Ao contrário do que é comum assumir, as doenças de comportamento alimentar, não são provocadas por uma preocupação com a obtenção de um corpo perfeito.
As Doenças do Comportamento Alimentar refletem a confluência de determinantes biológicos, socioculturais e psicológicos que definem a vulnerabilidade ou predisposição para o seu desenvolvimento, os fatores precipitantes e ainda as condições que perpetuam a manutenção destes distúrbios.
Para conseguir um plano eficaz de tratamento, é necessário compreender quais são as determinantes que levaram ao desenvolvimento da doença, definindo a sequência de intervenções ou a sua combinação e adaptá-las a cada doente no seu contexto. A planificação do tratamento a propor depende da avaliação do risco a curto e médio prazo, que envolve a condição física, o estado nutricional e a avaliação psicológica e cognitiva (a desnutrição pode levar a um quadro confusional que limita a capacidade de integrar a informação, bem como outras patologias psíquicas, por exemplo depressão ou perturbação de pânico associadas). A avaliação do risco a longo prazo deve dirigir-se ao índice de massa corporal atingido e à duração da sua instalação nos limites de risco somático.
Durante a pandemia de Covid que levou ao isolamento das famílias em casa, houve um aumento significativo de novos casos destas doenças, tanto em crianças como em adolescentes e adultos. As principais causas que espoletaram estes distúrbios, nos que já tinham predisposição para os desenvolver, foram a insegurança e incerteza no que respeita à autoestima e autoconceito e o enfraquecimento das relações interpessoais.
O tratamento da Anorexia Nervosa implica sempre uma abordagem multidisciplinar, conduzida por um médico psiquiatra e com a colaboração da família em todo o processo. O tratamento médico é dirigido à recuperação física e nutricional, mas acompanhado ao mesmo tempo de estabilização emocional, redução da resistência à mudança e reequilíbrio psicológico. Mental e emocionalmente, estes doentes estão focados no medo e na desconfiança. A intervenção psicológica deve ser articulada com o plano proposto pelo médico e acordado com a família.
Para a Bulimia Nervosa e Perturbação da Ingestão Compulsiva o tratamento deve incluir a abordagem psicológica e a modificação dos comportamentos alimentares e relacionais. Nestas patologias, que normalmente têm um longo período de evolução antes da procura de tratamento, coexiste uma desregulação do humor e um elevado nível de ansiedade, que se foram agravando com a evolução do comportamento alimentar, necessitando de uma medicação para diminuir e controlar os níveis de stress. Também nestas patologias, e particularmente em idades jovens, é muito importante introduzir a família no processo de tratamento, como um aliado da intervenção global.
O Internamento para doenças do Comportamento Alimentar deve reservar-se às situações de marcada gravidade somática, que não respondam ao tratamento ambulatório. Nestes casos, o internamento deve ser tão curto quanto possível para que a vida social e familiar seja retomada sem longas interrupções.
Para obviar o afastamento da família e da relação interpares, pode ser útil um internamento parcial em Hospital de Dia, onde os utentes passam algumas horas do dia com diversas atividades terapêuticas, orientadas no sentido de melhorar os hábitos alimentares e planear novos objetivos de vida, deixando de viver focados exclusivamente no controlo alimentar.
Em qualquer das situações, ambulatório ou internamento, o tratamento das Doenças do Comportamento Alimentar deve ser orientado numa perspetiva multidimensional, por profissionais de saúde com experiência no tratamento destas doenças, acionando uma matriz multidisciplinar que ponha em diálogo e colaboração as diversas disciplinas necessárias para fazer face à perturbação, nas suas vertentes biológica-psicológica-social.
Neste contexto, o novo Hospital de Dia para doenças do comportamento alimentar da clínica psiquiátrica de São José das Irmãs Hospitaleiras é um contributo indispensável para o acompanhamento e tratamento destas doenças que atormentam neste momento muitas famílias, oferecendo uma resposta adequada e com maior probabilidade de sucesso terapêutico.