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Uma coisa é dizer-se, quase por intuição, que anda tudo ligado. Outra, bem mais complexa, é perceber como são feitas essas ligações. No início dos longos meses de trabalho que levaram a preparação da série “A Corte de Luanda”, partimos daquele primeiro nível, mas sempre com o objetivo de chegar ao segundo. |
Para entender, afinal, como são feitas as ligações do poder em Luanda, rapidamente concluímos que seria obrigatório olhar para um triângulo incontornável. No vértice superior está José Eduardo dos Santos, Presidente durante 38 anos. E, a partir dele, outros dois vértices que cresceram com o líder: Manuel Vicente, ex-presidente da Sonangol e antigo vice-Presidente de Angola; e João Lourenço, atual Presidente. |
Para este trabalho, falámos com 23 pessoas. O leque é vasto: vai desde membros destacados do MPLA a membros da oposição; de diplomatas portugueses e angolanos até líderes de ONG; de académicos e investigadores até empresários dos dois países; de ex-ministros a amigos de infância e das futeboladas de rua. Entre conversas em hotéis e escritórios, chamadas telefónicas e trocas de e-mails, conversámos longamente sobre como Manuel Vicente e João Lourenço foram ambos de infâncias humildes até ao topo da hierarquia angolana. |
Uma das coisas que ficaram mais claras foi esta: chegar ao topo é difícil, mas mais difícil ainda é permanecer nele. |
Uma das pessoas com quem falámos para este trabalho dizia-nos que a elite angolana funciona de forma inescrutável, tudo porque é um círculo muito fechado. “Angola é um país enorme, mas a elite está toda em Luanda”, explicou. “E Luanda faz lembrar um pouco Viseu ou qualquer outra cidade pequena de Portugal. É uma elite fechada, que obedece a códigos de família.” Que é o mesmo que dizer “códigos de lealdade”. Foi sempre exigindo que os cumprissem que José Eduardo dos Santos se regeu na relação com aqueles que mantinha debaixo da sua asa, elevando-os da periferia até ao centro do poder. Ao longo dos seus 38 anos como Presidente, teve vários delfins. Com distintos graus de ingenuidade, cada um deles chegou a pensar que seria o herdeiro escolhido para suceder ao “Arquiteto da Paz”. Mais tarde, viriam a perceber que não passava tudo de um teste. |
“Quando queremos atravessar o rio, não sabemos onde está o jacaré, não é? Então vamos lançando pedras aqui e ali e, quando ele levantar a cabeça, a gente sabe que está ali e passa no outro lado”, disse o opositor Filomeno Vieira Lopes. Foi o que José Eduardo dos Santos fez sempre para manter o seu poder. Quem levantava a cabeça em gesto de ambição era inevitavelmente afastado. Muitos, para sempre: ora para embaixadas distantes, ora para dirigir uma fundação para a defesa da fauna e flora de Angola, ou até mesmo para o esquecimento generalizado. |
Cada um dos delfins de José Eduardo dos Santos caiu à sua maneira — mas apenas Manuel Vicente e João Lourenço souberam levantar-se. Também eles sabiam que isto anda tudo ligado. Mas, mais do que isso, souberam fazer a única ligação que podia dar certo — a deles os dois, como forma de vingança contra José Eduardo dos Santos. |
“Lourenço e Vicente: a história dos dois delfins de José Eduardo dos Santos, da traição à vingança” é a quarta parte de um trabalho especial multimédia do Observador sobre a rede de poder angolana. A investigação dividiu-se em quatro textos: |
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“A Corte de Luanda” deu também origem também a uma série inédita de podcasts: |
- O Viajante e O Chefe, ambos dedicados ao ex-Presidente de Angola;
- A Cara do Pai, que revela como Isabel dos Santos foi construindo a sua fortuna;
- e O Mimoso, que mostra como João Lourenço é um filho do sistema. Este episódio é emitido amanhã, quinta-feira, às 11h, na Rádio Observador, e estará disponível também no site e nas plataformas de podcast.
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