolução a pairar sobre as cabeças — ainda por cima saindo, de forma mais ou menos académica, da boca da única figura que tem essa arma na mão: o Presidente da República.

O ano político foi traumático para o PS, sobretudo quando muitas das mazelas do Governo foram auto-inflingidas, pelo que entre socialistas a expectativa é que a semana papal e o sucesso da Jornada Mundial da Juventude em Lisboa possa funcionar como um balão de oxigénio mediático, uma barreira a separar um antes e um depois. E de preferência que este “depois” traga estabilidade política e novidades das Finanças já na rentrée, com o levantar do véu relativamente ao Orçamento do Estado para o próximo ano, sobretudo com medidas apontadas ao crédito à habitação — pressionadíssimo pelas elevadas taxas de juros — e ao IRS.

Mas no que diz respeito a grandes expansionismos no OE, a conversa do ministro das Finanças tem sido irregular e de poucas certezas para acalmar ansiedades socialistas. Há cerca de um mês, Fernando Medina  escreveu um artigo de opinião no Expresso a arrefecer as expectativas, ao dizer que “um país que retomou a rota de convergência com a União Europeia há poucos anos, que tem uma dívida ainda elevada e que está a recuperar a sua credibilidade financeira não tem folgas orçamentais.”

A frase é colada a um antepassado na mesma pasta, o seu amigo Mário Centeno que, sete meses antes (por altura do apoio de 240 euros para as famílias mais vulneráveis), tinha deixado recados à política orçamental do Governo. O governador do Banco de Portugal veio, nessa altura, lembrar a “dívida que Portugal tem” e como “este é o momento para reduzir a dívida e o défice” — e até seguia a linha do BCE, pedindo freio nos apoios à economia, referindo que essa política não podia “dificultar a política monetária de combate à inflação”. O sinal teria de ser de poupança e não outro qualquer.

Medina recebeu a mensagem, mas a pressão socialista é, no entanto, elevada, com o mesmo ministro a já ter surgido entretanto com um discurso mais ameno. Em entrevista ao Público, no final de julho, disse que ainda há caminho a percorrer no apoio às famílias com problemas no crédito à habitação, apertando o cerco à banca nesta matéria, com a defesa de uma taxa fixa temporária para quem já tem crédito. E se esta medida pode ter impacto orçamental zero, a bonificação de juros que o ministro disse pretender alargar, nessa mesma entrevista, já o terá. O mesmo para o fim das cativações — enraizadas por Centeno na política dos governos de Costa — ou a descida do IRS, sobre a qual tudo está por anunciar, menos a intenção de que ela tenha impacto sobre a classe média.

Pelo meio, o PS espera poder pôr a render no palco político os projetos do Plano de Recuperação e Resiliência, numa mistura de medidas do Governo e fundos europeus que possa resultar naquilo que os socialistas mais têm investido o seu discurso: que o país esteja melhor e os portugueses sintam isso mesmo nas suas vidas. É com essa espécie de argamassa que o partido espera assentar a estrutura da próxima campanha eleitoral, a das europeias, a primeira de um longo ciclo que só terá fim nas legislativas de 2026 — se tudo correr como o previsto — e que passará por autárquicas e até presidenciais.

Seguir para a estrada com capital sobre o bolso dos portugueses que possa fazer esquecer a crise maior. Com todo o desgaste político acumulado, esta pode ser a vantagem competitiva face à oposição que no PS se acredita ter perdido o élan da ideia da dissolução, que chegou a ser persistente, tendo entretanto perdido oportunidade.

E se o Orçamento será um marco para esta fase que se segue na política nacional, não será só pelo que poderá trazer. Mas também por existir a expectativa — a começar no partido, das bases ao topo — de uma renovação da equipa de António Costa depois de apresentado e aprovado o OE e que isso possa permitir ao Governo reganhar a capacidade de iniciativa política. No partido a teoria divide-se sobre o timing dessas alterações, com Costa a resistir — como tem sido seu hábito — a remodelações, empurrando essa necessidade para quando for inevitável, como pode acontecer se decidir retirar do Governo elementos para compor a sua lista para o Parlamento Europeu (nos primeiros meses de 2024).

O presidente do partido tem tido mais pressa e há muito que defende uma remodelação, não tendo deixado cair essa ideia nem mesmo no Conselho de Estado de julho, onde se fez a primeira avaliação da gestão de Costa depois da promessa presidencial de apertar a malha ao Governo no rescaldo da crise Galamba. Nesse primeiro take do órgão de aconselhamento do Presidente, Carlos César recorreu à ironia para falar na remodelação naquele fórum:  “Não é dramático existirem 13 demissões, embora eu pessoalmente até ache que deviam ter saído mais”.  

Nesta fase, os socialistas sentem essas alterações como inevitáveis e têm apontado a necessidade de maior pulso político e que isso possa sobretudo significar a redução das probabilidades de novos episódios de caos político endógenos, ou seja, provocados precisamente por elementos da própria equipa de Costa. O início do ano vai trazer o lançamento de um novo ciclo eleitoral, para o qual a direção conta com o próximo congresso — empurrado precisamente para essa altura –, e a expectativa é que o PS também possa ganhar um embalo refrescado para a segunda metade final da legislatura, que será simultaneamente a recta final da era Costa.

Apesar de toda a descompressão que os socialistas possam sentir ou tentar sentir nesta fase, há um elemento que promete dificultar que o que se passou no último ano caia no esquecimento. O Presidente da República deixou pendente o tal segundo round do Conselho de Estado da avaliação política do Governo, sobretudo o que tem a dizer sobre a TAP — e Marcelo ainda não falou e admitiu que, quando falar, possa dizer finalmente o que pensa sobre o caso, depois da comissão de inquérito que começou com anterior ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, no centro e terminou focada no atual responsável pela pasta, João Galamba, o ministro que o Presidente já disse que não o devia ser. Se o PS se empenha em fazer desse um capítulo esquecido no passado, Marcelo guardou precisamente para o mês da rentrée tornar pública a sua própria memória desse período conturbado — e não será uma memória bonita.

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