O Presidente da República decidiu promulgar a lei que “Proíbe as denominadas práticas de «conversão sexual» contra pessoas LGBT+, criminalizando os atos dirigidos à alteração, limitação ou repressão da orientação sexual, da identidade ou expressão de género, alterando a Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, e o Código Penal”.
Tal lei – o Decreto da Assembleia da República nº 133/XV – teve na sua origem os Projectos de Lei nºs 72/XV/1ª (BE), 209/XV/1ª (L), 699/XV/1ª (PAN) e 707/XV/1ª (PS), tendo sido aprovada à pressa – na generalidade, na especialidade e em votação final global – no passado dia 21.12.2023, com os votos contra do PSD e do Chega e os votos a favor dos deputados de todos os restantes partidos representados na Assembleia da República.
A referida lei, ao mesmo tempo que proíbe e criminaliza as denominadas práticas de “conversão sexual”, excepciona e despenaliza as práticas e procedimentos realizados em contexto da autodeterminação da identidade e expressão de género. Ou seja, ao mesmo tempo que proíbe e criminaliza, permite e despenaliza em determinado contexto.
Atendendo a que as únicas terapias ou práticas de “conversão sexual”, de que eu tenha conhecimento, que existem em Portugal são as realizadas em contexto da denominada “autodeterminação da identidade e expressão de género” – as terapias ou práticas de afirmação e “conversão” transexual ou transgénero -, pergunto se não deveriam antes ser estas proibidas e criminalizadas pelo legislador, pelo menos para pessoas menores de idade?
É preciso ter presente que são precisamente estas terapias e práticas de afirmação transexual e transgénero que acarretam modificações irreversíveis no corpo das pessoas submetidas às mesmas e implicam tratamentos farmacológicos e terapêuticos uma vida inteira.
Mas vejamos o que consta da lei agora promulgada.
A referida lei começa por afirmar que “A presente lei procede ao reforço da proteção da orientação sexual, identidade e expressão de género de cada pessoa, através da proibição das práticas denominadas de «conversão sexual»”, procedendo à alteração da Lei nº 38/2018, de 07.08, que consagra os direitos à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa, aditando um novo nº 3 ao seu artigo 3º (“Autodeterminação da identidade de género e expressão de género”), com o seguinte teor:
“São proibidas quaisquer práticas destinadas à conversão forçada da orientação sexual, identidade ou expressão de género.”
Atendendo a que, nos termos previstos no nº 1 do referido art. 3º da Lei nº 38/2018, é assegurado a qualquer pessoa (sem referência à respectiva idade) o exercício do “direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género”, a pergunta que se impõe é a seguinte: passará a ser entendido por “conversão forçada” a oposição dos pais à identidade ou expressão de género autodeterminadas pelos seus filhos menores?
No que se refere à alteração do Código Penal, esta lei vem criar um novo tipo legal de crime, incluído na secção dos “Crimes contra a autodeterminação sexual”, através do aditamento de um novo artigo – o artigo 176º-C “Atos contrários à orientação sexual, identidade ou expressão de género” -, com o seguinte teor:
“1 – Quem submeter outra pessoa a atos que visem a alteração ou repressão da sua orientação sexual, identidade ou expressão de género, incluindo a realização ou promoção de procedimentos médico-cirúrgicos, práticas com recursos farmacológicos, psicoterapêuticos ou outros de caráter psicológico ou comportamental, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa, se pena mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal.
2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, não são puníveis os procedimentos aplicados no contexto da autodeterminação da identidade e expressão de género, conforme estabelecido nos artigos 3.º e 5.º da Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, e que forem levados a cabo de acordo com as leges artis.
3 – Quem, no âmbito das condutas descritas no n.º 1, desenvolva tratamentos ou pratique intervenções cirúrgicas, farmacológicas ou de outra natureza que impliquem modificações irreversíveis ao nível do corpo e das características sexuais da pessoa, é punido com pena de prisão até 5 anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
4 – A tentativa é punível.”
