Não sei se os “activistas” do clima usam cola ou se é a ecológica aversão ao banho que facilita a aderência deles às coisas que se põem a jeito. Lá fora, a moda é aparecerem colados a pinturas célebres. Em Portugal, país em que as bugigangas de Joana Vasconcelos e o entulho de Cabrita Reis passam por arte, torna-se complicado vandalizar obras cuja destruição alguém lamente. Vai daí, os “activistas” preferem colar-se a entradas de edifícios. Em Outubro, foi a sede da Galp. Agora, a António Arroio e, logo de seguida, outras escolas de Lisboa.
As crianças em protesto nessas escolas explicam que é inútil estudar para exames num planeta que está condenado. É um raciocínio inquestionável, que legitima cada cidadão a prolongar os empréstimos bancários e meter “baixa” por duzentos ou trezentos meses. Afinal, na melhor das hipóteses o próprio sistema solar acabará em 7 ou 8 mil milhões de anos, mais semana, menos semana. Além disso, não me parece que abdicar dos ensinamentos da António Arroio seja uma perda drástica: os respectivos alunos celebrizaram-se há uns anos quando se manifestaram contra o fascismo enquanto gritavam “vivas” a Marinetti. E hoje berram pelo ambiente enquanto desconhecem o custo ambiental dos pechisbeques que envergam, roupa, telemóvel e cola incluídos.
É fácil atribuir à idade a ignorância e a cegueira destes “activistas”. Porém, nada garante que a experiência lhes traga sabedoria. A pequena Greta, que largou os estudos muito antes das crianças da António Arroio, tem crescido a olhos vistos e não deixou de ser ignorante e cega. E não me obriguem a falar do eng. Guterres, que aparenta 98 anos e, à semelhança daqueles excêntricos que vagueiam pelas ruas com um cartaz e uma sineta, continua a alertar diariamente para o Apocalipse que virá amanhã. Ou segunda-feira.
Naturalmente, o secretário-geral da ONU não podia faltar à Cimeira do Clima da ONU, que decorre no Egipto. E, em pleno palco, mostrou aos críticos que se encontra em estado de perfeita lucidez: descortinou num ápice que se enganara no discurso, proeza complicadíssima na medida em que os discursos dele são sempre o mesmo, com ligeiras variações no imaginário cataclísmico. Desta vez, o eng. Guterres não citou o aldeão do “Sexta-Feira 13” (“You’re doomed! Doomed!”) e optou pela “Highway to Hell” dos AC/DC, o que revela que é tão sofisticado na música quanto na retórica. Das muitas canções acerca do fim iminente, eu teria citado o “It’s the End of the World”, da Skeeter Davis (Why does the sun go on shining?/Why does the sea rush to shore?/Don’t they know it’s the end of the world?/’Cause you don’t love me anymore). Gostos, enfim.
O importante é que o eng. Guterres é apenas uma das inúmeras personalidades aflitas com o futuro colectivo que estes dias andam por Sharm el-Sheik. “Andam” é força de expressão: são conduzidos em automóveis altamente poluentes. E, ao invés de bicicletas, chegaram lá por via aérea. De facto, oitocentos jactos fretados ou regulares transportaram as sumidades que ocupam o seu precioso tempo a tentar salvar a Terra de irresponsáveis como nós. Não consegui verificar a habitual participação do reputado climatologista Leonardo DiCaprio, que talvez tenha ficado a reflectir na matéria a bordo do seu iate, em cujo tanque cabem 460 mil litros de gasóleo limpinho. Em compensação, confirmam-se as presenças dos climatologistas Joe Biden, Emmanuel Macron, Ursula von der Leyen e Lula da Silva. E, pela televisão, vi com agrado o climatologista António Costa em animada cavaqueira com o climatologista Nicolás Maduro.
O prof. dr. Maduro é, aliás, um perito particularmente avançado na concretização dos objectivos confessos da Cimeira: anular as diferenças entre os países ricos e os países pobres. Na qualidade de déspota local, e na linha do déspota local anterior, a criatura provou que o petróleo não compensa e transformou a Venezuela numa das nações mais miseráveis de ambos os hemisférios. Com tamanho farol a iluminar, não tarda que todos os países sejam iguais – igualmente pobres. Assim haja vontade de pesar as consciências da ralé, punir-lhe os confortos e subtrair-lhe os rendimentos a título de taxas “verdes”. A julgar pelas intervenções na Cimeira, vontade de nos desgraçar não falta.
Notem que, ao longo do artigo, nem por uma vez desvalorizei a influência antropogénica nas alterações climáticas ou questionei a hecatombe que nos prometem desde há décadas. Não preciso: os participantes da Cimeira, que viajam de avião para nos proibir de conduzir o carro, fazem-no constantemente. Alguém acredita que aquela gente acredita no Armagedão com que, após o foie gras, enche a boquinha? Chamar-lhes hipócritas é um eufemismo idêntico a acusar Ted Bundy de misoginia. O clima não os interessa: interessa-lhes o poder. Estes encontros, e o respectivo folclore, são uma exibição de poder, idêntica à das festarolas em que, durante a Covid, as máscaras só eram utilizadas pela criadagem.
Como o vírus, agitar as variações da temperatura e da pluviosidade servem de teste à submissão das populações, que se desejam dóceis e prontas a abdicar da autonomia, da dignidade, da propriedade e da liberdade a troco de uma protecção postiça face a ameaças vagas. É para isso, testar-nos, que centenas de trapaceiros estão no Egipto. Não haverá maneira de os colar às pirâmides? Para sempre ou até ao fim do mundo, previsto para ontem.