O Professor Rebelo de Sousa é uma pessoa reconhecidamente inteligente e independente, tendo sido eleito e reeleito confortavelmente e sendo, passados quase oito anos da sua eleição, extremamente popular. Todavia, a sua profunda experiência política não o impediu de cometer erros crassos que em muito prejudicaram Portugal.

O seu primeiro erro constitui em não exigir acordo escrito entre os partidos da esquerda parlamentar para suportar o governo minoritário do partido socialista, na sequência da eleição legislativa de 2019. Ao contrário do seu antecessor, professor Cavaco Silva, que havia exigido tal documento para empossar o governo PS, na sequência das eleições de 2015, ganhas pela coligação PSD/CDS, mas nas quais a esquerda granjeou uma maioria parlamentar. Tal documento contribuiu indubitavelmente para garantir condições de estabilidade, tendo sido o segundo governo minoritário a cumprir uma legislatura, depois do governo PS de Guterres, à época apoiado parlamentarmente pelo PSD do professor Rebelo de Sousa, curiosamente. Os acordos celebrados comprometeram os partidos de extrema-esquerda (PCP, BE e Verdes) com a solução governativa encontrada e aclararam que pontos fundamentais, como a pertença à NATO, UE e Zona Euro não seriam colocadas em causa. Infelizmente, como é sabido, em 2019 o BE demarcou-se do governo PS, que passou a contar apenas com apoio parlamentar do PCP e Verdes, que viriam a votar contra o OE 2022, dando origem à interrupção da legislatura.

O seu segundo erro esteve associado ao primeiro, ao ter pré-anunciado, em finais de 2021, a dissolução do parlamento em caso de chumbo do OE, por um lado interferindo nas opções políticas dos partidos tentando chantagear o PCP, e por outro, dando a um partido extremista o privilégio de desencadear o processo de dissolução parlamentar. Possibilidade que o mesmo não enjeitou.

O seu terceiro erro está, por sua vez, associado ao segundo, pois num momento em que o líder da oposição era Rui Rio, que sempre se tinha afirmado disponível para acordos e compromissos com o PS com vista à reforma de setores essenciais do país, é incompreensível como o Presidente da República veio a optar por dissolver o parlamento. Ao invés, o Presidente da República poderia e deveria ter colocado o ónus do lado do governo no sentido de este negociar um orçamento com o PSD. Caso o mesmo não o quisesse, recairia sobre o governo PS o peso de desencadear uma crise política, e não na Presidência, que o fez, portanto, de modo extemporâneo.

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O seu quarto erro ocorreu por altura da tomada de posse do governo maioritário do PS, em início de 2022, quando garantiu que em caso de saída do Primeiro-ministro António Costa iria convocar eleições antecipadas, dissolvendo novamente o parlamento. Foi a segunda vez que o Presidente da República pré-anunciou uma dissolução, desta vez para chantagear o PS em vez do PCP. Mas, pior do que isso, foi que essa frase o perseguiu e contribuiria para condicionar fortemente a sua atuação como primeiro magistrado da nação aquando da recente crise política, desencadeada pela demissão do ainda Primeiro-ministro António Costa. Foi, porventura, o erro com menos consequências, mas que condicionou desnecessariamente a sua ação.

Finalmente, o seu último erro até ao momento, constituiu em, havendo marcado as eleições para quatro meses depois da crise que foi desencadeada dia 7 de novembro, ter optado por manter o Primeiro-ministro em funções, com manifestos danos para a credibilidade das instituições, por mais 5 longos meses. Teria sido natural e preferível que António Costa saísse no imediato e fosse substituído pela número dois do governo, Mariana Vieira da Silva no período que medeia até a tomada de posse do futuro governo, nunca antes de Abril/2024. Assim não sendo, o desgaste e desprestigio institucional prossegue, assim como esta triste disputa entre poder executivo e judicial.

Para agravar o assunto, o Presidente adiou a dissolução do parlamento até à aprovação final do OE 2024, situação que, como se viu na revogação do aumento do IUC previsto, dá ao PS a possibilidade de tomar medidas eleitoralistas e desvirtuar o OE, nomeadamente colocando em causa importantes metas orçamentais em tempo de elevada incerteza económica. Recorde-se que existe uma possibilidade real da economia entrar em recessão técnica até ao fim do ano, depois da recessão verificada no terceiro trimestre do ano corrente.

A recente crise política e crise de confiança nas instituições que protagonizam os poderes executivo, legislativo e judicial vieram, por um lado, ilustrar as virtudes do nosso sistema semipresidencialista e da importância do equilíbrio de poderes, e por outro, colocar aquele que se perspetivava como o primeiro Presidente de terceira República a interagir com apenas um Primeiro-ministro, como a principal figura do regime. A comemoração dos 50 anos deste regime poderá corresponder ao período mais lúgubre desde a revolução de 25 de abril de 1974, com a incerteza e extremar de posições que se perspetiva no período eleitoral vindouro. Aquele que se quis afirmar como o grande descrispador, poderá deixar a presidência com um parlamento balcanizado e partidos extremistas novamente com influência governativa, e um centro político mais crispado que nunca.

O atual Presidente da República, quiçá o mais consensual do Portugal democrático, teve uma atuação danosa nas principais decisões que teve de tomar ao longo do mandato e meio que cumpriu. Esperemos que tenha conseguido refletir para não os repetir e que os aspirantes ao cargo aprendam também para não se repetirem os erros pretéritos.

Esperemos que consiga arrepiar caminho, no meio mandato que tem pela frente e possa contribuir para a regeneração e renovação do regime, prestigiando assim as instituições e só assim reganhando a confiança dos portugueses. Nem tudo depende da sua ação, mas o exemplo vem de cima, no discurso e na ação.