Questionado sobre o questionário de Tancos, o dr. Costa foi claríssimo: “Quando responder, responderei ó meu, óoo, óoo, ó tribunal e nó xhos jornalistas porque eu falo com as inxtuições e não com a comunicação sucinã, instexinã, eh social sobre temas que são inepegh, suitamente, xidamente sobre questões judiciais”. Depois o dr. Costa ficou de trombas e voltou-se para o outro lado da sala, à espera de merecidos louvores.

O minúsculo episódio permite, como dizem as “personalidades” da televisão, várias leituras. A saber: 1) o dr. Costa não sabe falar português; 2) o dr. Costa não sabe português; 3) apesar da boçalidade gritante, fruto de uma vida exclusivamente dedicada à baixa intriga partidária, o dr. Costa lá arranjou maneira de chegar a primeiro-ministro; 4) ao contrário da vasta maioria dos seus compatriotas, o dr. Costa teve sorte ao nascer neste cantinho rústico e não num país a sério; 5) num país a sério, o dr. Costa teria dificuldade em vender couratos ou cachecóis à porta de um estádio; 6) os péssimos modos do dr. Costa para com os jornalistas são castigo insuficiente face à vassalagem da “classe” para com a sua desinteressantíssima pessoa; 7) a mera existência da pergunta em causa sugere que a domesticação dos “media” ainda não atingiu uma dimensão compatível com a ética humanista e republicana que orienta o PS e, logo, nos deve orientar a todos; 8) não prevejo um futuro profissional risonho à repórter que fez a pergunta; 9) o dr. Costa possui a impaciência dos régulos pequenitos, cuja prepotência varia de forma directamente proporcional à ignorância; 10) em vez de disfarçada, a impaciência dos régulos deve ser ostentada para inspirar o medo dos cépticos e reforçar o respeito dos lacaios; 11) o dr. Costa não “falou com as inxtuições”; 12) à semelhança do presidente da República, o dr. Costa fintou o dever do confronto directo com o juiz Carlos Alexandre e pediu à criadagem, paga por nós, que respondesse ao questionário por escrito; 13) se o dr. Costa falasse com as instituições, também seria provável que as instituições não percebessem uma palavra; 14) o dr. Costa mandou publicar as respostas ao questionário no “site” do governo, porque genuinamente julga que aquilo é dele, porque não tem qualquer respeito pelo segredo de justiça e porque não possui nenhuma noção de decência; 15) tamanha exibição de arrogância explica o empenho para enxotar Joana Marques Vidal na Procuradoria-geral da República, jovial artimanha que contou com o empenho do popular prof. Marcelo; 16) a propósito de Tancos e da dispensa do primeiro-ministro e do presidente das maçadas de um interrogatório a sério, a actual, e conveniente, sra. procuradora anunciou que “a subordinação hierárquica dos magistrados do Ministério Público foi consagrada na Constituição da República Portuguesa logo em 1976” e “manifesta-se na exclusiva sujeição dos magistrados do Ministério Público às diretivas, ordens e instruções previstas no seu estatuto”; 17) removido o entulho lexical, apura-se assaz simplesmente que os procuradores passam a fazer o que a sra. procuradora mandar, que será o que a mandarem fazer; 18) ao contrário do que li por aí, isto não significa que acabaram as investigações a políticos, e sim que as investigações ficam restritas aos políticos que o poder quiser investigar; 19) para enfeitar o panorama, a ordem é manter secretas, e sem rasto, as decisões acerca das investigações impedidas de avançar; 20) houve quem dissesse que a magistratura, transformada em bonequinhos amestrados, acabou de morrer; 21) em compensação, nasceu, arrancada a Ferros, Van Dunems, Costas, Marcelos et al, uma fofura grotesca chamada impunidade dos poderosos; 22) a impunidade não é nova, nova é a sua consagração oficial; 23) os optimistas imaginaram que a “geringonça” era apenas uma golpada para tomar de assalto uma ou duas legislaturas; 24) os realistas, raros e alvo de enxovalho público, perceberam que era uma golpada para tomar de assalto o Estado e o país, isto se as instâncias se distinguirem; 25) o PS já tinha sob a sua feia pata a quase totalidade dos “media”, a parte que interessa do famoso “empresariado”, a banca, o universo sindical e a generalidade dos partidos, que aproveitaram a votação do Orçamento para reconfirmar a sua imensa utilidade; 26) agora, perante curiosa indiferença, o PS subjugou o pouco que restava da Justiça; 27) isto, aliado à doçura do povo, permite tudo: primeiros-ministros que reagem a incómodos com asco ou sopapos, ministros que anseiam por pandemias para estimular as exportações de bifanas, ex-ministros que vêem fitas de Hollywood para decifrar fraudes que ocultam mal e porcamente, autarcas que obrigam ao registo das visitas recebidas pelos munícipes, e o muito de que não nos lembramos, que este quadro de demência e chacota não lembra a ninguém; 28) a única coisa que isto não permite é achar que habitamos um pedacinho do mundo civilizado; 29) se é discutível estarmos entregues a atrasados mentais, é garantido tratar-se de gente alucinada e daninha; 30) em finais de 2015, Portugal apressou o passo rumo a um lugar sombrio; 31) está cada vez mais escuro.

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