Monumento a Peter Fechter. Peter Fechter (14 de Janeiro de 1944 – 17 de Agosto de 1962) era um pedreiro do Leste de Berlim, que aos 18 anos se tornou numa das primeiras e provavelmente a mais famosa vítima do Muro de Berlim.
Com o mapa da cidade aberto e meio escangalhado, procurava decifrar o emaranhado de traçados de linhas de metro, que abastecem a cidade de Berlim.
“ – Precisa de ajuda ?” – Perguntou-me polidamente alguém nas minhas costas. Lá lhe expliquei para onde queria ir, e o sujeito com a esperada eficácia germânica rapidamente esclareceu.
Meia hora depois, já noutro cais de metro, provavelmente outro Berlinense, teve atitude semelhante.
Não me lembro de assistir em nenhuma capital europeia, com a dimensão da Alemanha, esse tipo de hospitalidade ou auxílio.
Esse pequeno facto fez-me reflectir que talvez esses pequenos gestos tenham razões históricas nas quais as pessoas se ajudavam com frequência na constante luta pela sobrevivência.
Porque afinal a história de Berlim é disso que se trata. Luta pela sobrevivência e pela dignidade enfrentando adversidades imensas em diferentes momentos históricos.
Berlim foi praticamente dizimada com a entrada dos soviéticos no culminar do fim da 2ª Guerra Mundial em 1945. Os berlinenses sabiam que a sua guerra estava já perdida e quase só faltava a tomada de Berlim por parte dos Aliados. A cidade tinha sofrido fortes bombardeamentos por parte dos americanos em Fevereiro desse ano, e mesmo assim os berlinenses ansiavam que essa invasão militar final fosse feita pelas tropas Aliadas ocidentais. Na verdade previam o pior se a invasão fosse protagonizada pelo exército soviético. E de facto foi o que veio acontecer.
Os soviéticos reduziram Berlim a escombros, mataram o mais que puderam, não se poupando a todo o tipo de violações e a pilhagens.
(…) Os dois milhões de abortos que se faziam por ano na Alemanha ocupada, durante o período logo a seguir à guerra, fundamentalmente na zona soviética, eram testemunhas de um sofrimento inimaginável, como o eram a subida em flecha da incidência das doenças venéreas e os 150 mil a 200 mil “ bebés russos” que nasceram em consequência das violações.(…)
É a partir de 8 de Maio de 1945 que o fim da guerra é proclamado e Berlim podia então pensar na sua reconstrução. Como território a ser ocupado, a cidade iria ser dividida em 3 sectores; sector americano, sector inglês e sector francês pelos Aliados ocidentais e sector soviético.
Mas Berlim não iria viver tempos serenos que seriam importantes para o seu renascimento.
Maio de 1945 , final da Guerra
(…)Berlim era o centro administrativo, político e económico do Reich. O último censo tinha registado uma população de 4,25 milhões de habitantes. Destes, 600 mil trabalhavam em fábricas. Um em cada de 13 operários industriais alemães vivia na área da Grande Berlim. A cidade produzia cerca de um décimo de toda produção industrial do país. Após cinco anos de bombardeamentos dos Aliados e de duas semanas de violentos combates de rua, que custaram quase 100.000 mortos ao exército soviético e o dobro de baixas civis alemãs, praticamente não existia um único edifício em pé no centro da cidade. A população seria mais ou menos metade do que existia antes da guerra. 40% dos edifícios tinham sido destruídos. Berlim não tinha energia eléctrica, sistema de esgotos ou transportes públicos a funcionar devidamente.(…)
Bloqueio soviético – 1948
Três anos depois da proclamação do final da Guerra, deu-se o bloqueio soviético, ordenado por Staline e obedecido pelo governo da Alemanha comunista, pelo seu lider Walter Ulbricht. Este bloqueio consistiu no corte de todas as comunicações entre Berlim e o resto do mundo ocidental. Estava-se a 24 de Junho de 1948.
Nesta data é vedado a Berlim Ocidental qualquer acesso da sua população ao restante “ mundo ocidental”. Berlim dependia de corredores aéreos que a ligavam ao Oeste e nos quais se canalizavam todos o tipo de abastecimento, quer alimentar, médico e até energético.
Dois dias após o bloqueio soviético, aviões americanos começaram a abastecer Berlim com voos frequentes e diários.
O esforço das potências ocidentais foi surpreendente. A ponte aérea necessária para abastecer Berlim obrigaria a uma logística complexa a que os Aliados já não estavam habituados desde a 2.ª Guerra Mundial. Além de que Berlim era ainda a memória demasiada viva do estado nazi.