Este novo tipo de crime suscita-me, desde logo, vários comentários críticos:
- A amplitude, imprecisão e indefinição dos actos previstos no citado nº 1 violam, de modo ostensivo e flagrante, os princípios da legalidade e da tipicidade penais, princípios esses que impõem, entre outros aspectos, que o tipo penal contenha uma descrição exacta, precisa, rigorosa e bem delimitada dos comportamentos proibidos e penalizados, o que manifestamente não se verifica neste caso.
- As referidas amplitude, imprecisão e indefinição afectam não apenas os referidos actos mas também, muito em particular, o conceito de “género” a que se referem, se tivermos presente que, hoje em dia, há quem defenda que existem múltiplos e diferentes tipos de géneros (ou identidades de género), na ordem das dezenas ou mesmo centenas, para além do masculino e feminino, como, por exemplo, transgénero, género neutro, género fluido, não-binário, agénero, pangénero, poligénero, gender-queer, dois-espíritos, terceiro género, xenogénero e todos, nenhum ou uma combinação destes (entre muitos outros).
- Qual o fundamento para equiparar a realização ou promoção de procedimentos médico-cirúrgicos e práticas com recursos farmacológicos, com práticas com meros recursos psicoterapêuticos ou outros de carácter psicológico ou comportamental?
- Se existir o consentimento da pessoa visada por tais actos continuará a existir um crime ou aplicar-se-á o disposto no nº 1 do art. 38º do Código Penal, nos termos do qual “O consentimento exclui a ilicitude do facto quando se referir a interesses jurídicos livremente disponíveis e o facto não ofender os bons costumes”? São estes interesses jurídicos livremente disponíveis e não ofendem os bons costumes?
Por outro lado, aplicar-se-á o disposto no nº 3 do art. 38º do Código Penal, nos termos do qual “O consentimento só é eficaz se for prestado por quem tiver mais de 16 anos e possuir o discernimento necessário para avaliar o seu sentido e alcance no momento em que o presta”? E para os menores de 16 anos, será aceite ou considerado suficiente o consentimento dos pais ou dos demais representantes legais? - Ao mesmo tempo que o legislador criminaliza ex-novo os actos descritos no citado nº 1 do novo art. 176-A, despenaliza-os no nº 2 se os mesmos forem realizados no contexto da autodeterminação da identidade e expressão de género, pelo que cabe perguntar: e se os referidos actos e procedimentos respeitarem à orientação sexual, já não são despenalizados? Com que fundamento? E porquê criar um novo tipo de crime, para, em simultâneo, se dizer que esse novo crime não é punível em determinadas circunstâncias? E o nº 2 despenaliza os actos referidos no nº 1, não punindo quem submeter uma pessoa aos mesmos ou despenaliza apenas os procedimentos?
- O disposto no nº 3 deste novo crime – que agrava a pena em função das consequências dos actos previstos no nº 1, i.e., modificações irreversíveis ao nível do corpo e das características sexuais da pessoa — aplica-se ou aplicar-se-á também se os procedimentos foram realizados no contexto da autodeterminação da identidade e expressão de género? Se a resposta for negativa por causa do disposto no nº 2, qualquer a razão ou fundamento para tal? Não é verdade que a experiência (muito em particular nos países que há mais anos enveredaram por este caminho) tem demonstrado que é precisamente no contexto da autodeterminação da identidade e expressão de género que são desenvolvidos tratamentos ou praticadas intervenções cirúrgicas, farmacológicas (que persistirão a vida toda) ou de outra natureza que implicam modificações irreversíveis ao nível do corpo (e da mente) e das características sexuais da pessoa?
Acresce que esta lei, para além de criar este novo tipo de crime, e de prever o agravamento das respectivas penas nos termos do art. 177º do Código Penal (alterado nesse sentido), introduz alterações em outros duas disposições do Código Penal por forma incluir também quem for punido pelo crime previsto no novo art. 176-C:
- Por um lado, manda aplicar as penas acessórias previstas no art. 69º-B (“Proibição do exercício de funções por crimes contra a autodeterminação sexual e a liberdade sexual”), nos termos do qual pode ser condenado na proibição de exercer profissão, emprego, funções ou actividades, públicas ou privadas, ainda que não remuneradas, cujo exercício envolva contacto regular com menores por um período até 20 anos;
- Por outro lado, manda também aplicar as penas previstas no art. 69º-C (“Proibição de confiança de menores e inibição de responsabilidades parentais”), nos termos do qual pode ser condenado na proibição de assumir a confiança de menores e na inibição do exercício de responsabilidade parentais por um período até 20 anos.
