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DIRETAS PSD: eleições internas do Partido Social Democrata - PSD - entre Rui Rio e Paulo Rangel, para a liderança do partido. Sede de campanha de Rui Rio, atual líder e re-candidato à liderança do partido, no Hotel Sheraton do Porto. Momento em que se soube da vitória. 27 de novembro de 2021. TOMÁS SILVA/OBSERVADOR
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TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Cinco opiniões rápidas sobre como Rui Rio conseguiu voltar a conquistar o PSD

André Azevedo Alves, Filomena Martins, Nuno Gonçalo Poças, Pedro Jorge Castro e Raquel Abecassis analisam as razões que levaram à reeleição de Rio e à derrota de Rangel e os desafios que se seguem.

André Azevedo Alves. O triunfo das bases

Mas talvez o dado mais relevante dos resultados das eleições no PSD seja o contraste entre Lisboa e o resto do país. Paulo Rangel conseguiu uma vitória em Lisboa por ampla margem, com quase 60% dos votos, mas perdeu para Rui Rio as restantes principais distritais do PSD. Estes resultados demonstram uma vez mais que Lisboa não é uma amostra representativa da opinião das bases nacionais do PSD.

Rui Rio sai legitimado e reforçado das eleições internas de hoje. Depois de ter tido a clarividência de perceber que evitar uma clarificação interna antes das eleições legislativas seria suicidário para o PSD, Rio consegue manter a liderança contra uma candidatura apoiada por grande parte dos notáveis do partido e que contou até com sinais (pouco) discretos de apoio por parte de Belém. Conforme escrevi aqui há um mês, o que estava fundamentalmente em causa nestas eleições no PSD não era Rangel, mas sim uma coligação anti-Rio de que Rangel foi cabeça de cartaz. A oposição a Rio e o desígnio de o afastar da liderança do partido foram os principais elementos de união em torno da candidatura de Rangel. Elementos esses que não chegaram para convencer a maioria dos militantes do PSD.

O líder do PSD poderá também tentar capitalizar a imagem de resistente, com a vitória interna sobre Rangel a somar-se aos bons resultados obtidos pelo PSD nas recentes eleições autárquicas. Mas talvez o dado mais relevante dos resultados das eleições no PSD seja o contraste entre Lisboa e o resto do país. Paulo Rangel conseguiu uma vitória em Lisboa por ampla margem, com quase 60% dos votos, mas perdeu para Rui Rio as restantes principais distritais do PSD. Em Braga, Rio venceu com 52% e no Porto e em Aveiro conseguiu vitórias muito expressivas com, respetivamente, 59% e 62% dos votos. Estes resultados demonstram uma vez mais que Lisboa não é uma amostra representativa da opinião das bases nacionais do PSD.

À direita, a manutenção de Rio será provavelmente benéfica para a Iniciativa Liberal (para quem Rangel poderia ser uma maior ameaça no curto prazo) mas também, pelo seu estilo de liderança, potencialmente um maior travão ao crescimento do Chega do que seria um PSD liderado por Paulo Rangel. Em qualquer caso, o grande desafio para Rui Rio será conseguir nos próximos dois meses capitalizar a dinâmica gerada por esta vitória interna e afirmar-se como uma alternativa de governação ao PS, algo que não conseguiu fazer em 2019. 

Filomena Martins. Os vários erros de Paulo Rangel e o all in de Rui Rio

Os notáveis que vivem em Lisboa e Porto, que estão nos centros de poder, que queriam uma nova liderança e há muito andavam a corroer Rio, podem até estar política e ideologicamente certos sobre a necessidade de mudar a direita, mas não valem vitórias. Porque, nas contas das concelhias e de quem nelas manda, o que conta mesmo é quem está mais bem colocado para ser primeiro-ministro e depois pode distribuir lugares.

Não sei do que falaram Paulo Rangel e Carlos Moedas no almoço da última quarta-feira. Mas sei que almoçaram tarde de mais. E que a conversa não foi nada útil.

