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“O que me lembro melhor? Secar-lhe o cabelo. Nunca tinha feito aquilo.” A frase é de António Marques, marido de Mariana Carvalho, que teve um enfarte agudo do miocárdio, aos 24 anos, em 2017. O relato impressionante integra a reportagem que a jornalista Paula Sofia Luz e a fotojornalista Rita Chantre fizeram sobre a rede que apoiou Mariana depois deste evento, tão inesperado quanto impactante. |
Além do marido — que passou a trabalhar em casa muito antes de a pandemia de Covid-19 ter levado ao confinamento obrigatório —, Mariana contou com a mãe, a sogra e os médicos que a acompanharam. Não só durante o enfarte e a recuperação, mas também na preparação para o parto, uma vez que o filho Mateus nasceu em abril de 2020, depois de uma gravidez de alto risco, e, por isso, muito vigiada. Foi ao filho que Mariana “se agarrou com muita força”, e tudo correu bem, com equipas especializadas por perto, a lidar com o duplo desafio de acompanhar uma gravidez após o enfarte em período de pleno confinamento devido à pandemia, com todas as restrições implícitas à época. |
Temos contado histórias de doentes, sobreviventes de AVC e de enfarte, e de cuidadores, mas também de profissionais que cuidam na primeira linha das doenças cérebro-cardiovasculares, a principal causa de morte em Portugal. Raul Santos, ex polícia e a mulher, Magda Santos, aceitaram partilhar um testemunho real sobre como a vida pode mudar em segundos. Um AVC hemorrágico provocado por uma má formação congénita — uma malformação arteriovenosa (MAV) — levou Raul a enfrentar um percurso de imprevisibilidade, de dias com novas exigências, de necessidade de readquirir algo que habitualmente damos como garantido, como a mobilidade, a linguagem e a capacidade de comunicar. |
No vídeo “Quando a minha vida mudou”, o casal conta à jornalista Sofia Teixeira como tem sido lutar pela recuperação, depois de Raul ter lutado pela sobrevivência. E de ter acordado do coma com uma mensagem de voz gravada pelo filho. Apesar de se ter reformado antecipadamente — no “pior dia” da sua vida em todo este processo —, o ex polícia continua a trabalhar diariamente para recuperar a autonomia e aquilo que o AVC lhe tirou. |
Um dos grandes problemas na gestão e tratamento das doenças cérebro-cardiovasculares é o facto de o doente “se sentir perdido no sistema”, defende o ex-ministro da Saúde António Correia de Campos no artigo de opinião que escreveu para o Arterial. Arrisco a afirmar que Raul e Magda se sentiram precisamente assim, quando Raul ia ter, pela primeira vez, alta hospitalar e não conseguia comer, falar ou andar. Para o professor jubilado da Escola Nacional de Saúde Pública, o país teria a ganhar com “a criação e bom funcionamento” de uma rede articulada entre centros de saúde e hospitais — que poderia ser impulsionada através de Clubes de Doentes Frequentes, “onde os doentes portadores de doença crónica e sob controlo se encontrassem com regularidade, em ambiente tanto quanto possível aprazível, ajudados por rececionistas que assegurassem o bom diálogo entre o centro de saúde e os seus médicos de família e o hospital de agudos, a que seja necessário recorrer episodicamente”. Num verdadeiro serviço à comunidade, com menos burocracia. |
Uma das áreas em que os doentes — e as suas famílias — se sentem também perdidos é ao nível dos apoios sociais: subsídios, baixa, ajudas disponíveis através da Segurança Social, isenções fiscais, o atestado multiuso. Foi sobre estes temas que a assistente social Fátima Ferreira escreveu num artigo de opinião em que explica que são raros os dias em que não é questionada — no hospital onde trabalha pertencente à ULS São José — pelos doentes e famílias sobre “soluções para as suas vidas que, num piscar de olhos, ficaram viradas do avesso”. Por um lado, fornece a informação necessária que os guia neste novo caminho. Por outro, trabalha com eles “a motivação, o suporte e a estabilidade emocional, na tentativa de apaziguar a incerteza que os invade nestes momentos”. |
Este mês, no Arterial, preparámos também um Explicador sobre o colesterol, que constitui uma das causas mais relevantes das doenças cérebro-cardiovasculares, com treze respostas sobre a doença, com a ajuda do médico cardiologista Rui Osório Valente que defende que, além de outras medidas, “a forma mais eficaz de reduzir os níveis de colesterol no sangue é a medicação”. E a questão dos fármacos e dos fatores de risco leva-nos para um tópico não menos importante: a adequada adesão aos medicamentos que os médicos prescrevem. Segundo Ema Paulino, presidente da Associação Nacional das Farmácias, “só na Europa, 200 mil mortes prematuras podem ser evitadas se os medicamentos forem tomados corretamente”. |
