Tem-se acusado António Costa de fomentar o crescimento do Chega. Segundo os críticos, por cálculo político, ao Primeiro-Ministro interessa fazer crescer o partido de André Ventura para retirar espaço de manobra ao PSD. É uma acusação disparatada. António Costa não só não promove a extrema-direita, como a combate acirradamente. Toda a gente sabe que uma das características do fascismo é manter os comboios a funcionar e a cumprir horários e o Governo de Costa, impecavelmente anti-fascista, mantém a ferrovia no estado que vemos. Mais anti-fascista do que isto só se Costa fosse à noite desmontar carris e rebentar com catenárias.

A relação do Governo com os caminhos-de-ferro é tal que o Ministro das Infraestruturas já é considerado o novo Fontes Pereira de Melo. Como durante Fontismo, as locomotivas de agora pintam a paisagem com o seu fumo. Só que desta vez não é causado pela queima de carvão na fornalha, é produzido pela evaporação do suor dos passageiros prensados uns contra os outros como páginas de um livro em casa de um analfabeto. No século XIX, os comboios faziam “pouca terra, pouca terra”. Hoje, modernizados, conseguem articular “pouca hipótese de chegar à terra, pouca hipótese de chegar à terra”. Enquanto o primeiro Fontes é lembrado pela viagem do comboio que foi de Lisboa ao Carregado, Galamba ficará na história pelas viagens em que o comboio sai de Lisboa, carregado.

Se bem que há algum exagero na forma como está a ser contada a história do comboio da linha de Sintra que foi parado pelos passageiros. As imagens são impressionantes, mas enganadoras. Se as carruagens estavam assim tão cheias, como é que alguém conseguiu afastar o braço do corpo, levantá-lo, alcançar o travão de emergência e puxá-lo? É evidente que não estava assim tãããão a abarrotar.

Além de que, se há coisa com que este Governo não brinca é com a sobrelotação. Não se julgue que o Governo compactua com sobrelotação. Nem pensar. Tanto que até vai obrigar os senhorios a realojarem inquilinos quando a casa estiver cheia. A sorte da CP é que quem aplica esta lei são os municípios e, como os comboios da Linha de Sintra passam por Lisboa, Amadora e Sintra, para alguém maçar a CP é preciso primeiro que as câmaras se entendam.

Custa ver que as pessoas prefiram realçar os aspectos negativos da sobrelotação dos comboios, em vez de destacarem também o lado positivo. Numa altura em que Portugal enfrenta o inverno demográfico, com o envelhecimento da população e tudo que isso traz, há que saudar a iniciativa da CP de apoio à natalidade. Nos seus comboios, os utentes viajam tão apertadinhos que é costume algumas passageiras engravidarem. Na Linha de Sintra, a curva pronunciada no troço entre Massamá e Agualva-Cacém já é conhecida como o Crescente Fértil. O declive, conjugado com a trepidação, propicia as condições óptimas para a concepção. Há laboratórios de fecundação in vitro que mandam os seus peritos aprenderem a técnica com os maquinistas. Os comboios da CP parecem aqueles em miniatura que se usam nas decorações de Natal. São pequenos de mais para acomodar os passageiros. A única vantagem é que montar dá muito menos trabalho. Basta uma travagem brusca e, pumba!, está feito. Com o Governo PS, o utente do comboio não só tem acesso ao passe mais barato, mas também à casa de passe mais barata.

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