O primeiro-ministro e o ministro das Infraestruturas comunicaram ao país a visão macro do Governo para a ampliação da capacidade aeroportuária de Lisboa: a) um aeroporto único, b) ligação AV Lisboa-Madrid em três horas via ponte Chelas-Barreiro e c) ligação AV Lisboa-Porto fazendo desvio (50km) para passar pelo aeroporto único (em Alcochete).

Para o grande público, foram as grandiosas obras o mais relevante, mas, para quem estava mais atento ao modelo decisório, o que mais ressaltou foi que todo o castelo de empreendimentos assentava num ponto: um aeroporto único, a intenção determinante em todo o processo.

E quem estava mais avisado também se apercebeu que todo o castelo se desmoronava, qual baralho de cartas, se o Governo tivesse tido a oportunidade de se pronunciar se o HUB Alverca-Portela é um só aeroporto ou são dois desligados aeroportos. De facto, é público que ao atual Governo foi cortada essa possibilidade de análise ao só ter tido conhecimento do estudo final comparativo CTI sem o HUB Alverca-Portela.

E a razão é muito simples: a CTI, comissão técnica nomeada pelo Governo anterior, na fase prévia de seleção de soluções, impôs como condição sine qua non para passar à fase seguinte o aeroporto ser único, o que a levou a excluir a solução HUB Alverca-Portela por a ver como dois desligados aeroportos, sem perceber o alcance da inovação mundial que lhe estava subjacente.

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O pecado original do processo de avaliação governamental: a CTI, na fase de arranque processual e ainda sem ter equipa técnica para avaliar o custo, o prazo e o contrato de concessão aeroportuária (Vinci), impôs como cancela de entrada o aeroporto ser único, o que colocou o HUB Alverca-Portela logo de fora do estudo comparativo CTI por esta o entender como uma vulgar solução dual de dois aeroportos desligados (que não é).

O que significa que a CTI não percebeu, na altura, que a fusão operacional dos dois aeroportos existentes (Alverca e Portela) através de um comboio-automático exclusivo dos passageiros, enformava um único grande aeroporto como, por exemplo, o concorrente Madrid-Barajas.

Bastava então observar que o atual hub madrileno resulta da ampliação de um núcleo inicial T1-T2-T3 (duas pistas) com outro distante novo núcleo T4-T4S (duas pistas),  os quais são interligados por um bus exterior que transporta os passageiros em 10-12 minutos com intervalo de cinco minutos na ponta. Em Lisboa, a interligação dos terminais Alverca e Portela é mediante um comboio-automático exterior (maior conforto) que transporta os passageiros em 10-12min com intervalos de quatro minutos na ponta. Lisboa é melhor, com a vantagem suplementar de ter uma paragem intermédia no principal estacionamento-auto com estação bus + transfer hotéis + rent-a-car.

As consequências do pecado original: no estudo analisado pelo Governo, a solução Alcochete era uma inevitabilidade que justificava a maior ponte rodoferroviária mundial (6 faixas + 4 linhas), megaponte só necessária por o aeroporto se localizar na margem sul quando mais de 90% da procura aérea está na margem norte. E a mesma inevitabilidade do aeroporto Alcochete ainda era responsável por a ligação AV Lisboa-Porto ter mais 50km para por ele passar.

O que a exclusão CTI tapou: com o HUB único na margem norte (Alverca-Portela), apenas se torna necessária uma pequena ponte-móvel em Alverca para a linha AV Lisboa-Madrid em bitola europeia (2-4% do custo de ponte Chelas-Barreiro) e, também, a distância AV Lisboa-Porto não aumenta. Com a pretensa inevitabilidade de Alcochete, os sobrecustos da mega ponte (supérflua com aeroporto na margem norte) foram “esquecidos” e o prejuízo operacional do porto de Lisboa com a redução de altura livre de 70 a 42m, passou a mal menor.

O que o atual governo não pôde analisar: com o uno HUB Alverca-Portela, a região de Lisboa terá um grande aeroporto até 1.850ha (londrino Heathrow tem 1.220ha), com uma capacidade aérea de 105-110mov/h (madrileno Barajas 100mov/h) e com estação ferroviária de passagem (AV e convencional) na espinha dorsal da rede nacional.  Funcionalmente, o aeroporto lisboeta será como o madrileno, contudo com melhor intermodalidade (será o n.º 1 europeu).

Só agora sabendo isto, o que pode o governo da Aliança Democrática-2024 fazer? De imediato e em primeiro lugar, deve verificar, com ponderação e melhor ainda se com entidade internacional, se o HUB Alverca-Portela é semelhante ao HUB Madrid e, assim, bem superior à solução dual do HUB Portela desligado do aeroporto no Montijo (acesso por barco/bus) percecionada como a mais viável pelo governo da Aliança Democrática-2012 e ratificada pelo governo seguinte (PS com apoio BE e PCP) como solução “sem Plano B”. Esta reflexão deve atender ao facto de a dívida ser agora na ordem do dobro do que era em 2008, quando José Sócrates decidiu precisamente os projetos agora em apreciação.

Impõe-se, pois, refletir com todos os dados na mão, o que significa, no caso presente, observar o HUB Alverca-Portela como ele efetivamente é (um aeroporto único), pesar a sua competitividade e ter em conta a sua gigantesca poupança de mais de 12 mil milhões de euros face à presente decisão.

Note-se que hoje existe uma desenvolvida solução global não antevista no tempo José Sócrates, a qual foi, entretanto, formalizada (como candidatura alternativa) em janeiro de 2019: o uno HUB Alverca-Portela com associada ponte-móvel ferroviária em Alverca para o AV Lisboa-Madrid / AV Lisboa-Porto, que demora cerca de menos dez anos a implementar do que o vasto e intricado conjunto de obras ora anunciadas.

Para o bem e para o mal, será este governo o responsável pelo que se decidir, doravante na posse dos elementos não avaliados; a CTI já não será desculpa!