Quando os meus alunos me dizem que vão para aqui ou ali, e agora acolá, e depois mais outro spot e outra empresa e outro projeto, à guisa de serem felizes, pergunto-me sempre se sabem bem o que significa felicidade.

É que se agora não há mais formação por aqui então não me apetece ficar nesta empresa. Nem vou perder tempo. Não obstante, investir em criar um ambiente melhor e em contribuir para criar essa formação era um caminho mais ajustado do que apenas criticar. Mas dá trabalho.

É que se acho que não aprendo nada por aqui então não me apetece ficar mais nesta empresa. Não obstante, investir em desenvolver relações humanas, comportamentos adequados e em sofrer as agruras de um ambiente menos bom procurando recriá-lo, dando um contributo positivo, talvez fosse mais ajustado do que apenas criticá-lo. Mas dá trabalho.

É que se não me revejo nas minhas chefias porque acho que deveriam ser diferentes então já não me apetece ficar nesta empresa. Não obstante, dar o exemplo, procurar interagir, tolerar para aprender a superar – um mínimo de esforço para procurar contornar as coisas – talvez fosse mais ajustado do que uma crítica célere. Mas dá trabalho.

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É que se acho que esta relação, esta “amizade”, esta pessoa não merece muito de mim quando nem lhe dei hipótese alguma, o melhor é seguir em frente. E que tal dar oportunidades, acreditar que há uma pessoa do outro lado a descobrir, que as pessoas – seres humanos – podem e procuram dar o seu melhor (há as que têm patologias graves mas, essas, felizmente, são a minoria)?  E que o contributo de cada um é precisamente humanizar, porque se gostamos de felicidade isto só se faz e constrói em grupo e por via de relações e tolerância – e se nós gostamos talvez os outros também gostem. Mas dá trabalho. Muito trabalho.

E portanto, como tudo dá trabalho, não me parece que ficar por demasiado tempo no mesmo local seja positivo pelo que vá de colocar uma mochila e dar uma volta por aí. Uma vez, duas vezes, três vezes. Tantas quantas as necessárias até tudo se tornar igual e começar a criar padrões. À primeira resultou. À segunda foi mais ou menos. À terceira deu para ver que ir para fora não me satisfaz assim tanto. Sobretudo porque o problema, o meu problema, não está em ir mas, antes, em resolver-me internamente.

E portanto, também, alguém que esteja um bocadinho numa empresa e um bocadinho noutra e salte de empresa em empresa à procura da felicidade, sem lutar, sem transpor obstáculos, sem ter barreiras e dificuldades para, precisamente, saber torneá-las, não poderá aspirar a alguma tipologia de felicidade.

Um portanto, igualmente, para alguém que não tenha um drive e uma orientação profissional – porque essa é uma dimensão importante da vida bem como um trabalho (sério e estruturado e que procure não passar por entre os pingos da chuva mas, antes, seja capaz de construir na adversidade, erguer por entre barreiras, ultrapassar obstáculos) – e que, portanto, não poderá ter esse acesso à felicidade.

Eu assumo que a capacidade para ser feliz, usando aqui parte do pensamento de Seligman (Penn State), tenha a ver com o skill set da resiliência, ou seja:

  1. self-awarness, i.e., a capacidade para prestar atenção aos pensamentos, emoções, comportamentos e reações na dimensão psicológica mais lata;
  2. self-regulation, ou a capacidade para mudar esses mesmos pensamentos, emoções e comportamentos em função de um objetivo pretendido;
  3. mental agility, i.e., a capacidade para olhar para situações diversas a partir de múltiplas perspetivas e ser capaz de pensar criativamente e de forma flexível;
  4. força de caráter, i.e., o sermos capazes de nos envolver autenticamente em desafios e criar uma vida alinhada com valores pessoais;
  5. conexão, i.e., a capacidade para criar e manter relações fortes e confiáveis; finalmente,
  6. otimismo, ou a capacidade de dar conta e de apreciar o lado positivo das coisas, focando-se no que cada qual é capaz de controlar e tomar ações em função disso e de forma consistente.

Isto entronca na área da psicologia positiva que, cientificamente, procura estudar as forças que permitem a indivíduos e comunidades florescerem.

Esta área do conhecimento é baseada na ideia de que as pessoas procuram vidas com sentido e que sejam preenchidas, cultivando o que de melhor têm e alavancando as suas experiências de amor, de trabalho e de distração.

No final, o que se pretende da vida é qualquer coisa completa, com significado, com capacidade de entrega ao que se faz, com olhar positivo e procurando sempre a construção. Subjaz a tudo isto a necessidade de trabalho das competências e subjaz a tudo isto, também, a perseverança.

Mas é pelo amor e amizade, pela construção, pelo enlevo, pela alegria que se coloca nas coisas que se vai lá. E isso, goste-se ou não, dá muitíssimo trabalho.

Ninguém provará nada de especial em termos de felicidade se não tiver adversidade na vida.

Ninguém provará nada de especial em termos de felicidade se todos os dias forem cor de rosa. Porque os dias não são todos cor de rosa. Acreditar nisso é não acreditar no esforço, no trabalho, na remuneração que daí possa advir.

Mudar de projeto, de trabalho, de empresa, de caminho, de rumo, de tudo, por tudo e nada e porque há contrariedades não é caminhar para ser feliz. É caminhar para a frustração.

Quando me dizem, “adeus, vou ser feliz”, fico preocupado.

Primeiro porque há uma ténue ideia do que é a felicidade e ela não é, certamente, o que aparece por aí em barda nas redes sociais.

Segundo porque a felicidade é uma conquista de todos os dias e nem todos os dias são dias felizes. Para chegar à estabilização, ao bem-estar connosco próprios e com a vida dá trabalho. Dá muito trabalho.

Terceiro, e finalmente, porque a felicidade está dentro de nós quando soubermos resolver-nos connosco e com o mundo que nos rodeia – amizades, relações, trabalho, distração, amor. Mas tudo isso, tudo mesmo, dá muito trabalho.

Presidente, Comissão Executiva, INDEG-ISCTE Executive Education; Professor Catedrático, ISCTE – IUL