Em 1983, um deputado trabalhista leu o programa eleitoral do seu próprio partido e, perante aquela louca defesa do socialismo em Inglaterra, declarou que se tratava da “mais longa nota de suicídio da História”. Na sexta-feira, assistimos à mais longa nota de suicídio da História financeira portuguesa. Ao fim de cinco inusitadas horas, Joe Berardo sofreu uma transformação irreversível: passou de empresário em decadência a inimigo n.º 1 do regime.
Foi um erro fatal. Todas as pessoas que ouviram Joe Berardo a jurar que “Eu, pessoalmente, não tenho dívidas” e todas as pessoas que o ouviram a reproduzir gargalhadas enquanto desafiava os bancos a tomarem posse dos quadros da sua coleção fizeram a mesmíssima pergunta angustiada: “Como é que isto é possível?”.
Ao contrário do que possa parecer, é muito fácil responder à pergunta: “isto”, simplesmente, não é possível. Na sexta-feira, Berardo passou uma linha invisível. Portugal já teve muitos empresários que envergonharam o país — empresários que fugiram ao fisco, empresários que enganaram a Segurança Social, empresários que usaram as empresas para ajudar amigos políticos e empresários que corromperam, falsificaram ou, mais prosaicamente, roubaram. Mas há uma gigantesca diferença entre ser um empresário que faz uma dessas coisas — ou todas elas, em acumulação ou sequência — ou ser um empresário que, mesmo não tendo feito nenhuma delas, se tornou o símbolo mais notório do impasse do sistema.
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