Ainda em setembro, o Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos (Sitava) criticava a transformação da TAP numa TAPzinha, rejeitando a ferro e fogo a necessidade de haver cortes salariais. Já em agosto, os sindicatos alemães Vereinigung Cockpit e UFO tinham sido capazes de aceitar na Lufthansa uma série de medidas desfavoráveis do ponto de vista individual, mas favoráveis do ponto de vista coletivo, incluindo reduções salariais temporárias de modo a evitar despedimentos.

No entretanto, muito aconteceu. Infelizmente, em ambas as companhias aéreas, não foi possível evitar os temidos cortes de pessoal. Contudo, em agosto e em setembro, no momento em que aquela era a realidade, impressionei-me com os sindicatos alemães, capazes de encontrarem um meio termo, e desiludi-me com os sindicatos portugueses, desprovidos de espírito de sacrifício.

Finalmente, em dezembro, o Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC) mostrou-se disposto a aceitar as condições aplicadas na Lufthansa. Foi difícil, mas, perante um cenário de muita oferta para pouca procura e, consequentemente, de excedente de pessoal, aperceberam-se de que algum espírito de sacrifício era melhor do que um despedimento em massa por extinção do posto de trabalho. Cortes salariais, reformas antecipadas, licenças sem vencimento… Há margem de manobra para negociações positivas, ainda que não ideais. As coisas estavam a andar para a frente. A administração e os colaboradores da TAP estavam a começar a perceber que in medio stat virtus.

Agora, foi tudo por água abaixo. Os colaboradores da TAP não viram quaisquer aumentos salariais – e bem!, porque não estamos numa época propícia a lucros, quanto mais a prémios. Mas com que direito é que o Conselho de Administração se deu ao luxo de ver salários revistos em alta?! Supostamente, Ramiro Sequeira passou de 17 para 35 mil euros brutos por mês. Miguel Frasquilho passou de 12 para 13,5 mil euros brutos por mês (de que adbicou, segundo declarações do próprio, em outubro). Alexandra Vieira Reis passou de 14 para 25 mil euros brutos por mês. Se calhar sou só eu, mas não me parece uma medida compatível com o famoso plano de reestruturação, no qual se prevê uma redução da massa salarial do grupo em 250 a 300 milhões de euros por ano.

Por vezes, a opinião pública, que inclui a minha, comete erros. Vamos ver se é o caso. Finalmente, os trabalhadores, representados pelos sindicatos, estavam a fazer um esforço. O que receberam em troca? 1) O aumento dos salários de três membros do Conselho de Administração com um timing muito inocente. Como o aumento foi feito enquanto a empresa desenhava um plano de reestruturação que inclui despedimentos e reduções de ordenados, estes três membros vão receber um corte num salário de 50 mil euros em vez de um corte num salário de 25 mil euros, por exemplo. Até posso estar enganada, mas parece-me um esquema de insider trading aplicado a remunerações; e 2) a conivência do Governo que, em vez de zelar pelos interesses dos trabalhadores da TAP e dos contribuintes, zelou pelos interesses de três executivos. Parafraseando Xutos & Pontapés, o mundo está ao contrário.

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