Parece que a Direita portuguesa não anda satisfeita com Marcelo, porque Marcelo dá uma ajudinha permanente e até, de quando em quando, entusiástica ao governo de Costa e à coligação: ontem, por exemplo, chegou a dizer que essa gerigonça estava de pedra e cal. A Direita não gosta nada de ouvir e preferia que o Presidente mostrasse à Esquerda um genérico desprazer e lhe criasse o maior número possível de dificuldades. Ora isto é de uma estupidez imensa. Não gostar de Marcelo, da pessoa e do político, não pode prejudicar o entendimento da situação vigente, nem os limites que ele de facto tem. Soares não se deu mal com Cavaco, nem Cavaco com Sócrates; e só se decidiram por uma oposição pública quando Cavaco e Sócrates se começaram a tornar impopulares.
É bom compreender que os Presidentes que dissolveram a Assembleia da República tinham atrás de si forças consideráveis e uma solução de governo. Soares não queria um aliança entre o PS e o PRD, que prolongaria a influência dos militares no Estado e oferecia a Eanes a oportunidade de infiltrar o PS. Mas sabia que o PSD de Cavaco iria ganhar as eleições, o que era uma alternativa tolerável, embora, como se viu, difícil de engolir. Sampaio dissolveu um parlamento com maioria de Direita, com toda a segurança de que o PS lhe arranjava outra. E por aí fora. O Presidente nunca desafia o parlamento sem a certeza de “fazer” outro sua à medida. A legitimidade do Presidente e a legitimidade da Assembleia são equivalentes. O que é um erro, entre muitos que se cometeram por medo e pressão do MFA. Pouco a pouco, os partidos foram tirando os poderes ao Presidente. Infelizmente, a anomalia ficou lá. E, por isso, para a Direita, criticar Marcelo é pueril e ocioso. Nem Marcelo, nem ninguém de juízo se apoiaria na Direita que por aí intriga, se guerreia ou dorme. Se quer que o Presidente mude, que se mude ela primeiro.