Berlim estava pois votada a ser o braço de ferro entre Este e Oeste, e a história seguinte iria comprovar isso mesmo.
17 de Junho de 1953 : uma data esquecida
17 de Junho de 1953 foi uma data esquecida pelo mundo ocidental, mas bem marcada pelos Berlinenses de então.
Staline já tinha morrido mas a RDA era liderada pelo seu mais fiel aluno , Walter Ulbricht, que mantinha a Alemanha de Leste na marcha para o socialismo. Este não abdicava da linha Stalinista.
No início de Junho de 1953 rebentaram greves e tumultos no país vizinho; na Checoslováquia que iriam paralisar 129 fábricas. Tais acontecimentos iriam fomentar o descontentamento que alastrava na RDA, e na própria massa operária.
O conselho de ministros do governo comunista da denominada Alemanha Democrática aprovara um pacote de medidas que incluíam um aumento de preços, um aumento de impostos e um aumento nas quotas de produção das empresas públicas – quase todas…
Em Berlim Oriental, a 16 de Junho várias greves desencadearam-se e berlinenses ocidentais vieram do sector-americano, em autênticas torrentes a fim de se juntarem às manifestações.
Algo muito próximo de uma revolta em larga escala estava a tomar forma, envolvendo dezenas ou mesmo centenas de milhares de berlinenses comuns. Exigiam liberdade, eleições, e cada vez mais uma Alemanha reunificada. As autoridades comunistas estavam a preparar-se para lhes responder.
Os tanques do exército vermelho estavam nas ruas de Berlim oriental.
A 17 de Junho, pelas 13 horas, foi declarado o estado de emergência e proibido qualquer tipo de ajuntamento com mais de 3 pessoas.
O levantamento popular foi brutalmente esmagado tanto pelas forças policiais da RDA como as forças soviéticas.
O 17 de Junho, dia da revolta dos trabalhadores da RDA, deu o nome a uma longa e larga alameda em Berlim Ocidental, e estende-se ao longo de quatro quilómetros, da Ernst-Reuter-Platz, passando pela Coluna da Vitória, até ao Reichstag e à Porta de Brandeburgo. .
Após a queda do muro de Berlim e segundo registos encontrados este foi um fenómeno que extravasou o perímetro de Berlim e alastrou-se por toda a RDA. Com efeito meio milhão de trabalhadores entrou em greve em toda a Alemanha de Leste.
Os manifestantes apelaram para que Walter Ulbricht viesse discutir com eles as razões das suas queixas. Mas o diálogo foi inexistente de Ulbricht que passou os dias 17 e 18 de Junho sob protecção soviética, no quartel general do Exército Vermelho, em Berlim – Karlshort.
1961 : O início do muro
“…Nas primeiras horas de 13 de Agosto de 1961 as fronteiras na Zona Este de Berlim, ocupada pelos soviéticos, e a zona Oeste controlada pelos americanos, ingleses e franceses, começaram a ser fechadas. No início colocaram arame farpado para separar Berlim Oriental e Ocidental, mas com o tempo foram substituindo por painéis de betão armado, surgindo o muro de Berlim- Berlin mauer.
O muro separava a cidade, o povo e o mundo separando famílias e amigos durante décadas e surgindo como o expoente forte e dramático da “Guerra Fria“.
No período pós guerra o desenvolvimento do Ocidente fazia-se notar face aos países dominados pela União Soviética e a Alemanha Oriental não era excepção. Este desenvolvimento deveu-se em parte ao “Plano Marshall”. Os desequilíbrios sociais e económicos eram cada vez mais patentes entre Berlim Oriental e Ocidental, tal como no resto do mundo. Os berlinenses do sector soviético vinham frequentemente aos sectores dos Aliados na busca de melhor emprego, melhor comida, e consequente melhor qualidade de vida.
Estima-se que mais de 2 milhões e meio de alemães do Leste tenham emigrado para a Alemanha Ocidental entre 1946 e 1961,enquanto que a população do Leste era de 17 milhões de pessoas. A situação para o sector soviético era de grande esvaziamento.
Final
A partir de 1961, data da construção do muro, até 1989 morreram invariavelmente 10, 15, 12, jovens por ano nas diversas tentativas de travessia do lado oriental para o lado ocidental.
Não eram pessoas de meia idade e tinham quase todos entre 20 e 22 anos. O desânimo no lado oriental era grande, e a população mais nova não sentia esperança no futuro. O desespero devia ser insuportável para que estas pessoas tentassem a própria vida, para sair da “promissora terra socialista”.
Os soldados que as aniquilavam nas suas tentativas de fuga, eram frequentemente condecorados.