Recentemente, a possibilidade de se proibir o uso de telemóveis nas escolas voltou ao debate público. A proposta, justificada como uma forma de proteger os alunos, melhorar a concentração e o desempenho académico destes, poderá parecer à primeira vista sensata e alinhada com o objetivo de criar um ambiente mais propício à aprendizagem. No entanto, ao analisarmos com maior profundidade, torna-se legítimo questionar: até que ponto, tal proibição serve realmente os interesses dos alunos? Será que estamos a caminhar para uma solução eficaz ou, pelo contrário, estamos a abrir caminho para uma abordagem paternalista, a qual poderá ter consequências a longo prazo?

O argumento de “proibir para o bem dos alunos” levanta questões preocupantes. Embora as intenções possam parecer nobres e baseadas numa preocupação legítima com o bem-estar/sucesso daqueles, há um perigo inerente em medidas que limitam a liberdade de escolha e autonomia, especialmente quando são impostas por quem se coloca numa posição de autoridade moral, agindo como se fosse “dono da verdade” sobre o que é “correto” ou “melhor” para os outros.

Por um lado, ao proibir o uso de telemóveis na escola, estamos a enviar uma mensagem clara e preocupante: os alunos, considerados incapazes de fazer escolhas responsáveis por si mesmos, necessitam de intervenção externa para o seu próprio bem-estar. Em vez de se promover a responsabilidade e o autocontrolo, opta-se por um caminho mais simples e imediato – a proibição. Esta linha de pensamento, não só desvaloriza a capacidade crítica dos jovens, como desconsidera determinadas valências do processo educativo, além de poder, lentamente, contribuir para uma erosão das liberdades individuais.

Por outro lado, ao proibir o uso de telemóveis nas escolas, estamos a restringir o acesso dos alunos a ferramentas digitais, as quais poderiam enriquecer a sua aprendizagem e promover o desenvolvimento de competências essenciais. Ao mesmo tempo, reforçamos a perceção de que este dispositivo é apenas uma fonte de distração e lazer, quando, na realidade, pode abrir portas a uma vasta gama de recursos educativos. A escola não pode continuar refém do manual escolar – ou será esse um dos objetivos!? Aceder a aplicações educativas, vídeos didáticos, plataformas colaborativas, simulações interativas e recursos de realidade aumentada são apenas alguns exemplos, de como essa tecnologia pode ser usada para potenciar o ensino.

A experiência de países como a Itália (estávamos em 2007), que implementou uma proibição parcial de telemóveis nas escolas, mostra-nos que estas medidas, embora eficazes no curto prazo, não abordam a raiz do problema: a necessidade de educar para o uso consciente da tecnologia. A solução não deve passar por retirar os telemóveis das mãos dos alunos, mas sim por ensinar os mesmos a utilizá-los de forma responsável e produtiva – talvez devêssemos olhar para a educação como uma das “chaves” para resolver esta questão. O que fez a escola nesse sentido, até ao momento? Seguramente, muito pouco ou nada. A verdade é que, em muitos casos, a escola não tem implementado medidas suficientemente eficazes para orientar ou desencorajar o uso excessivo e inadequado dos telemóveis. Isto requer um esforço conjunto de todos os envolvidos no processo – alunos, encarregados de educação, professores, entre outros – para criar um ambiente, no qual a tecnologia seja vista como uma aliada e não como um inimigo. O telemóvel, quando utilizado corretamente, pode ser um poderoso instrumento pedagógico. Atualmente, a tecnologia está intrinsecamente ligada ao quotidiano e criar barreiras para afastar os alunos desse universo digital, pode acabar por ser contraproducente.

A abordagem paternalista, que procura resolver problemas impondo restrições, pode ter implicações mais amplas. Hoje, são os telemóveis, amanhã, por exemplo, poderão ser determinados conteúdos da internet… Se começarmos a aceitar proibições com base na ideia de que “é para o nosso bem”, onde traçamos a linha do limite? Esta lógica pode ser facilmente aplicada a outras áreas da vida, resultando numa sociedade na qual as escolhas individuais são constantemente limitadas, sob o pretexto de que é necessário proteger os cidadãos de si próprios. É esse o caminho que queremos? Ou será este mais um indicador da erosão da democracia?

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