A sociedade portuguesa continua indignada e tem razão: os abusos sexuais da parte da Igreja são crime de lesa majestade. Não é preciso demonstrar tal ignomínia, ela está à vista! Qualquer criança o compreende. Por que razão ou razões valerá a pena insistir então em lembrar o óbvio? Pensar neste assunto levou-me a encontrar algumas razões, mas como elas estão todas encadeadas acabo por chegar a falar de tudo o que há no céu e na terra. Começo pela educação, porque foi a falta dela que levou a este estado de coisas.

É boa prática apontarem-se os erros, porque é uma forma de se evitar a sua repetição. É uma questão de educação, neste caso de lembrar o que faltou na educação destes homens, e que os levou a atuarem assim, de forma animal. O que fizeram significa que neles foi o instinto que prevaleceu, faltando-lhes aquele toque de classe que é ser homem, e não ser apenas um animal. Repare-se que não digo “homem e mulher” porque não entro no non sense de abdicar da expressão “homem” para referir a “natureza humana”, uma expressão em desuso pelos “bem pensantes”, mas não por isso menos acutilante, isto é, verdadeira. Não nos fere a falsa verdade destes verdugos? E, já agora, é de lembrar que as lutas pela igualdade de género bem ganhariam se soubessem que o que está em causa são as exigências de uma humanidade que se quer reconhecida em cada pessoa, homem ou mulher – palavras também em desuso quando não acopladas a outras incluídas na sigla LGBT.

Não é por acaso que também a palavra “pessoa” está em desuso. O mesmo se diga da palavra “educação” e de muitas outras da mesma família. Tudo o que seja admitir um saber de experiência feito é hoje posto de lado porque se optou por viver sob outra bandeira: “quando alguém nasce, nasce selvagem, não é de ninguém”.

O postulado deste século é partir do zero (como se isso fosse possível: então eu que ponho o zero não serei antes de mais alguma coisa?). Mas curiosamente a pós-pós-modernidade, contradizendo-se à nascença, vive também de uma herança. Ah pois é! Ai Jesus se eu não for cartesiano! E quem leva a peito a dúvida de Descartes fá-lo com a maior das canduras, ignorando essa filiação e ignorando que o próprio pai da filosofia moderna vive à custa da Tradição que o educou. Não foi a ela que ele foi buscar a Ideia de Deus?

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E nada do que se faz hoje se faz por pouco: sky is the limit!, instigam-me. Então porquê? Por favor não me limitem! Não me impinjam o purpose de que tenho que ser mais e mais, de ser mais e mais do mesmo, e só “porque sim”!

Voltando às minhas razões. Insistir em falar deste abusos, seja nas conversas one to one e presenciais, seja nas outras, a dois ou em massa, é muito bom se o foco for, não o bota abaixo, mas construir a felicidade, dos abusadores e das vítimas. Em última análise, vale a pena se o que estiver em causa for a felicidade de cada um de nós. Sim, também sei que “felicidade” é uma palavra em desuso, mas também sei que não é por isso que vou deixar de desejar sê-lo. Sim, no mais íntimo do meu íntimo algo me leva a procurar o que me falta para alcançar a plenitude. Eu quero mais do que well being, ou saúde mental! Eu não quero morrer! Eu quero ser amado pelo que sou! Eu quero amar e sou incapaz! Eu não quero que os meus filhos morram! Não me interessa ser apenas uma mulher equilibrada!

Mas não estarás a pedir de mais?, dizem-me. Ao que riposto: então já não me querem fazer acreditar que o limite é o céu?

Falar sobre o que interessa às nossas vidas sim! Não contem é comigo para bater no ceguinho. Vejo as redes, as de referência e as outras, e não encontro conversa! Não encontro argumentação que vá ao fundo, mas apenas farpas, escárnios e maldizeres pífios, farisaicos, inconsequentes de bem. Encontro só assuntos de treta. Onde está a substanciazinha?

Não há sobre o que falar? Então calemo-nos. Ou arranje-se assunto! Meu querido Hamlet vem cá outra vez lembrar aos Horácios que há mais coisas entre o céu e a terra do que nas suas vãs filosofias. E aos meus Bispos peço também substância e coragem para saber pegar nos “nomes” que agora lhes foram enviados. Haja o que houver investigue-se porque não é o mal que nos define. A Igreja sempre ensinou que a alegria não nos vem de se vencer o mal mas do facto dos nossos nomes estarem escritos no céu (Lucas 10, 20).