Há três anos o PS perdia as eleições. No dia 4 de outubro de 2015 António Costa era um derrotado. A 4 de Outubro de 2018 é um dominador. Como foi possível? Juntando Marx e Marcelo.
Essa dicotomia tornou possível ao PS governar sem oposição. Ao PCP blindar-se para vários anos no conglomerado dos funcionários públicos (ninguém investiga o que se esconde por trás da língua de pau dos sindicatos sobre as carreiras, as progressões, os congelamentos…) Ao BE em particular e à “esquerda caviar” em geral tornar-se num secretariado do politicamente correcto, determinando sobre quem vai cair a onda de indignação da semana: só nos últimos dias tivemos a questão do “acordão machista” e da exposição em Serralves a motivarem pedidos de explicações e justificações. Os factos em si não contam. O que vale é o adjectivo que a brigada da indignação lhe cola: uma agressão por exemplo só conta se a brigada a definir como racista ou machista.
Todos os dias à frente dos nossos olhos desenrola-se uma espécie de farsa. Viver num país sob a política dos dois emes – Marx e Marcelo – é possível mas obriga a um enorme esforço não apenas de contenção da indignação mas também e sobretudo de manutenção da lucidez. Afinal a política dos dois emes – Marx e Marcelo – será tão melhor sucedida quanto mais aceitarmos como normal o que antes considerávamos um escândalo; quanto mais justificarmos o que antes inquiríamos; quanto mais desviarmos o olhar daquilo que já quisemos olhar de frente.
Protagonista incontornável deste processo é esse Presidente que do fogo de Pedrogão ao assalto aos paióis de Tancos ou à substituição da PGR tudo banaliza. A começar pelas suas próprias palavras: os esclarecimentos que iam ser “cabais” nunca apareceram. Os “inquéritos integrais” não se sabe onde estão. A procuradora sobre cuja substituição o PR dizia não fazer a “mínima ideia” afinal já estava substituída.
Como se sai disto? No passado os militares resolviam o assunto. Ou melhor dizendo abriam um novo capítulo nesse declive agónico que é o da degradação dos regimes. Na democracia portuguesa as falências têm cumprido esse papel. E agora como vai ser? Esperamos que um novo pedido de resgate resolva o assunto? Quiçá um escândalo. Alguma coisa há-de ser, não é?
Mas vamos à pergunta que três resgates impõem: para quê? Sim, não vamos discutir o quando nem o como do próximo momento de crise porque isso é apenas uma questão de calendário e de procedimentos já devidamente rotinados. O que o tempo tornou urgente é sim o porquê: sim, porque havemos de querer contrariar este estado de coisas? Não podemos deixar-nos ir simplesmente?
Esta pergunta tornou-se-me mais urgente após ler no Observador o texto assinado por Passos Coelho a propósito do afastamento de Joana Marques Vidal. Nesse texto houve quem visse um sinal de que a vida política do antigo primeiro-ministro não terminara. Talvez tenham razão. É certo que me conto entre aqueles que fazem uma avaliação positiva quer do mandato quer da personalidade de Passos Coelho mas por mais que deseje que a vida pessoal e política de Passos Coelho seja bem sucedida não posso deixar de perguntar: Passos Coelho voltaria para quê? Que projecto tem para os portugueses? Sim, porque 2011 não se pode repetir: Passos não está a pensar voltar para pedir aos mesmos do costume – os contribuntes – que façam mais um esforço? Muito menos para lutar por uma vitória que nunca o será enquanto o socialismo-estatismo se mantiver como o modelo ideal, moralmente superior e constitucionalmente inatacável a que regressamos assim que existe uma folga orçamental? É que se for para isso muito francamente, não vale a pena Passos Coelho dar-se ao trabalho de sair de casa.
Segundo o INE, Lisboa e Porto ganharam 1600 moradores no ano passado. Helena Roseta coordenadora do grupo de trabalho da AR para a habitação estranha. Ou seja Helena Roseta não estranha o seu desconhecimento de algo que devia ter percebido: afinal há anos e anos que Lisboa e Porto perdiam habitantes. Quando a tendência se inverte a coordenadora do grupo de trabalho da AR para a habitação não só não dá por nada como “estranha”. Durante décadas Lisboa perdeu habitantes. Prédios degradados e vazios sucediam-se nas ruas. Nos anos 80, as quedas de edifícios vazios eram uma tragédia mais que anunciada. Depois vieram os incêndios. Mas na propaganda que por aí anda Lisboa e Porto eram cidades onde cada um conseguia alugar a casa dos seus sonhos por um preço acessível. Algo me diz que estes dados agora apresentados pelo INE ou vão ser ignorados ou hostilizados pois não se pode deixar a realidade destruir o activismo.
Inebriado com a mobilização em torno da causa da moda escreve o PÚBLICO: «Em Lisboa, turistas ouviram residentes dizer: “A cidade é nossa!” Centenas de pessoas vindas dos bairros históricos e das periferias desfilaram na capital pelo o “direito à habitação” e o “fim da especulação”.» Substituam-se turistas por migrantes ou refugiados e estávamos a falar de racismo e xenofobia não era?
Lembram-se do AIMI (vulgo imposto Mortágua) que ia incidir sobre o património dos ricos muito ricos? Pois como os ricos em Portugal são poucos e o dinheiro dos impostos nunca chega, os impostos criados para incidir sobre os ricos acabam a ter de ser pagos pelos pobres. E assim não contentes em tributar como o AIMI os ditos ricos proprietários de valiosíssimos imóveis o fisco está a intimar as administrações de condomínio de prédios ricos e modestos a também elas pagarem esse imposto não se percebe com que legitimidade pois as administrações de condomínio não possuem património algum e pelos imóveis os proprietários já pagam AIMI.