Importa referir que as penas acessórias previstas nos artigos 69º-B e 69º-C se aplicam presentemente apenas aos crimes previstos nos arts. 163º a 176º-A, ou seja, aos crimes de coacção sexual, violação, abuso sexual de pessoa incapaz de resistência, abuso sexual de pessoa internada, fraude sexual, procriação sexual não consentida, lenocínio, importunação sexual, abuso sexual de crianças, abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável, actos sexuais com adolescentes, recurso à prostituição de menores, lenocínio de menores, pornografia de menores e aliciamento de menores para fins sexuais.
Ou seja, o legislador equipara este novo crime – actos que visem a alteração ou repressão da orientação sexual, identidade ou expressão de género de uma pessoa, incluindo na forma de tentativa – aos hediondos crimes supra referidos.
Se tivermos presente que é no âmbito da transexualidade ou da transgeneridade que são promovidas as práticas que se destinam à “conversão sexual”, é de perguntar se a intenção do legislador com esta lei será realmente a protecção das pessoas LGBT+ ou não será antes um ataque às pessoas H?
Ou será que o legislador não pretende também, com esta lei, limitar os pais no exercício dos seus direitos e deveres paternais (ou parentais, como agora se diz) relativamente aos seus filhos menores, caso manifestem qualquer tipo de cautelas ou oposição à (imediata) afirmação da orientação sexual, da identidade ou expressão de género autodeterminadas pelos seus filhos menores?
Ou será que o legislador não pretende também, com esta lei, limitar os ministros de culto no exercício do seu ministério, em clara violação do disposto na Constituição (art. 41º) e na Lei da Liberdade Religiosa, nos termos da qual a liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável e garantida a todos em conformidade com a Constituição, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, o direito internacional aplicável e as disposições da referida lei.
Importa recordar o que dispõe o art. 41º da Constituição:
“1. A liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável.
2. Ninguém pode ser perseguido, privado de direitos ou isento de obrigações ou deveres cívicos por causa das suas convicções ou prática religiosa.
3. Ninguém pode ser perguntado por qualquer autoridade acerca das suas convicções ou prática religiosa, salvo para recolha de dados estatísticos não individualmente identificáveis, nem ser prejudicado por se recusar a responder.
4. As igrejas e outras comunidades religiosas estão separadas do Estado e são livres na sua organização e no exercício das suas funções e do culto.
5. É garantida a liberdade de ensino de qualquer religião praticado no âmbito da respectiva confissão, bem como a utilização de meios de comunicação social próprios para o prosseguimento das suas actividades.
6. É garantido o direito à objecção de consciência, nos termos da lei.”
E no que respeita à Igreja Católica em Portugal, importa também recordar o que se encontra prescrito no artigo 2.º da Concordata entre a Santa Sé e o Estado Português celebrada a 18 de Maio de 2004:
“1. A República Portuguesa reconhece à Igreja Católica o direito de exercer a sua missão apostólica e garante o exercício público e livre das suas atividades, nomeadamente as de culto, magistério e ministério, bem como a jurisdição em matéria eclesiástica. (…)
3. Os bispos e as outras autoridades eclesiásticas gozam da mesma liberdade em relação ao clero e aos fiéis.
4. É reconhecida à Igreja Católica, aos seus fiéis e às pessoas jurídicas que se constituam nos termos do direito canónico a liberdade religiosa, nomeadamente nos domínios da consciência, culto, reunião, associação, expressão pública, ensino e ação caritativa.”
Por último, será que o legislador não pretende também, com esta lei, limitar os professores e os profissionais de saúde (em particular os médicos psiquiatras e psicólogos), no exercício das suas profissões?
