A última visita de Vladimir Putin à Grécia teve dois objectivos essenciais: minar a já quase inexistente unanimidade face às sanções contra a Rússia e apresentar-se como o “reunificador” do mundo Ortodoxo. Para alcançar este objectivo até está a ser utilizada a detenção do alegado espião português que vendia segredos aos serviços secretos russos (SVR).

Dentro de pouco mais de um mês, a União Europeia deverá decidir se prolonga ou não as sanções contra a Rússia, avançadas em 2014 depois de as tropas de Moscovo terem ocupado a Crimeia e parte do Leste da Ucrânia.

Putin está a desenvolver todos os esforços com vista a que o regime de sanções não seja prolongado, ou pelo menos comece a ser suavizado. O governo grego está entre aqueles que defende o levantamento das sanções, pois, na situação em que se encontra a Grécia, todo o apoio económico é bem-vindo. Porém, por enquanto, Moscovo tem-se limitado a promessas, deixando a possível realização dos planos para depois do levantamento das sanções.

Como é sabido, o dirigente russo tem aliados não só na Grécia, mas também na Hungria, isto no que diz respeito aos apoios abertos, porque os encobertos e “envergonhados” são bem mais e a discussão promete ser acesa.

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Já prevendo este cenário, Frank-Walter Steinmeier, ministro das Relações Externas da Alemanha, vem propor uma fórmula de compromisso: “O princípio do “tudo ou nada” não nos aproxima do objectivo. Pelo menos actualmente. Por isso, a minha proposta consiste em incluir um elemento de estímulo nas relações entre ambas as partes. E no caso de progresso considerável, deverá ser possível levantar por etapas as sanções existentes”.

Para o ministro alemão, que parece já se ter esquecido que as sanções começaram a ser impostas pela invasão russa da Crimeia, seria suficiente que a Rússia recuasse no Leste da Ucrânia para que o processo de levantamento começasse.

Em relação ao regime de Putin, trata-se de uma política arriscada, pois isso será considerada pelo Kremlin uma vitória política e um sinal de que a União Europeia deixou para trás a questão da Crimeia e, no futuro, poderá ter de aceitar aventuras putinistas ainda maiores.

Porque, como afirma a propaganda russa, tudo não passa de uma conjura contra o Presidente Putin. Até mesmo o caso do alegado espião português que trabalhava para a Rússia.

Depois de citar várias tentativas de “denegrir” o Presidente Putin, Oleg Tchubakin, analista da “Revista Militar” escreve com ironia: “Ele [Frederico Carvalhão Gil] vendia em envelopes, de forma bonita e ordenada. Pousou o envelope na mesa, do outro lado da qual estava sentado o “controleiro russo”. A venda de documentos confirmou: o Presidente russo Putin interessa-se por “segredos ocidentais”. Putin escolheu Roma como centro de “espionagem” … O senhor Gil tentou vender segredos de bases militares, de sistemas de defesa e de comunicação da NATO. Entrou em contacto com um oficial do Serviço de Inteligência Externa da Rússia. Oito agentes ocidentais conseguiram prender não só Gil, mas também o oficial, cuja identidade, por alguma razão, ainda não foi revelada”.

A realidade, porém, é bem mais séria. Depois da visita de Putin à Grécia e da sua instalação, ostensiva e séria, no trono dos imperadores bizantinos que se encontra num dos mosteiros ortodoxos da Montanha de Athos, Vladimir Lepekhin, comentador da agência oficial russa Ria Novosti, escreveu: “Tudo o que aconteceu na Grécia no passado fim de semana com a participação de Vladimir Putin teve um carácter se não sacro, pelo menos claramente sintomático e simbólico tanto para a Rússia e o mundo ortodoxo, como para a Europa e o mundo cristão em geral”.

“Nesta situação – continua o analista – a Europa actual precisa de um líder novo e real, capaz de enfrentar a realização da globalização à americana, monstruosa pelo seu projecto e métodos, de reformatar o espaço europeu antes de tudo em prol dos próprios europeus. O filósofo esloveno Slavoj Zizek escreveu sobre esse líder há dez anos atrás no seu livro À Espera de um Senhor”.

Escusado será dizer que, neste caso, o “Senhor” é Vladimir Vladimirovitch Putin, o único também capaz “de, periodicamente, ser uma espécie de afinador do piano europeu quando se pronuncia sobre temas que os políticos europeus simplesmente não estão em condições de abordar devido ao medo da inevitabilidade de sanções por parte dos bastidores políticos dominantes”.

Está a União Europeia pronta para negociar com dirigentes deste tipo, deixando de lado a ilusão de que com o Presidente russo se possa conversar “à europeia”? Será Bruxelas capaz de criar novas ideias (ou talvez ir buscar velhas ideias ao baú da história) nas relações com o Kremlin? Ou irá permitir que os “putinzinhos” tenham um papel cada vez mais influente e destrutivo na Europa?