Um vídeo publicado no Facebook começa por mostrar a cara do empresário e antigo deputado do PS Henrique Neto e a afirmação feita por ele em 2010, muito crítica para o então primeiro-ministro José Sócrates, em que reclamava: “Isto é uma máfia que ganhou experiência na maçonaria.” O vídeo segue com a afirmação: “Dos 230 deputados, pelo menos 206 dependem da maçonaria.”

“A maçonaria e outras elites que se apoderaram de Portugal são um clube VIP e acham que Portugal é que tem de sustentar os luxos do clube e os contribuintes é que pagam as quotas”, consta ainda no vídeo que se tornou viral. Depois segue com uma peça da SIC sobre as ligações parlamentares à maçonaria.

Tudo isto sem referir datas. Mas a peça da SIC permite perceber que se trata de uma notícia de 2012, feita com base num artigo então publicado pelo Diário de Notícias onde era explicado que três dos líderes parlamentares dessa altura eram membros da maçonaria. Conclusão: “Dirigem, ao todo, 206 deputados. Ou, dito de outra forma, quase 90% da Assembleia da República.”

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Os líderes parlamentares referidos eram Luís Montenegro (PSD), Carlos Zorrinho (PS) e Nuno Magalhães (CDS). Nenhum deles é hoje deputado: Montenegro é o líder do PSD, Zorrinho é eurodeputado e Magalhães afastou-se da vida política depois de o CDS ter perdido representação parlamentar e trabalha atualmente na consultora de comunicação LLYC (Llorente y Cuenca).

Tanto na peça que consta no vídeo como no artigo do Diário de Notícias, não é dito que 206 deputados dependem da maçonaria, mas sim que esse mesmo número de parlamentares responde a líderes parlamentares que pertencem a esta organização.

A pertença de deputados a organizações como a maçonaria ou o Opus Dei — ambas referidas neste vídeo — sempre gerou grande controvérsia e, nos últimos anos, o Parlamento discutiu uma alteração legislativa que obrigasse os deputados e titulares de cargos públicos a declararem, no seu registo de interesses, se pertencem a associações e organizações como por exemplo as duas já citadas.

Em 2021, depois de propostas do PSD e do PAN, o Parlamento aprovou e o Presidente promulgou a lei que obriga os titulares de cargos políticos e altos cargos públicos a declarar a “filiação, participação ou desempenho de quaisquer funções em quaisquer entidades de natureza associativa”, como por exemplo a maçonaria, Opus Dei ou clubes, “exercidas nos últimos três anos ou a exercer cumulativamente com o mandato”. Depois de intenso debate ficou acautelado que isso terá de acontecer, mas “desde que essa menção não seja suscetível de revelar dados constitucionalmente protegidos como sejam os relativos à saúde, orientação sexual, filiação sindical ou convicções religiosas ou políticas, casos em que tal menção é meramente facultativa”.

Na altura da promulgação da lei, o próprio Presidente da República sublinhou que a declaração “exclui de tal obrigatoriedade dados que possam revelar designadamente convicções religiosas — todas elas — ou políticas – também todas elas e não apenas partidárias — ficando, assim, muito significativamente circunscrito o escopo da modificação aprovada pela Assembleia da República”. Tanto a maçonaria como o Opus Dei interpretaram esta especificação como dirigida aos casos concretos dos seus membros. Esta declaração  é facultativa e, no atual registo de interesses, não consta qualquer declaração associativa do género.

Presidente da República promulgou lei que obriga deputados a declararem pertença a associações

Conclusão

O vídeo feito com recurso a uma peça da SIC, que por sua vez já tinha por base um trabalho do Diário de Notícias, não faz qualquer referência a datas, mas trata-se de informação relativa a 2012, ou seja, com mais de dez anos — desde então já houve três composições diferentes da Assembleia da República. Além disso, as notícias não referem que há 206 deputados são dependentes da maçonaria, mas sim de líderes parlamentares que pertenciam à maçonaria. Não é a mesma coisa, até porque os presidentes das bancadas parlamentares são apenas um dos elementos da organização interna dos partidos, dependendo sempre, em última linha, das orientações das direções dos mesmos. A publicação acaba por induzir quem a lê em erro, tendo em conta que não localiza o conteúdo no tempo. Também não há informações que permitam concluir que, atualmente, a maioria dos deputados dependam na maçonaria — a declaração é facultativa e no registo de interesses nenhum deputado declarou essa associação.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ENGANADOR

No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

PARCIALMENTE FALSO: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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