E a respeito das limitações dos direitos dos pais, professores e profissionais de saúde, não posso deixar de citar o médico Psiquiatra Dr. Pedro Afonso em dois artigos de opinião que escreveu: o 1º sobre a aplicação da Lei nº 38/2018 em ambiente escolar (“Quando as leis substituem a terapia”, aqui publicado a 13.10.2022):
“A justificação desta Lei assenta em pressupostos falaciosos, pois não têm um suporte científico suficientemente robusto. Por que razão é que o PS defende o direito à autodeterminação da identidade e expressão de género em crianças, cujos cérebros não se encontram ainda totalmente desenvolvidos?
Será que uma criança de 7 anos tem capacidade para se autodeterminar livremente no género? A resposta é não. Na verdade, ainda não tem maturidade psicofisiológica para tomar este tipo de decisões que implicam uma capacidade humana de compreender e de querer. De outro modo, trata-se de uma escolha condicionada, porque não é submetida à razão. Só pode ser livre quem for capaz de pensar a liberdade, de compreender o que significa este conceito; não é o caso de uma criança
Os senhores deputados, que propõem este projeto-lei, muito provavelmente nunca observaram jovens e adolescentes com disforia de género; nunca ouviram relatos do enorme sofrimento em que vivem estes jovens; nunca visualizaram as lesões de automutilação que, por vezes, desfiguram os seus corpos; nunca observaram nas urgências psiquiátricas as tentativas de suicídio cometidas por estes indíviduos; nunca presenciaram o sofrimento dos pais; nunca testemunharam que, mesmo após a autodeterminação de género, a psicopatologia (que num grande parte dos casos está na base desta condição) se mantém, pois a autodeterminação de género não é per si curativa. Na maioria dos casos existem comorbilidades psiquiátricas que têm de ser devidamente tratadas.
Curiosamente, no referido Projeto de Lei, não existe uma única alusão ao possível encaminhamento destas situações para tratamento psiquiátrico. Convém sublinhar que as leis não substituem os tratamentos psiquiátricos. Aparentemente, tudo se resolve com o direito das crianças e jovens a serem tratadas pelo nome autoatribuído, a escolher roupa e o wc que querem utilizar nas escolas.
Os defensores da ideologia de género ludibriam, enganam — porque se trata de uma ideologia dissociada da realidade —, simplificam uma condição humana complexa que, sem sombra de dúvida, pertence ao campo da psiquiatria/psicologia e não da ideologia. Iniciar um processo de transição de género não é o mesmo que fazer uma cirurgia plástica, pois tem enormes implicações físicas e psicológicas. (…).
Mas, esta propaganda ideológica tem feito os seus estragos. Na prática clínica, nunca se viram tantos casos de adolescentes e jovens absolutamente confusos e baralhados com a sua identidade de género. Influenciados e pressionados por esta doutrina nas escolas, nos media e nas redes sociais, muitos julgam erradamente que a transição social de género lhes irá trazer o caminho da felicidade e da saúde mental. Porém, não é assim…
De acordo com a ideologia de género, as crianças que refiram ter disforia de género são imediatamente, e de uma forma imponderada, submetidas a tratamentos com bloqueadores de puberdade, seguidos de tratamentos de transição de género (hormonais e cirúrgicos), quando se sabe que a maioria destas situações é ultrapassada com o evoluir da puberdade e o necessário acompanhamento psiquiátrico e psicológico.
Os pais estão a ser progressivamente excluídos. Dentro de algum tempo, poderão mesmo deixar de ser ouvidos neste processo que envolve os seus filhos menores. Entrega-se assim às crianças “o direito à autodeterminação de género”, mesmo sabendo que se prosseguirem com os tratamentos hormonais ficam estéreis e sem possibilidade de retorno à condição anterior. Sabe-se, pela experiência acumulada de outros países, que muitos destes indivíduos acabam mais tarde por se arrepender destes procedimentos.
A ideologia de género não liberta a pessoa, mas antes priva-a de uma desejável sincronia entre o sexo biológico e o sexo identitário. Dificultar essa harmonia, confundindo ou desconstruindo pela doutrinação ideológica, não promove a saúde mental e corresponde a uma atuação política eticamente reprovável”.