Rangel deveria ter aprendido pelo menos duas coisas com a vitória de Moedas em Lisboa: uma, que não há vitórias garantidas, como muito bem percebeu também tarde de mais um choroso Fernando Medina; e outra, que a conquista da capital pelo PSD e os bons resultados autárquicos deram a Rui Rio uma força que tinha claramente perdido, renovaram-no nos debates e fizeram-no mostrar umas garras que antes nem se sabia que ele tinha como líder da oposição.

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Foi por isso um almoço e um apoio muito tardio e de onde não terão saído conselhos a tempo ou sequer bons conselhos. Porque outro dos erros de Rangel foi esse mesmo, não perceber que os anos que Rio leva de PSD lhe deram já demasiadas voltas pelas bases, pelos militantes locais, que agora lhe deram o voto.

Os notáveis que vivem em Lisboa e Porto, que estão nos centros de poder, que queriam uma nova liderança e há muito andavam a corroer Rio, podem até estar política e ideologicamente certos sobre a necessidade de mudar a direita, mas não valem vitórias. Porque, nas contas das concelhias e de quem nelas manda, o que conta mesmo é quem está mais bem colocado para ser primeiro-ministro e depois pode distribuir lugares.

E é aqui que chegamos ao triunfo final jogado por Rio. Quando deixou Rangel sozinho no palco, sem querer debater com o seu adversário interno, e disse ao país e aos seus militantes que — já com legislativas marcadas — só faria oposição, fez all in. Era o tudo ou nada. E ele sabia estar em aparente vantagem.

Rangel, mesmo que ganhasse, teria pouco tempo para se afirmar, para organizar o partido, para ganhar notoriedade mediática e para se preparar para a campanha com Costa (que não iria ser bonita de ver). Rui Rio está há anos quase todos os dias nas televisões, todos sabem quem é, vem de bons resultados autárquicos e tem estado ao ataque nos últimos tempos.

E depois há também aquele detalhe tremendo que foi a última sondagem da TVI/CNN que colocava os sociais-democratas quase colocados ao PS se liderados por Rio, mas muito longe dos socialistas se Rangel se tornasse o seu presidente.

Feitas as contas, virá aí um governo de bloco central?

Nuno Gonçalo Poças. Ventura, Costa e os Liberais podem celebrar

Os militantes deixaram isso claro: assim que Passos saiu, o passismo deixou de ser bem-vindo. Rangel não representava a herança do passismo. Mas não teve a capacidade de ultrapassar a narrativa que se gerou e que o associava a esse passado.

Tinha aqui dito, na noite das eleições autárquicas, que começava a ser demasiado evidente que o PSD tinha deixado de ser um partido com ambição nacional e de representar uma alternativa política séria, para passar a ser um mero aglomerado de pequenos domínios locais, que, todos juntos, formalizam uma liderança. O PSD surgiria, por isso, mais como alternativa formal do que substantiva de poder. Se houvesse dúvidas, as diretas dissiparam-nas.

Houve um dado que escapou a muita gente ao longo das últimas semanas relativamente ao aparente apoio das estruturas internas do PSD a Paulo Rangel. É que os partidos não são feitos de uma dicotomia feita entre os dirigentes das estruturas distritais e concelhias e o “militante livre”. A militância partidária é cada vez menos feita de liberdade, mesmo que Paulo Rangel tenha afirmado, educadamente, o contrário: as estruturas dividem-se entre caciques incumbentes e caciques oposicionistas locais, todos com os respetivos “sacos de votos”. E ganha, no fim das contas, o mais capaz de arregimentar os cabos eleitorais em cada região, que podem nem ser dirigentes. Para o fazer, o candidato a líder tem de criar a convicção na militância – ou nos cabos eleitorais – de que poderão, consigo, ter acesso aos lugares de poder: não só ao Parlamento, mas às direções dos hospitais, das administrações regionais, aos lugares nos centros distritais da Segurança Social, enfim, a lista é interminável.

