Temos muito a ganhar se usarmos o método dialético na tentativa de encontrar soluções para os problemas das nossas empresas. Podemos perguntar: o nosso tecido empresarial precisa de alguma coisa neste contexto pandémico? A resposta é óbvia: precisa de muitas coisas, de muita criatividade e de algumas tréguas do legislador laboral. Centremo-nos nas alterações ao Código do Trabalho – que, como sabemos, não é sofisticado e não estava preparado para contextos de crise – marcando os últimos dois anos num loop esquizofrénico de alterações e interpretações, aplicações desviantes e falta de rigor, perante o incomodativo silêncio das autoridades competentes. Apesar da loucura legiferante aliada a uma pandemia sem precedentes, as empresas (algumas) aguentaram-se.

Chegados ao ano 2021, e começando pela temática do teletrabalho, foram dez as propostas de lei que chegaram ao Parlamento e que são suscetíveis de afetar sobejamente os empregadores deste país. À laia de transformação do Código do Trabalho numa manta de retalhos, assistimos recentemente a uma panóplia de propostas de novas alterações, reversões e retrocessos.

O contexto pandémico foi, portanto, mote – ou desculpa – para muita coisa mal feita. Mas também evidenciou um conjunto de oportunidades, onde destacamos a tecnologia. Se (ainda) faltavam motivos para fazermos a transição digital, eles sobraram com a pandemia. O grande exemplo foi o teletrabalho, com a sua adoção em larga escala e, em muitos contextos, a sua obrigatoriedade.

A quarta revolução industrial já chegou e nós já somos atores em todo o seu contexto – embora uns estejam mais preparados do que outros. E se as empresas tiverem a coragem de olhar para o seu futuro (que começou ontem) sem as amarras a que estão acostumadas? Por que não adotarem planos de governance laboral mais sofisticados do que aqueles que são propostos por terceiros? Refiro-me a um compliance laboral e tecnológico, que permita às empresas fazerem o match entre as obrigações legais, as necessidades organizacionais, os direitos e os deveres dos trabalhadores e as oportunidades tecnológicas. Não pretendo fazer qualquer tipo de cenarização, mas há já poucas dúvidas acerca dos impactos da tecnologia no contexto das relações laborais nos próximos anos.

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Por isso, a aposta na formação profissional e no capital humano não deverá escapar ao gestor do século XXI. E urge evitar algumas tendências de terceiro mundo – mais uma vez, porque o mindset dos nossos gestores não está alinhado com as boas práticas laborais e tecnológicas – colocando entidades patronais e trabalhadores a lutar por créditos de horas de formação em contexto de cessação do contrato de trabalho, surgindo o trabalhador a exigir quantias a título de formação devida e não ministrada. Em plena quarta revolução industrial, terá de ser a lei a obrigar as empresas a um mínimo de horas de investimento em capital humano? A falta de investimento em formação não sairá mais cara no final das contas? Para as empresas, as vantagens de serem, simultaneamente, laboral e tecnologicamente “compliant” são inúmeras: cumprem uma obrigação legal, evitando penalidades, retêm talento, capacitando e qualificando os seus trabalhadores, que são já forçosamente trabalhadores da era digital, e contribuem para o desenvolvimento e sucesso da sua atividade.

É, pois, urgente para as empresas a adoção de um modelo de compliance laboral e tecnológico, onde a formação profissional, acoplada à tecnologia, tenha o destaque merecido. Não pode haver formação para cumprir calendário, subordinando-a, muitas vezes, a temas enfadonhos ou desatualizados apenas para ‘’inglês ver’’ ou, melhor dizendo, para ‘’a ACT ver’’.

Está na hora de as empresas transformarem as obrigações em oportunidades, adotando soluções de compliance laboral e tecnológico como uma aposta win-win.