Mesmo com meses e meses de pandemia, ainda existe muita desconfiança sobre a origem do vírus nas redes sociais. Nesse sentido, surgiu um post no passado dia 29 de novembro, onde se partilha um estudo que contém uma menção ao novo coronavírus. “O SARS-CoV-2 já estava bem identificado num estudo de 2007! Como é que isto se explica?”. Trata-se, no entanto, de uma alegação falsa.

Post viral que alega que o novo coronavírus surgiu em 2007.

“Não tem nada a ver com o vírus atual. Este paper é sobre uma nova tecnologia que permite fazer algo chamado vírus like particles (VLP), que são partículas quase iguais às do vírus mas que não têm nada lá dentro”, começa por explicar ao Observador o virologista Pedro Simas.

Outro virologista, Celso Cunha, confirma que nenhuma daquelas designações “corresponde ao vírus que causa a atual pandemia”. “Trata-se de três isolados diferentes, que não são necessariamente estirpes, obtidos a partir de doentes infetados com SARS CovV, em 2003. Na altura o SARS-CovV representava, de facto, um novo coronavírus humano diferente de todos os outros até então conhecidos. Propagava-se mais facilmente e tinha uma taxa de mortalidade elevada — entre 3% e 10%, aproximadamente —, o que não sucedia com os outros coronavírus que então circulavam. Portanto, este artigo, que incide sobre os vírus que circulavam em 2003, é sobre o desenvolvimento de testes de diagnóstico”, diz.

Pedro Simas partilha uma análise do estudo mas, a partir daqui, a descrição do especialista ganha contornos mais técnicos. “Os cientistas usaram uma proteína semelhante à de um vírus que infecta bactérias (bacteriófagos) e essa proteína, quando é lesada, tem um sinal que é reconhecido por moléculas de RNA (ácido ribonucleico)”, prossegue Pedro Simas, num relato partilhado com o Observador. Ora, “quando o RNA é produzido em simultâneo com a proteína viral, que, no fundo, mimetiza uma infeção, que encapcida numa VLP, mas que tem um RNA. Estas partículas são imunogénicas e [são] a base das vacinas que previnem, por exemplo, o cancro do colo do útero ou o da garganta”. É assim que o virologista Pedro Simas começa por desmistificar a verdadeira informação por detrás do estudo partilhado no post original.

“Com este paper, conseguiram meter moléculas de RNA, com 500 bases, inventando um método de criar RNA’s mais longos. Ou seja, foram buscar um fragmento genómico da Hepatite C, três segmentos genómicos distintos de SARS-CovV — o único que se conhecia à data — e incluíram mais um RNA do vírus de influenza e outro do H5N1, junção que pode ser usada de diferentes formas”, comenta.  O virologista acrescenta ainda que muitas destas VLPS são utilizadas como “um controlo positivo, se se quiser fazer a carga viral da hepatite C, caso contenham o RNA desse vírus”, por exemplo.

Finalmente, é importante dizer que o SARS foi descoberto em 2003 e que, hoje em dia, as nomenclaturas visíveis no paper sobre já não poderiam ser utilizadas como segmentos genómicos. “Agora já provavelmente não utilizariam estes nomes, porque o SARS Cov1 e o SARS Cov2 foram adotadas para vírus. Falta dizer, porém, como garantido por Pedro Simas, que o SARS Cov3 referido no texto, “não existe”, enquanto vírus.

Conclusão

Não é verdade que o SARS COV2 — vírus responsável pela pandemia da Covid-19 — tenha surgido em 2007. Como explicado pelos virologistas Pedro Simas e Celso Cunha, o que surge no estudo do post viral são segmentos  genómicos do SarsCov, obtidos a partir de doentes infetados com aquele vírus, que surgiu em 2003, o único que existia à data daquela publicação, que foram incluídos num novo método onde foi criado um RNA mais longo para depois criar um virus like particles (VLP), que são partículas quase iguais às de um vírus mas que não têm nada lá dentro. Estes VLPS são partículas imunogénicas e são a base de vacinas que previnem, por exemplo, o cancro do colo do útero ou o da garganta. Ou seja, basicamente, o estudo incide sobre o desenvolvimento de testes de diagnóstico.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook

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