O maestro Mário Centeno, governador do Banco de Portugal, ergue a batuta e, qual oráculo moderno, profetiza um futuro de desequilíbrio orçamental, caso a orquestra política continue a tocar a mesma “melodia dissonante de gastos desenfreados”.
Mas eis que surge a indagação: seria o maestro Centeno um mero intérprete da partitura da estabilidade financeira, ou teria ele ousado improvisar, aventurando-se em solos de crítica política que não constam da pauta original do Banco de Portugal? Afinal, a instituição que dirige é guardiã da moeda e da solidez do sistema financeiro, não um crítico musical das decisões políticas.
A melodia da crítica, entoada por Centeno, ecoa as preocupações de inúmeras vozes que, qual Cassandra moderna, há muito alertam para os perigos da instabilidade financeira e da falta de disciplina fiscal. Ambos temem que o país se transforme num barco à deriva, sem rumo nem bússola, em meio à tempestade da incerteza económica.
Contudo, a crítica do maestro Centeno levanta questões sobre a legitimidade da sua intervenção. Seria ele um guardião da estabilidade financeira ou um maestro que, ao invés de reger a orquestra, se aventura em solos de crítica política? Afinal, a independência das instituições é um pilar fundamental da democracia, e a sua atuação deve cingir-se ao seu mandato específico, evitando a tentação de se tornar, novamente, um ator político.
A analogia com a volatilidade política é inevitável. Tal como a imprevisibilidade das tendências eleitorais, a economia também está sujeita a ciclos de expansão e recessão, de euforia e pessimismo. As previsões de domínio da esquerda, outrora tidas como inabaláveis, foram desmentidas pela ascensão da direita radical, que soube explorar as redes sociais como um novo palco para a sua performance política.
A lição a retirar é que a política, tal como a economia, é um jogo de forças em constante movimento, em que a acomodação e a complacência podem abrir espaço para a emergência de novos atores e de novas ideias. A esquerda, outrora imbuída de um sentimento de inevitabilidade, viu-se desafiada pela direita, que soube aproveitar o descontentamento popular para construir uma nova narrativa.
Assim, a instabilidade financeira e a volatilidade política são duas faces da mesma moeda, reflexos de uma sociedade em constante transformação, em que as certezas de hoje podem ser as dúvidas de amanhã. Cabe às instituições, como o Banco de Portugal, manterem-se firmes no seu papel de guardiãs da estabilidade, evitando a tentação de se tornarem atores políticos.
Em suma, a sinfonia da instabilidade em Portugal é um lembrete de que a política e a economia são domínios complexos e interligados, em que a imprevisibilidade e a mudança são a norma, não a exceção. Cabe aos atores políticos e económicos, assim como às instituições, adaptarem se a esta realidade, evitando a tentação de se tornarem maestros de uma orquestra que, por vezes, parece tocar uma melodia dissonante. Afinal, a estabilidade e a democracia, tal como a boa música, requer uma partitura clara e precisa, em que cada instrumento cumpre o seu papel, sem interferir na melodia dos outros, respeitando a partitura.