O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, perante um cenário de não aprovação do Orçamento do Estado para 2022, alertou para o impacto que isso teria, nomeadamente na aplicação dos fundos europeus, agora que vem o cheque chorudo da “bazuca”.
A não aprovação do Orçamento levaria, acrescentou o Presidente, o país a eleições antecipadas, o que significa que um novo documento orçamental, na melhor das hipóteses, estaria concluído em abril, “supondo que era fácil aprová-lo”. E, até lá, o Governo em gestão teria de funcionar em duodécimos, ou seja, só poderia gastar uma percentagem do orçamento de 2021.
Marcelo pressiona acordo e avisa que sem Orçamento não há duodécimos, mas eleições antecipadas
O que acontece, então, caso não haja Orçamento em janeiro de 2022, o ano em que o PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) entra em força em Portugal e que, conforme já realçou o ministro das Finanças, João Leão, poderá contribuir em dois pontos percentuais para os 5,5% de crescimento económico projetados pelo Governo? Esse será, desde logo, o primeiro “custo” da não aprovação: o cenário macroeconómico poderá ficar comprometido.
Mas não seria a isso que Marcelo Rebelo de Sousa se estaria a referir. O Governo inscreveu no Orçamento do Estado uma receita superior a 3 mil milhões de euros para 2022, por estimativa do que recebe de Bruxelas, com uma contrapartida de despesa de 3,2 mil milhões para “investimento público e outra despesa no âmbito do PRR”. Só o investimento público à conta da “bazuca” será superior a mil milhões.
E é este cabimento orçamental que deixa de existir, caso não haja Orçamento do Estado para 2022. O que significa que, sem essa inscrição, não há dinheiro extra a entrar nem a sair. O próprio ministro das Finanças, João Leão, garantiu, numa entrevista ao Eco, que não haver Orçamento “cria dificuldades na execução do PRR”. Mas, ao mesmo tempo, admitiu poder haver soluções que podem ser exploradas. Ao Observador, vários economistas sustentam que poderá haver soluções para limitar o impacto, ainda que alinhem na conclusão de que não compromete o PRR mas dificulta. Até porque, acrescentam, ir para eleições significa haver um Governo de gestão limitado e o país distraído.
Mas a limitação não é apenas para o Governo. Todos os organismos que têm a incumbência de aprovar candidaturas e distribuir dinheiro ficam sem enquadramento para executar verbas. Também as autarquias ficariam com as mãos atadas, nomeadamente nos níveis de endividamento que podem ter. E, conforme se lê no diploma que entrou em vigor em junho deste ano: “As antecipações de fundos para projetos exclusivamente financiados pelo PRR são financiados por operações específicas de Tesouro a contrair pela Agência IP, junto do IGCP, e mediante ordem de pagamento emitida pela Recuperar Portugal, em cumprimento dos limites e nos termos estabelecidos no Orçamento do Estado de cada ano”.
Mas, ainda que se reconheçam dificuldades, haver eventual orçamento em abril, após eleições, pode não ter grande impacto no PRR, uma vez que os concursos continuam a poder ser lançados. E dificilmente haverá distribuição de verbas chorudas até essa altura.
Por outro lado o facto de os fundos do PRR não terem contrapartida nacional — ao contrário de outros programas europeus — facilitaria a execução do PRR. Isto significa que, nos programas “normais”, o Estado tem de entrar com um percentual do investimento do projeto, em cima do financiamento comunitário. No PRR, não há essa verba nacional. O projeto pode ser financiado na totalidade por Bruxelas. Mas a não execução das verbas do PRR ditam a perda desses financiamentos.
Outra questão adicional neste orçamento para 2022 é que está a encerrar-se o anterior quadro plurianual de fundos europeus — o PT 2020. Mas nesse programa há verbas inscritas no Orçamento de 2021, pelo que haveria algum cabimento já em 2022. E quanto ao PT 2030, o que pode ficar comprometido é a conclusão das negociações com Bruxelas para fechar o Acordo de Parceria que ainda não está assinado.
Conclusão
Não haver Orçamento pode, assim, dificultar a implementação do PRR. Mas admite-se que possam existir soluções para que a execução dos fundos não seja travada.
Segundo a classificação do Observador, este conteúdo é:
PRATICAMENTE CERTO
Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.