Enquanto assistia às comemorações do 80.º aniversário do Dia D, na Normandia, olhei para aqueles veteranos sobreviventes do desembarque, aqueles nonagenários e centenários sentados em cadeiras de rodas, e não pude deixar de sentir um grande desprezo por esses homens. Não nos podemos esquecer que é gente que saiu de barcos aos tiros, sem sequer um “mãos ao ar!” de aviso. No dia 6 de Junho de 1944, os Aliados, em vez de quererem a paz, optaram pela guerra. Tive pena que os nossos militantes pela paz estivessem ocupados com a campanha das Europeias, caso contrário tenho a certeza que haveria uma comitiva do PCP e do Bloco de Esquerda a grandolar as cerimónias com exigências de “paz em vez de guerra”. O que aqueles velhinhos mereciam era uma reprimenda de João Oliveira e de Catarina Martins a explicar porque é que, quando um tirano ocupa uma terra que não é a dele, em vez de resistirmos devemos amochar. Contrapor com a paz, portanto. Claro que os idosos não iam querer ouvir. Muitos desligariam os aparelhos. Mas retiravam-se os andarilhos e trancavam-se as rodas das cadeiras, para não poderem fugir ao sermão.

A 2.a Guerra Mundial continua a ser o conflito mais sangrento da história da humanidade. Devemo-lo à obstinação dos Aliados, que preferiram a birra ao apaziguamento. Se tivessem ficado sossegados, não tinha morrido ninguém. Quase ninguém. Ninguém muito importante. Egoisticamente, preferiram dar largas ao instinto agressivo, em vez de aceitarem a pacatez do 3.º Reich.

No início, a URSS esteve bem, ao assinar o pacto Ribbentrop-Molotov, aplacando os nazis e evitando o derramamento de sangue. Mas depois, provavelmente por falta de coluna vertebral, desconcentrou-se e perdeu o caminho da paz.

Não é coincidência que este amor ao apaziguamento coexista com a época em que se equivalem palavras ofensivas a agressões. Efectivamente, se um murro é igual a um insulto, aos tiros nazis não era obrigatório responder também com tiros. Bastavam umas palavras duras na altura certa. Podia-se perfeitamente ter replicado com um palavrão bem metido, uma obscenidade sobre a mãe de Gobbels ou uma piada maldosa a propósito da falta de jeito de Hitler para a pintura. Daquelas mesmo rasgadinhas, que magoam e deixam marca.

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Até se podia ter seguido com o dia D, mas em vez de saírem aos tiros, os militares desembarcavam a fazer manguitos e a proferir impropérios, como se fossem clientes de um cruzeiro muito irritados com o serviço. O efeito teria sido o mesmo e ninguém se aleijava.

Felizmente, a noite eleitoral de Domingo trouxe excelentes notícias. Catarina Martins e João Oliveira foram eleitos deputados ao Parlamento Europeu. Portugal manterá assim uma presença no movimento anti-guerra, continuando a ajudar Putin na sua luta pela pacificação da Europa de leste.

Naquela fatídica manhã de Junho de 1944, fizeram falta pessoas como Catarina Martins e João Oliveira, para se porem nos Canal da Mancha aos berros, exigindo que os soldados saíssem da água, quais nadadores-salvadores de tiranias. É curioso que, para quem costuma insurgir-se contra o termo “colaborador”, convivem bem com serem colaboracionistas. Os meus parabéns aos novos eurodeputados. Não deve ter sido fácil fazer centenas de quilómetros na campanha com o rabo entre as pernas.