Com o avanço da medicina e da ciência, “os portugueses estão a viver mais tempo, mas com menos qualidade de vida”, avança a farmacêutica, suportando-se de números já identificados: “Em Portugal, cerca de quatro em cada dez adultos sofrem de doenças crónicas, sendo o terceiro país da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) com maior percentagem de pessoas que vivem com mais do que uma doença crónica.” Por isso, temos muitos portugueses polimedicados, ou seja, a tomar vários medicamentos para combater as doenças que lhe foram diagnosticadas. O problema surge quando a toma dessa medicação não é feita da forma mais correta, o que constitui “uma grande preocupação para os sistemas de saúde em todo o mundo, pois, só na Europa [também segundo um relatório da OCDE] causa anualmente quase 200 mil mortes prematuras, com custos a aumentar para 125 mil milhões de euros por ano em hospitalizações evitáveis, cuidados de emergência e consultas ambulatórias”. |
Continuamos à procura de histórias na primeira pessoa, mas também de projetos que façam realmente a diferença na vida dos doentes e dos familiares. Queremos ainda debater em que é que possível melhorar na prevenção, na gestão e no tratamento das doenças cérebro-cardiovasculares. |
Muito há a destacar nesta newsletter relativamente aos conteúdos publicados no último mês no Arterial, mas não quero terminar sem sugerir a leitura da entrevista realizada ao coordenador do Programa Nacional para as Doenças Cérebro-Cardiovasculares, Filipe Macedo. Sobre a conversa e os temas que mais preocupam o médico cardiologista, escreverei na newsletter do próximo mês. |
Se ainda não ativou os alertas do Arterial nem subscreveu esta newsletter mensal, ainda vai a tempo. E, se já está — ou estará em breve — de férias, desejo-lhe um bom descanso. |
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REPORTAGENS E ENTREVISTA
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Arterial
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Raul teve um AVC violento aos 39 anos. Quase morreu, ficou com muitas sequelas e teve poucos apoios para reabilitação. Tem sido a mulher a procurar soluções desde o dia em que a vida mudou para sempre
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Arterial
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Mariana demorou tempo até conseguir voltar a fazer tudo sozinha. Até para um banho precisava de apoio. Um enfarte aos 24 anos (e a gravidez que se seguiu) levou-a a recorrer a toda a ajuda possível.
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Arterial
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A acumulação de gordura no sangue provocada pelo colesterol pode levar à morte. Mas o que é ao certo este risco a que não damos a devida importância? E o que é o colesterol "bom" e o colesterol "mau"?
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Arterial
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O cardiologista Filipe Macedo, coordenador do Programa Nacional das Doenças Cérebro-Cardiovasculares, defende mais reabilitação, educação para a saúde e tratamento atempado da insuficiência cardíaca.
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OPINIÃO
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Desde a baixa ou subsídio de doença até ao Atestado de Incapacidade Multiusos, são vários os apoios de que uma pessoa necessita na sequência de um AVC ou enfarte.
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Há oito anos que atendo o telefone do Instituto Português da Afasia. Já fiz centenas de sessões de aconselhamento a pessoas com afasia após AVC e outras doenças, e às suas famílias, de norte a sul.
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Os portugueses estão a viver mais anos, mas com menos qualidade. Para uma melhor gestão das doenças crónicas, os farmacêuticos são bons aliados dos cidadãos para que tomem a sua medicação sem falhas.
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Em cada episódio agudo, um doente sente-se perdido "no sistema" e recorre às urgências. É prioritário criar uma rede entre hospitais e centros de saúde. E fica uma ideia: Clubes de Doentes Frequentes.
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Só em 2022 as doenças cardiovasculares causaram de 19,8 milhões de mortes em todo o mundo, correspondendo a 396 milhões de anos de vida perdidos e outros 44,9 milhões de anos vividos com incapacidade.
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AGENDA
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O QUE SE ESCREVE LÁ FORA
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