Rui Rio teve esse mérito. Conseguiu criar essa convicção numa militância que está há seis anos arredada do aparelho do Estado. Porque ninguém crê verdadeiramente que Rui Rio ganhe as legislativas a António Costa, mas torna-se mais interessante para o PSD se puder aproximar o partido do poder enquanto não ganha eleições. Rui Rio deu-lhes a convicção de que isso pode acontecer.

É possível, também, que a maioria dos militantes do PSD queiram, definitivamente, romper com o legado do passismo. O reformismo de Passos nunca foi consensual no PSD, e nem a sua chegada ao Governo em 2011 atingiu essa meta. A militância do PSD, ou boa parte dela, nunca lhe perdoou o fim dos governos civis, a reforma das freguesias, o facto de muitos militantes socialistas se terem mantido nas esferas do poder entre 2011 e 2015, e mesmo as reformas e medidas duras que teve de tomar para recuperar o País do descalabro financeiro em que se encontrava. O mito sebastianista em torno de Passos Coelho gerou-se com o resultado inesperado de 2015, mas foi sempre claro que a maioria dos portugueses não ia aceitar o seu regresso, e que a militância do PSD só o tolerava por causa desse mito que se gerou no pós-geringonça. Os militantes deixaram isso claro: assim que Passos saiu, o passismo deixou de ser bem-vindo. Rangel não representava a herança do passismo. Mas não teve a capacidade de ultrapassar a narrativa que se gerou e que o associava a esse passado.

Num partido que perdeu a ambição de ser uma alternativa política profunda ao PS, Rangel teria muitas dificuldades em fazer passar uma mensagem aos militantes que passasse mais pela criação de um programa alternativo de poder aos socialistas. Mesmo um refrescamento total das suas equipas não o conduziria à liderança. Ensaiou um grande projeto político com o seu discurso de anúncio de candidatura, mas não bastou. O PSD, sendo o aglomerado de instalados em que se tornou, cada vez mais afastado da realidade dos portugueses que está, tornou-se demasiado conservador para tolerar a novidade e a ruptura. Imagine-se quem está a festejar a esta hora.

Pedro Jorge Castro. Rio tem mau ganhar? E vai mudar a música para Rocket Man?

Aquele “vou ganhar” não foi de plástico, não saiu como as frases que os políticos são obrigados a dizer. Veio de dentro. Acredita mesmo nisso. E sabe que o contexto pode ajudar. Mas vai depender e muito do que fizer nos próximos dois meses. E também de como o fizer. A 30 de janeiro pode voltar a ouvir-se Elton John na sede do PSD, mas a música terá de ser outra.

O homem acaba de ter uma vitória incrível. Correu-lhe tudo bem. Correu-lhe melhor ainda porque não era esperado. Teve a maioria do aparelho contra ele. Abdicou de fazer uma campanha clássica de candidato. Recusou entrar em debates. Assumiu de forma clara que está disposto a juntar-se ao PS, caso ganhe sem maioria e caso perca as legislativas. Conseguiu vencer umas eleições que não queria disputar, sai reforçado deste processo, vai ser o candidato a primeiro-ministro com hipóteses de abanar António Costa. Quais são as primeiras palavras neste momento decisivo?

Tanto azedume, caramba. Começou pelo ataque aos dirigentes das distritais e das concelhias, que têm de se ligar mais aos militantes e que se moveram (“não todos”, ressalvou, vá lá) por interesses pessoais e não interesses do partido. E não resistiu a mandar a bicada aos comentadores: ele não viu, mas fez questão de insinuar que estariam “naturalmente” na tv a dizer que o povo se enganou. Mesmo na parte básica em que se esperaria o apelo à união, preferiu pôr dinamite na ponte, acusando aqueles que não se querem unir.

Rui Rio é um alvo fácil, põe-se sempre demasiado a jeito, parece que faz de propósito para baixar expectativas, fazer-se de calimero sob ataque e capitalizar depois. Mas faltam dois meses para eleições legislativas e ele sabe que o PSD começa a sentir o cheiro do poder. As sondagens que continuam a dar vitória a António Costa são na verdade um trunfo, mais uma vez.

