O debate recente na Assembleia da República sobre o Estado da Nação foi realizado com os habituais critérios de luta partidária e com os resultados habituais. Ou seja, o debate passou ao lado da real situação do País e das grandes opções que poderiam alterar a degradação do nível de vida português relativamente a outros povos e nações. Desde logo porque os partidos não se entendem quanto aos remédios e, em qualquer caso, atiram em todas as direcções perdendo o foco necessário para a mudança.

Foi há muitos anos que estudei o caso da Irlanda, cujo resultado previ num congresso do PS de que Irlanda iria ser um caso de sucesso na União Europeia, o que hoje já ninguém contesta, apesar da maioria dos políticos se recusar a analisar as causas. Nos últimos anos interessei-me pelos casos de Singapura e da Coreia, na tentativa de tentar compreender quais foram os factores de sucesso, algo diferentes de caso para caso, mas sempre com base em duas ou três razões e nunca através de miríades de soluções como tem sido tentado no caso português, seja no PRR, seja nas 60 medidas do presente ministro da Economia.

Por aquilo que aprendi ao longo dos anos e pela avaliação que faço, posso agora garantir aos leitores que a nova experiência da AD na governação poderá ter coisas diferentes do passado, piores ou melhores do que as governações anteriores de José Sócrates e de António Costa, mas o resultado será o mesmo, vamos continuar a caminhar para a cauda da União Europeia e de muitos outros países democráticos. A razão é a mesma, a impreparação das lideranças políticas para desenhar uma estratégia de desenvolvimento baseada em dois ou três elementos motores com dimensão transformadora. No meu texto “Estratégia de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030”, que aqui publiquei há dois anos, apontava apenas dois desses objectivos transformadores: a Educação e a Industrialização.

Já disse que nos casos de grande sucesso que referi, como em muitos outros bons exemplos, há um único elemento comum, a qualidade das lideranças, o que em democracia é matéria para os eleitores, por vezes para o acaso das contingências políticas. Infelizmente, em Portugal os portugueses têm escolhido quase sempre mal, o que se pode justificar com a realidade de que as lideranças são escolhidas pelos chefes partidários e não pelo povo eleitor.

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O antigo Secretário de Estado Henry Kissinger, que morreu recentemente aos cem anos, escreveu um último livro sobre a importância das lideranças, com seis exemplos de liderança: Konrad Adenauer, Charles de Gaulle, Richard Nixon, Anwar Sadate, Lee Kuan Yew e Margaret Thatcher. Todos líderes hoje abundantemente reconhecidos, mas talvez o caso que mais me impressionou, porventura por ser o de mais simples compreensão, é o do fundador de Singapura, um país até aí inexistente, Lee Kuan Yew. Também porque as mudanças de uma sociedade pobre e desorganizada, além de multirracial, para uma das mais desenvolvidas sociedades do mundo se processou em relativamente poucos anos. O que me leva à convicção e à esperança de que Portugal, um pequeno país, também não precisará de muito tempo para dar um grande salto no seu processo de desenvolvimento, se com a liderança certa.

Foi em 1994 que cometi o erro de pensar que Portugal tinha encontrada essa liderança em António Guterres, dado o reconhecimento das suas então evidentes qualidades e a sua sensibilidade social. Mas o meu erro não durou muito tempo porque, ele também, estava demasiado influenciado pela desgraçada política partidária portuguesa e porque, infelizmente, não tinha a força das convicções necessárias, acabando no pântano que ele próprio criara.

A liderança é sempre uma acção individual de um homem ou de uma mulher, que tenha a visão certa sofre as transformações necessárias e enquadre essas transformações na sua visão de futuro, além de conseguir motivar para a sua visão um amplo conjunto de colaboradores, por vezes um povo. Todos os escolhidos de Kissinger tiveram esse brilho pelos resultados alcançados, por vezes em condições de estrema dificuldade. Adenauer ergeu a Alemanha acima de tudo o que seria previsível nas complexas contradições existente no após guerra, através de uma extraordinária capacidade de negociação ao longo de muitos anos, quando as dificuldades pareciam insuperáveis. Os outros tiveram êxitos semelhantes, reais, independentemente das opiniões ideológicas que possamos elaborar.

A pobreza do recente debate do Estado da Nação mostrou que estamos muito longe de ter em Portugal um líder dessa dimensão, apesar de estar convicto de que existem por aí. O problema é que o seu acesso ao poder depende das máquinas partidárias e, por vezes, da comunicação social. Não por acaso, alguns dos líderes dos últimos trinta anos foram projectados pela comunicação social e o resultado está à vista.