Durante quanto tempo mais irão lá estar? À falta de melhor identificação chamo-lhes os funcionários do álcool gel. Em Lisboa e não só, a sua tarefa é mandar passar as mãos por álcool gel a quem pensa entrar em vários mercados municipais. Estas brigadas do álcool gel chegaram em 2020 com a pandemia. Ano e meio depois por lá são mantidos apesar da evidente inutilidade da função, pois nunca se provou a transmissão do vírus pela superfície das batatas, pescadas, laranjas ou alfaces.
Aeroportos, centros comerciais, lojas… mantêm os recipientes de álcool gel e os avisos para o utilizarmos mas há muito que deixaram de ter funcionários afectos a essa tarefa. Já no organograma das entidades pagas pelo contribuinte português ,despesa criada é para ser mantida e acrescentada. Logo, os contribuintes portugueses, os tais que noutro país seriam pouco mais que pobres mas que aos olhos do fisco português são ricos, esses mesmos pagam a uns funcionários para barrarem a entrada a quem não se dispuser a colocar nas mãos o dito álcool gel.
Segundo os últimos números, 731.258 pessoas estão empregadas em Portugal nas Administrações Públicas. Mas, segundo a experiência de qualquer um que não tenha aderido ao modo de vida “confinado até ao zero Covid” e que, consequentemente, tente obter a documentação básica para trabalhar e viajar, as administrações públicas mostram-se cada vez mais incapazes de prestar os serviços a que se propõem: neste mesmo Verão em que se conheceu o número crescente de funcionários públicos foi também notícia que mais de 300 mil pessoas esperam pelo Cartão de Cidadão. E terão de esperar nada mais nada menos que entre três a seis meses. No caso dos passaportes, que antigamente se obtinham em cinco dias, agora demoram mais de dois meses a ser emitidos. As licenças para obras atrasam-se porque sim. Ninguém sabe quando a dra. assinará, muito menos quando o funcionário estará e se, nesse caso, poderá tratar do assunto.
Mas como se explica que, aumentando o número de funcionários contratados, a capacidade de resposta da administração pública seja cada vez pior? A pandemia explica estes atrasos, mas só em parte. Na verdade, o confinamento serviu para a administração pública se virar ainda mais para si mesma: à excepção da cobrança de receita, tudo o mais ficou sem data marcada. (A propósito, quantas das pessoas que ovacionaram Marta Temido no Congresso do PS tentaram marcar uma consulta num centro de saúde nos últimos meses? O alegado atendimento telefónico tornou-se uma barreira para os alegados utentes.)
Mas o número crescente de funcionários públicos ou a trabalhar no sector público, encerra outras e não menos incómodas perguntas: que funcionários estão a ser contratados? Que tarefas vão desempenhar? Notícias dispersas vão dando conta da dificuldade do Estado em contratar precisamente aqueles funcionários com que a retórica socialista justifica o crescente número de funcionários públicos: este ano, ficou por preencher um terço das vagas do concurso que pretendia contratar 459 médicos de medicina geral e familiar. No ano passado, no concurso para agentes da PSP só se candidataram 793 pessoas para um total de mil vagas. Diminuir a exigência foi a solução encontrada este ano para contornar a falta de candidatos à PSP. No caso da falta de médicos a solução, por enquanto, é outra: a interrupção dos serviços.
As administrações públicas crescem em número de funcionários, mas perdem competências e capacidade técnica. De certo modo e em diferentes funções temos a proliferação do que se pode designar como funcionários do álcool gel: gente que desempenha funções sem utilidade conhecida, de que não resulta qualquer benefício para o cidadão. Gente que produz instruções que temos de cumprir escrupulosamente para termos acesso a serviços ditos públicos. Gente cuja prepotência cresce na exacta proporção da inutilidade do cargo.
A DGS e a sua atrabiliária directora-geral são um bom exemplo desta degradação de uma administração pública que perdeu competência, ganhou funcionários e fez da subserviência ao poder (se o poder for socialista, obviamente) a sua imagem de marca.
O embevecimento pasmado com o desempenho do vice-almirante Gouveia e Melo à frente da Task Force para o Plano de Vacinação é bem sintomático de como já foi interiorizada esta degradação: basta que alguém desempenhe a sua missão conforme se propôs para que de imediato seja visto como alguém fora do comum, quiçá presidenciável. Se, como acontece no caso, o protagonista for um militar a desempenhar uma tarefa que cabe no âmbito do “humanitário” melhor ainda.
Somos hoje um país envelhecido que olha o futuro como velhos sentados num lar: o que interessa sermos o terceiro pior país europeu em termos de capital privado investido nas empresas em função do Produto Interno Bruto se temos os dinheiros da bazuca? Os fundos da UE tornaram-se na nossa pensão de sobrevivência: dá para irmos vivendo.
Portugal tornou-se uma espécie de Casa de Repouso: na propaganda tudo é asséptico e risonho. A realidade é outra, mas na Casa de Repouso Portugal Socialista o que conta é a ilusão e que se possa dizer que está tudo bem. Mesmo e sobretudo quando pressentimos que vai quase tudo mal.
PS. As negociações para aprovação do OE tornaram-se um leilão de novas oportunidades de poder para a esquerda radical. Ficámos a saber: “Governo quer que condenados por ódio possam ser expulsos de várias profissões. Proposta de alteração do Artigo 240.º do Código Penal está pronta. Sanção é para ser aplicada em casos muito graves a titulares de cargos e funcionários públicos, académicos e jornalistas”. Como é óbvio, todos os casos serão muito graves e ai do juiz que não for dessa opinião, pois todos os dias o seu nome ecoará pelas redes sociais como símbolo do mal. Mais óbvio ainda é que esta aberração não pode ser tolerada.