A reacção em forte queda das bolsas europeias e a desvalorização da libra evidenciam que a vitória do Brexit aumentou substancialmente o sentimento de incerteza e os receios entre os investidores. Há boas razões para isso: no contexto da UE a 28, o Reino Unido é a segunda maior economia (apenas atrás da Alemanha) e o país líder em muitos sectores de grande importância.
Acresce que, por ser um caso sem precedentes no contexto da UE, ninguém realmente consegue antecipar com precisão como se vai processar a saída do Reino Unido e como vão ficar no final desse processo as suas relações com os países membros da UE. Além disso, é preciso ter em conta também a possibilidade de efeitos de contágio de vária ordem. Tudo somado, há abundantes razões para encarar o futuro com cautela, mas importa acima de tudo salientar que os efeitos futuros da saída dependerão das decisões políticas que venham a ser tomadas, tanto pelo Reino Unido como pela UE.
No plano económico, há fortes interesses mútuos no sentido de manter relações abertas, mas importa não subestimar o potencial para causar danos de ideias políticas destrutivas. Alguns dos argumentos mais ouvidos em defesa da saída do Reino Unido assumiram um carácter lamentavelmente proteccionista e intervencionista. Se esses argumentos prevalecerem, o Reino Unido será o principal prejudicado.
Os riscos de má gestão política deste delicado caso são no entanto ainda maiores do lado da UE. Alguns dos sinais vindos a público até agora sugerem uma abordagem arrogante, rancorosa e punitiva. Procurar fazer do Reino Unido uma “vacina” contra outros países que tenham iguais tentações soberanistas será fútil, irresponsável e contraproducente. Fútil, porque não faltam vias alternativas ao Reino Unido. Irresponsável, porque os danos seriam pesados para as economias de muitos países membros da UE. Contraproducente, porque certamente estimularia a oposição à UE em muitos desses mesmos países membros, em particular aqueles com maior proximidade ao Reino Unido.
Para que se evite um caminho que conduziria à destruição da UE, é fundamental que, de ambos os lados, prevaleçam o bom senso e as vozes ponderadas. Como bem assinalou José Manuel Fernandes: “se quisermos mitigar os riscos do futuro temos de trabalhar para ter o Reino Unido o mais próximo possível da União Europeia, não agir com arrogância e de forma retaliatória”.
Seja por via bilateral ou por um mecanismo como o Espaço Económico Europeu, nada impede que Reino Unido e União Europeia continuem a beneficiar mutuamente de um mercado comum com amplas liberdades partilhadas. Portugal pode e deve ter aqui um papel de relevo, não só pela importância das actuais relações com o Reino Unido mas também pelos laços históricos simbolizados pela mais antiga aliança diplomática que ainda vigora. Se vier a desempenhar esse papel de forma eficaz, prestará também um grande serviço à própria UE. O Brexit pode iniciar um processo que leve ao fim da UE mas esse colapso só se concretizará se for auto-infligido pela própria UE.
Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, membro do Benedict XVI Centre for Religion and Society e Visiting Senior Fellow da St. Mary’s University.