Uma vez que o senhor primeiro-ministro não lhe soube responder se um aluno devia passar de ano mesmo sem saber, eu vou ajudá-lo a perceber por que razão a resposta só pode ser SIM. Mas tem de fazer um esforço de compreensão porque o grande problema da actual geração de governantes, políticos, jornalistas e comentadores é serem liderados pela nossa geração, a geração das passagens administrativas do pós-25 de Abril em que os alunos passavam sem sequer pôr os pés nas aulas.

Ora, o fim das reprovações na escolaridade obrigatória não tem nada a ver com as passagens administrativas dos seus tempos de universidade. Pelo contrário, o fim das reprovações é a condição primeira para um ensino de excelência na escolaridade obrigatória, porque é a única que permite que se aumentem os graus de exigência e se desenvolvam e rentabilizem ao máximo as capacidades de cada aluno. É óbvio que, só por si, não resolve o problema sem vir acompanhada de outras medidas, designadamente: exames nacionais nos 4.º, 6.º, 9.º e 12.º ano de escolaridade e um novo conceito de turma (cada ano deve corresponder a uma única turma, por forma a poder haver, por disciplina, sub-turmas de recuperação e de excelência e, simultaneamente, permitir a mobilidade entre elas).

A escola selectiva de Salazar, que ainda hoje continua a ser o modelo dos melhores colégios privados, é, sem dúvida, uma escola de sucesso, mas assenta no mesmo modelo das escolas de futebol do Ajax, Barça e Benfica. Ou seja, na selecção dos melhores e eliminação daqueles que não têm aptidões. Se as escolas de futebol fossem obrigadas a manter até aos 16 anos todos os alunos das respectivas cidades, só se fossem loucos é que não passariam de ano todos os alunos, inclusive aqueles que não demonstrassem qualquer aptidão para a prática da modalidade. Ou acha que estes alunos aprenderiam mais se continuassem a jogar nos infantis até aos 16 anos? E os infantis com talento, acha que sairiam beneficiados caso as equipas de infantis estivessem infestadas de pernas-de-pau com 16 anos?

É evidente que todos os jogadores têm de passar de ano/escalão, independentemente das suas capacidades, para bem de todos. Sendo certo que, ao contrário das passagens administrativas do nosso tempo, neste caso, não passam todos em igualdade de circunstâncias porque passam com uma clara diferenciação entre os melhores e os piores e com uma vantagem: a qualquer momento o pior pode dar um salto de qualidade e ser chamado para a primeira equipa (sub-turma de excelência) e o melhor pode passar para a terceira equipa (sub-turma de recuperação). Ou seja, a competitividade e a diferenciação entre os alunos faz-se dentro do seu escalão de idade e não por anos de escolaridade.

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Além disso, o simples facto de todos os alunos chegarem obrigatoriamente aos juniores não significa obviamente que fiquem todos habilitados para triunfar nas melhores equipas ou sequer para jogar nalguma equipa.

Para finalizar, apenas dois apontamentos. Sempre que se argumenta com o sucesso que alguns dos alunos retidos tiveram, no ano seguinte, nas disciplinas com menos aproveitamento, era importante saber se o professor tinha sido o mesmo e se o grau de exigência foi o mesmo, caso contrário os dados não querem dizer rigorosamente nada.

Por outro lado, mesmo no actual sistema (irracional e absurdo), é preferível passar, por exemplo, um aluno excelente a línguas e sem aptidões nas demais disciplinas, do que reprová-lo. E porquê? Porque, se passar, consegue manter o nível excelente a línguas e, se reprovar, até nas línguas regride.