A 30 de janeiro, teremos novo duelo: de um lado estará o (ainda?) favorito, um político experiente e hábil, mas a dar sinais de fastio, altivez e arrogância, e que pode ter de pagar um preço ainda incalculável por uma postura demasiado complacente com os seus camaradas mais próximos, a começar pelo escândalo e pela indignidade que é a resposta ao acidente com o carro onde seguia Eduardo Cabrita.

Do outro lado, com menores expectativas, estará um político atabalhoado, truculento e sem grande eficácia a comunicar, mas que tem sido um sobrevivente. Não há obstáculo que não tenha conseguido superar e mostrou mais uma vez que estará para durar. Aquele “vou ganhar” não foi de plástico, não saiu como as frases que os políticos são obrigados a dizer. Veio de dentro. Acredita mesmo nisso. E sabe que o contexto pode ajudar. Mas vai depender e muito do que fizer nos próximos dois meses. E também de como o fizer.

Na sede de Rui Rio ouviu-se Elton John com “I’m still standing”. O artista pode manter-se a 30 de janeiro, mas a música terá de mudar entretanto. Dificilmente terá o eleitorado a cantar-lhe em coro o fim de Your Song (How wonderful life is while you’re in the world). Mas compete-lhe mostrar que tem potencial para chegar a Rocket man:
“I’m not the man they think I am at home
Oh, no, no, no

I’m a rocket man
Rocket man, burning out his fuse up here alone”

Raquel Abecassis. Uma surpresa nunca vem só

Rio apostou tudo em garantir que é e sempre foi o mesmo, não fugiu às questões difíceis, não teve medo de ser polémico quanto a entendimentos com o PS e garantiu que é por tudo isto que está preparado para ser primeiro-ministro. Num cenário de eleições a curtíssimo prazo este foi o discurso que convenceu os militantes. Preferiram jogar pelo seguro.

Será que à terceira é de vez? Não só pelo discurso, mas, sobretudo, pela atitude de Rui Rio na declaração de vitória parece que sim. Agora que está mesmo picado parece ter perdido o complexo de patinho feio e estar disposto a ir a eleições numa guerra de tudo ou nada. De peito cheio, não responde a cenários de derrota nas próximas eleições e garante que vai ganhar. No passado os portugueses já mostraram que gostam destes perfis em horas de aflição: a imagem do homem austero, que corta a direito, que vem do povo e que não pertence à elite lisboeta. Lembram-se do eixo Lisboa-Cascais sulista, elitista e liberal?

Rangel volta para Bruxelas e, ou muito me engano, ou arrumou de vez o sonho de vir um dia a ser líder do PSD. Estas diretas provaram mais uma vez que em democracia não há vencedores garantidos, que poucos dias de campanha podem fazer toda a diferença e que o que se faz ou não faz tem um impacto decisivo na escolha do eleitor. Rangel foi dizendo o que achava que a direita queria ouvir e fugiu das questões mais difíceis num cenário pós-eleitoral. Rio apostou tudo em garantir que é e sempre foi o mesmo, não fugiu às questões difíceis, não teve medo de ser polémico quanto a entendimentos com o PS e garantiu que é por tudo isto que está preparado para ser primeiro-ministro. Num cenário de eleições a curtíssimo prazo este foi o discurso que convenceu os militantes. Preferiram jogar pelo seguro.

O sofá onde todos os comentadores disseram que António Costa esteve deleitado a assistir ao espetáculo das eleições do PSD, deve estar agora desocupado. Se tem faro político Costa deve estar preocupado. Rio pode bem ser o cavalo de tróia que vai ao campo do PS buscar os votos que normalmente dão vitórias eleitorais. Enquanto o primeiro-ministro esteve despreocupadamente a apaparicar a esquerda, Rui Rio provou com esta vitória que está e quer ocupar ainda mais o espaço do centro responsável.

A noite eleitoral do PSD deve ter sido celebrada também com champanhe lá para os lados do Largo do Caldas. A vitória de Rui Rio reabre a esperança de que o CDS possa ainda sobreviver às eleições de 30 de janeiro. Aguardemos as cenas dos próximos episódios.

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