Do meu exílio liberal em Londres (é bom viver num país onde ninguém – ninguém mesmo – confunde liberalism com fascism), olho com surpresa, por vezes com perplexidade, o debate político em Portugal. Em parte, a perplexidade resulta da irresponsabilidade e ligeireza com que se discute assuntos muito sérios para o futuro dos portugueses. Há, aliás, um fenómeno extraordinário em Portugal. A irresponsabilidade aumenta com a idade, nalguns casos consideravelmente.

Qualquer pessoa sensata pensaria que a idade traz responsabilidade. E de facto assim acontece na maioria dos países e das profissões. Mas não entre a classe política portuguesa (havendo no entanto, nobres excepções). A antiga responsável pelas finanças, Manuela Ferreira Leite, depois de ter imposto austeridade aos portugueses durante dois anos como ministra, esperou pela idade da reforma para assinar um manifesto com o antigo líder do Bloco de Esquerda. Um antigo Presidente da República, Mário Soares, e um antigo líder do CDS, ex-candidato presidencial da direita, antigo ministro socialista e orador em manifestações da extrema-esquerda, Freitas do Amaral, continuam a competir um com o outro, desta vez para ver quem consegue ser mais irresponsável. O tema que agora excita os nossos queridos “senadores” é eleições antecipadas. Será que já pensaram cinco minutos sobre as consequências de eleições antecipadas para Portugal? Duvido. Ou se já o fizeram, estão-se completamente nas tintas para o interesse dos portugueses (o que não se deve excluir).

Eleições antecipadas significaria uma de duas coisas (ou possivelmente as duas). Os juros dos nossos empréstimos nos mercados aumentariam imediatamente, com o espectro de um novo programa e do regresso da “troika” a pairar de novo sobre os portugueses. Por outro lado, o PS teria imediatamente que dar garantias de que se chegasse ao governo faria quase tudo ao contrário do que o seu líder tem dito. Se fosse necessário, o lider do SPD alemão e vice-chanceler da Alemanha, explicava a Seguro o que ele poderia e não poderia fazer como futuro primeiro-ministro, se quisesse que Portugal continuasse no Euro. Acabaria, subitamente, o tempo das promessas fáceis e impossíveis de cumprir. Talvez haja alguém no PS capaz de explicar ao líder do partido porque razão não é do seu interesse, nem de Portugal, pedir eleições antecipadas.

Mas, no caso dos dois “senadores” (os quais se esforçam quase todos os dias para demonstrar como seria uma péssima ideia criar um Senado em Portugal) há ainda mais um ponto interessante a referir. O apelo permanente à queda do governo e a eleições antecipadas significa um convite à violação mais descarada que se poderia imaginar da Constituição portuguesa. Um dos princípios elementares da nossa Constituição é o cumprimento integral da legislação por parte Assembleia e do governo apoiado pela maioria dos deputados. A soberba dos nossos “senadores” leva-os a colocarem as suas vontades e os seus desejos pessoais à frente dos princípios constitucionais do nosso país e dos interesses dos portugueses. Aqui, já não se trata de irresponsabilidade, mas simplesmente de arrogância e de falta de respeito pela democracia.

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