Ao considerar a liberdade de expressão como o pilar fundamental de uma sociedade verdadeiramente livre, habituámo-nos a tomar como garantido este direito e ignoramos os ataques que nos são feitos quando partilhamos a nossa opinião.

Instalou-se no país e em boa parte do mundo ocidental uma ideia de que existe uma ortodoxia dominante e que quem está contra, está errado. Seja do cariz político que for, existe uma constante imposição ao outro, e, em vez da promoção do diálogo e do compromisso, opta-se pela disrupção radical violenta e barulhenta.

Este fenómeno ignora os perigos inerentes à aceitação cega da ortodoxia assim como do seu anti-racionalismo. Ver partidos com assento parlamentar como eternos detentores da verdade e salvadores da pátria é, na sua ignorância, de uma arrogância desmedida. O que é assustador em alguns deputados é o seu analfabetismo funcional. Pessoas sem papas na língua, mas de uma ignorância desoladora. Vigaristas que misturam alhos com bugalhos, voltam atrás com a palavra e têm dois pesos e duas medidas.

Considero que, numa sociedade matura, o direito à ofensa é fundamental. A liberdade de expressão deve incluir o direito à ofensa pois uma sociedade onde não se pode ofender não é verdadeiramente livre. A liberdade de criticar, satirizar e fazer troça é essencial porque desafia a complacência e a ortodoxia dominante. Como disse Voltaire, “Posso não concordar com o que dizes, mas defenderei até à morte o teu direito a dizê-lo.” Esta máxima destaca a importância de defender o direito de todos à expressão, mesmo quando essa expressão é ofensiva ou discordante. Mesmo quando não gostamos.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Muitos políticos já se recusam a comentar o dia a dia, dado o barulho. Outros tantos, comentadores querem ser políticos e o comentário de TV ou rádio serve apenas de trampolim. Mas afinal, quem os censura, depois do nosso próprio Presidente ter dado o mesmo salto? É o circo político e a sua personificação. Escasseiam os comentadores independentes e neutros. Os livres. Os totalmente isentos, mesmo que assumam uma posição.

Assistir a partidos políticos que têm institucionalizados os seus membros e simpatizantes é simplesmente deprimente. Através de um ruído incessante nas redes sociais, caixas de comentários e na TV em modo fastfood da política, criticar a ortodoxia dominante passou a ser levado como uma crítica pessoal e não interessa o que se diga, se é contra o partido, está errado.

O emblema dos regimes totalitários e o inimigo do progresso, é a meu ver, a censura. A censura leva à opressão e estagnação de um povo e de uma sociedade. As tentativas governamentais ou sociais de silenciar ou canalizar o discurso numa determinada direcção, não são mais que um caminho para o autoritarismo e supressão da dissidência. Seja sensibilidade religiosa, sexual ou política, tudo está em risco quando temos censura.

Orwell, em “1984”, ilustrou vividamente como a censura e a manipulação da linguagem podem ser usadas para controlar a sociedade. O controlo da expressão é, em última análise, um controle do pensamento. É a doutrina e, essa, nunca é Liberdade.

Todas as opiniões, independentemente do quão impopulares ou controversas são, devem ser livremente trocadas e debatidas mas, isto não quer dizer que o devam ser de qualquer maneira. A verdade emerge do confronto de ideias e proteger o individuo de pontos de vista ofensivos ou desafiadores só enfraquece a sociedade. O debate, é a melhor defesa contra ideias com quais não concordamos e o progresso intelectual e moral da sociedade está na defesa da tolerância, no diálogo aberto e na capacidade da razão para triunfar sobre o dogma.

O politicamente correcto é uma forma de autocensura e cobardia intelectual. Sufoca o diálogo e impõe uma conformidade insípida e estéril. A proteção contra discursos ofensivos infantiliza os adultos e se não concordamos com uma ideia devemos confronta-la com factos e evidências. A pressão do conformismo não leva a mais que a erosão da verdade e da liberdade.

É importante pensar diferente e principalmente não ter medo da exposição, o que é muito usual no nosso país. Combater a ortodoxia dominante e o pensamento único é, em si mesmo, uma forma de cidadania.

A dissidência, não tem cor política e não é apenas um direito, mas um dever. Acredito que é através do inconformismo e da disposição para falar, que conseguimos impulsionar o progresso social. Desafiar a autoridade e questionar a opinião recebida são essenciais para a saúde de um povo.

Porém, e é importante este ultimo ponto, liberdade não existe sem responsabilidade. A defesa da liberdade absoluta de expressão, tem de ser acompanhada necessariamente pela responsabilidade e pela forma dessa comunicação. Ruído não é liberdade de expressão. Discursos que incitem à violência ou ao ódio de qualquer tipo, não são liberdade de expressão. Insultos não são liberdade de expressão.

A melhor maneira de combater estes discursos sectários não é através de proibições, mas sim através de mais discursos. Através do contraditório racional. Acredito profundamente no poder da razão e da persuasão para neutralizar ideias prejudiciais à sociedade.

No fundo, a liberdade de expressão é um chamado à coragem, enquanto direito fundamental. A coragem de falar, ouvir, desafiar e pensar livremente mas com respeito pelo outro, olhos nos olhos e sem recurso ao insulto.

Concordar cegamente com a ortodoxia, não tendo sequer noção do que se está a seguir é um perigo real. É o perigo dos carneiros políticos que já assolou o mundo e a Europa em especifico. Convém não repetir o erro.