Recentemente, o país ficou a saber que “até 2030 mais de metade dos professores vão reformar-se”. Como em tantas áreas da nossa sociedade, confrontados com um facto temos duas opções: ver no facto um problema ou encontrar uma oportunidade. Estamos perante uma grande oportunidade.

Os dados da aposentação de professores resultam de um estudo do Conselho Nacional de Educação (CNE), “Regime de seleção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e ensinos básico e secundário”, apresentado recentemente no Parlamento: cerca 52 mil professores – num total de 90 mil – poderão reformar-se nos próximos 10 anos. Ou seja, mais de 57% dos professores atuais já não estarão a lecionar a partir de 2030. Só no Pré-Escolar, os dados apontam para 73% de saídas por aposentação.

Os professores são fundamentais numa sociedade desenvolvida, apostada em aumentar as qualificações das novas gerações. São imprescindíveis, e a sua motivação, vontade e dedicação aos alunos será ainda mais importante num contexto crescente de digitalização, de tecnologização, robotização, inteligência artificial e da necessidade pedagógica de adaptar as escolas aos desafios de um mundo em mudança. Tal exigirá dos professores constante formação, adaptação e aprendizagem.

Ora, o mesmo estudo do CNE revela que a atratividade da profissão está a diminuir: “em termos de oferta e procura de cursos de mestrado nas áreas de formação para a docência, (…) assinala-se uma descida progressiva. Em termos de alunos inscritos, registou-se uma diminuição de cerca de 50% entre 2011/2012 e 2017/2018.” Associado a este fator, a realidade indica-nos também que hoje os melhores alunos não desejam ser professores.

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Eis a situação dos próximos anos: muitos professores a saírem, poucos a entrarem. Chegamos à grande oportunidade. A formação e a seleção serão elementos cruciais nas escolhas educativas dos próximos anos.

A formação dada aos professores deve considerar os tais novos desafios referidos acima, porque a escola em 2030 será substancialmente diferente face ao que é hoje, acompanhando a natural evolução da sociedade. O desenvolvimento profissional contínuo deve ser valorizado no sistema educativo, tal como acontece em vários países europeus. Devemos orientar as promoções e a progressão salarial com a participação dos professores em atividades regulares de formação e desenvolvimento contínuo. A valorização da profissão e do papel dos professores, com vista ao aumento da atratividade da carreira docente, deve nortear este esforço necessário para reforçar a formação.

No âmbito da seleção, os dados das saídas dos próximos anos devem fazer-nos equacionar rever o modelo de recrutamento de professores. A Presidente do CNE, Maria Emília Brederode dos Santos, afirmou no Parlamento – aquando da apresentação do estudo – que o atual modelo, sendo “transparente”, “não tem em conta a formação contínua, a qualidade e diversidade da experiência dos candidatos nem responde às necessidades das escolas com projetos singulares”.

O modelo de recrutamento de professores em Portugal não tem sofrido alterações significativas ao longo do tempo, sendo que o sistema se baseia em concursos nacionais centralizados. No mesmo estudo, o CNE destaca que o modelo atual “não valoriza as experiências profissionais dos candidato”, “cria uma enorme mobilidade com prejuízo para os docentes e para o trabalho das escolas, sobretudo para as que se situam em zonas mais sensíveis onde a estabilidade do corpo docente é fundamental para o desenvolvimento dos projetos educativos e para a criação de uma cultura de escola.”

O estudo, que contou com uma comparação internacional, revela ainda que “o método predominante e utilizado na grande maioria dos países europeus é o recrutamento aberto, competindo às escolas ou às autoridades locais, ficando os docentes afetos à escola caso a sua candidatura seja aprovada”. De igual forma, é também de destacar a necessidade de Portugal acompanhar as dinâmicas na procura e oferta de professores, planeando a médio-longo prazo as necessidades presentes e futuras.

É desta análise que surge a grande oportunidade de rever o atual modelo de seleção, sendo que não necessitamos de inventar a roda, visto que o CNE apontou cenários alternativos: um “cenário B”, onde se procura uma “maior aproximação ao contexto em que os candidatos poderão vir a exercer funções, uma vez que o recrutamento seria feito a nível municipal” e um “cenário C”, com a “seleção dos candidatos ao nível do agrupamento/escola, com recurso a instrumentos e critérios diversificados, de modo a contratar os que melhor se adequem ao contexto e ao projeto educativo que se pretende desenvolver”.

O caminho e os estudos estão feitos. Acredito que chegou a hora de confiar e descentralizar a decisão de recrutamento de professores, revendo o atual modelo centralista, cada vez mais ultrapassado. Devemos adotar um modelo reformista, que considere o mérito e as competências dos professores, as necessidades dos projetos educativos, as características de cada município/ região e a estabilidade do corpo docente, procurando assim valorizar a carreira de professor e melhorar a aprendizagem das novas gerações.

Deputado do PSD na Comissão parlamentar de Educação, Ciência, Juventude e Desporto
‘Caderno de Apontamentos’ é uma coluna que discute temas relacionados com a Educação, através de um autor convidado.