Uma ilustração publicada no Facebook sugere que a zaragatoa utilizada para realizar um teste PCR para deteção do SARS-CoV-2 tem a capacidade de danificar as amígdalas cerebelosas e tornar as pessoas mais crédulas e submissas. A suposta intervenção surge comparada com uma imagem que, segundo a legenda, demonstra uma prática supostamente comum no Antigo Egito, em que as amígdalas dos escravos eram lesadas propositadamente para garantir que obedeciam cegamente às chefias.

A publicação em análise.

Na verdade, a imagem partilhada na publicação não mostra qualquer tipo de ataque a um escravo: é uma pintura de 1.200 a.C. encontrada no túmulo do vizir Ipi, atualmente aos cuidados do Instituto Papiro (Cairo, Egito) que ilustra um oftamologista a examinar os olhos de um artesão. A ilustração surge até num estudo científico publicado em 1997 na Acta Oftamológica Escandinava intitulado “Os olhos e as suas doenças no Antigo Egito”, redigido por Sigurd Ry Andersen, do Instituto de Patologia do Olho, em Copenhaga.

Ophthalmologist treating a patient, papyrus, reconstruction of a fresco from the Theban tomb of Ipi, originally dating back to the Dynasty XIX. Egyptian civilisation.

Reconstrução de um fresco do túmulo de Ipi, datado de 1.200 a.C., que mostra um oftamologista a examinar um doente. Créditos: DeAgostini/Getty Images

Mesmo que a imagem demonstrasse algum tipo de intervenção nas amígdalas cerebelosas de uma pessoa, estruturas do sistema nervoso envolvidas no controlo das emoções e impulsos, não era possível que o cotonete utilizado num teste PCR tivesse a capacidade de as danificar. É mesmo anatomicamente impossível: tal como o Observador já explicou num fact check publicado em março, não há nenhum ponto do trato respiratório que entre em contacto com o crânio.

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Fact Check. Zaragatoas dos testes à Covid-19 abrem uma entrada direta no cérebro?

A zaragatoa utilizada na recolha de uma amostra para testagem à presença do SARS-CoV-2 é introduzida nas narinas e esfregada na nasofaringe, que fica imediatamente atrás do nariz e acima do palato muscular — a superfície por trás do céu da boca — como indicado pela Direção-Geral da Saúde (DGS). Mas o cotonete utilizado nos testes PCR, ou em quaisquer testes autorizados pelas autoridades de saúde, não são capazes de provocar as lesões mencionadas na publicação porque a totalidade do cérebro, incluindo as amígdalas cerebelosas, está bem escudada. 

Para chegar às amígdalas, que ficam na base do cérebro, a zaragatoa teria que furar um segmento do osso etmoide, no centro do crânio, as meninges, o líquido cefalorraquidiano, os vasos sanguíneos e a barreira hematoencefálica, uma membrana que protege o cérebro de agentes patogénicos e outras substâncias estranhas que circulem no organismo, demonstrou a Universidade de Queensland.

Conclusão

Não é verdade que a zaragatoa utilizada no testes PCR de deteção do coronavírus tenha capacidade de alcançar o cérebro, nomeadamente as amígdalas cerebelosas, e danificá-las ao ponto de alterar comportamentos. O cérebro está protegido por uma série de barreiras que tornam anatomicamente impossível que uma zaragatoa chegue às principais estruturas do sistema nervoso. A comparação com um suposto procedimento do Antigo Egito, em que se alegadamente se danificavam as amígdalas de escravos para os manter submissos, também é falsa: a pintura que ilustra a publicação mostra uma consulta de oftamologia e foi encontrada num túmulo de 1.200 a.C..

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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