O 2º artigo do Dr. Pedro Afonso fala sobre a aprovação da Lei nº 38/2018 (“Os Super-Homens legisladores”, aqui publicado a 16.04.2018):
“O parlamento aprovou, com o júbilo próprio dos incautos, uma lei que permite mudar de género aos 16 anos, sem necessidade de relatório médico. Mas, não existe qualquer base científica ou justificação médica que autorize um adolescente de 16 anos, cujo córtex pré-frontal ainda não está completamente desenvolvido, decidir de uma forma livre, madura e responsável mudar de género. Além disso, está em causa um verdadeiro problema de saúde pública que esta lei não protege.
A disforia de género é uma condição clínica em que existe um conflito entre a perceção do indivíduo sobre as suas características sexuais primárias (dimensão biológica) e o género experienciado (dimensão psicológica). Convém deixar claro alguns pontos para se compreender o que está em causa com a aprovação desta lei:
1. O mal-estar e o sofrimento psíquico associado a este conflito não se resolvem com uma simples ida ao registo civil para mudar de género. É absolutamente falso que se solucione um problema complexo como este, desta forma tão simples.
2. Na maioria destes casos existe psicopatologia prévia que tem de ser tratada e acompanhada pelos médicos psiquiatras e outros profissionais de saúde. Por exemplo, comparativamente à população geral há uma maior prevalência de depressão, suicídio, observando-se ainda um número elevado de casos de experiências traumáticas prévias e disfuncionamento familiar. A lei não substituiu a terapia para estes casos, mas dá uma indicação de que a mesma não é necessária.
3. Existem doenças psiquiátricas (por exemplo, a esquizofrenia ou a perturbação dismórfica corporal) que não são verdadeiros casos de disforia do género, mas que se confundem com estes, obrigando a um diagnóstico diferencial. Ora, no registo civil não há psiquiatras de serviço.
4. Importa sublinhar, sem receios de ser politicamente incorreto, que embora ocorram raras situações em que “os rapazes se sentem raparigas e as raparigas se sentem rapazes”, o ideal e desejável é que haja uma coincidência entre identidade biológica e identidade psicológica/sociocultural da sexualidade. O Estado não deve promover, de forma irresponsável e através de uma lei, essa dessincronia.
Esta lei que foi aprovada é essencialmente ideológica. Baseia-se na ideologia de género que, pelo seu radicalismo, se opõe à ciência e à boa prática médica. Esta ideologia teve início nos anos 60, na sequência do movimento de contracultura. Nessa altura, a psiquiatria também foi atacada e procuraram destruí-la, negando, por exemplo, a existência de doenças psiquiátricas como a esquizofrenia. Os resultados foram desastrosos, principalmente em Itália, sob a influência de Franco Basaglia, com milhares de doentes a serem privados de cuidados psiquiátricos adequados. A história repete-se.
A aprovação desta lei, juntamente com a discussão prevista para breve sobre a legalização da eutanásia, revela que existe um ambiente político de hostilidade face à medicina. Senão, vejamos: no caso da mudança de género, não se compreende por que razão os médicos são expulsos deste processo; não se compreende os motivos pelos quais se menosprezam a prática clínica e o conhecimento científico acumulado durante anos de estudo sobre este tema clínico. Por outro lado, também não se compreende a necessidade de se aprovar uma lei que legaliza a eutanásia, que não foi pedida pela maioria dos médicos, e que vai contra a tradição hipocrática da medicina”.
Para terminar, diria que a gravidade da lei agora promulgada pelo Presidente da República decorrente da inconstitucional e ilegal limitação do exercício das responsabilidades parentais e do exercício de determinadas profissões, como sejam em particular as dos professores, dos psiquiatras, dos pedopsiquiatras, dos pediatras, dos psicólogos e dos ministros de culto, impõe o seu firme repúdio.
Caberá, agora, a quem tem competência para tal, requerer junto do Tribunal Constitucional a fiscalização sucessiva da constitucionalidade das normas desta lei, com fundamento na violação de muitas normas e princípios constitucionais, tais como os princípios da legalidade e tipicidade penais, da determinabilidade da lei, da proporcionalidade, da igualdade, da justiça da dignidade da pessoa humana e do Estado de Direito.
Infelizmente, o Presidente da República não cumpriu, mais uma vez, o seu dever.