De Bragança a Lisboa eram nove horas de distância, cantava Tim, dos Xutos & Pontapés, nos 80’s. De Tiago Mayan a André Ventura vai pelo menos um século. O debate entre ambos foi esclarecedor: Mayan corporiza uma alternativa decente, construtiva e racional para o eleitorado desiludido com Marcelo; por oposição a uma definição de direita, verbalizada por Ventura, forte com os fracos e fraca com os fortes, que afasta qualquer moderado. Entre estes dois candidatos presidenciais há mesmo uma barreira intransponível, a dos direitos humanos – que Mayan defende e Ventura despreza.
Mayan é uma alternativa decente na medida em que não assume uma posição de desconfiança em função da nacionalidade, da cor, da etnia, da orientação sexual ou da crença religiosa do indivíduo, nem se aproveita politicamente de casos esporádicos envolvendo minorias para cavalgar os piores instintos do ser humano. Esta é uma linha vermelha que nenhum liberal está disposto a passar e Mayan foi assertivo na mensagem, recordando o episódio em que Ventura sugeriu que uma deputada afro-descendente fosse “devolvida ao seu país de origem” ou quando propôs o confinamento da comunidade cigana.
Uma alternativa construtiva porque não se esgota no discurso antissistema, nem configura apenas um voto de protesto. Mayan não quer a IV República, nem é dado a ímpetos revolucionários. Parte de uma plataforma moderada e reformista, que apresenta uma visão diferente de futuro respeitando o legado histórico do país. Uma visão que tem como referência exemplos de sucesso da aplicação de políticas liberais, como o sistema de saúde da Alemanha, assente na liberdade de escolha, ou a política fiscal da Irlanda, promotora de crescimento económico e de salários de primeiro mundo.
O liberalismo não é uma utopia, como Ventura, Marcelo e a esquerda frequentemente proclamam. É a realidade vivida em diversos países mais ricos e desenvolvidos do que o nosso, com provas dadas, que só por desconhecimento ou desonestidade aqueles ignoram. Utópico seria tentar encontrar um exemplo de prosperidade marxista ou de respeito integral pelas liberdades na direita que inspira Ventura.
Por fim, uma alternativa racional, que prioriza o que é verdadeiramente relevante para o país. Mayan nem precisou de se esforçar muito para destapar o véu ao seu adversário: enquanto Ventura faz do RSI, orçamentado em 355 milhões de euros, um cavalo de batalha, vota favoravelmente à nacionalização da TAP, que se estima poder custar cerca de 4 mil milhões de euros aos contribuintes.
O que fica deste debate é um manual para derrotar André Ventura e o Chega. Não se faz com ataques pessoais, nem com laivos de superioridade moral ou anúncios apopléticos de cordões sanitários. Muito menos desqualificando o seu eleitorado, circunstancialmente iludido, que deve ser resgatado. Explica-se “à moda” de Mayan, com exemplos e dados concretos, confrontando posições e apontando contradições, demonstrando que há um caminho melhor, sustentado em políticas comprovadamente eficazes, para alavancar o país.
Aqueles que querem travar, silenciando ou limitando, Ventura pela via judicial só comprovam a velha máxima de que os extremos se tocam. Gostam pouco da democracia, lidam mal com o pluralismo e não prezam verdadeiramente a liberdade. Mayan demonstrou como se combate, no confronto das ideias e dos factos, uma direita identitária que não responde aos verdadeiros problemas do país. Só desta forma é possível esvaziar fenómenos políticos como o Chega.
Neste processo de afirmação da visão liberal, sabemos com o que contar. Muitos dos que, esta semana, aplaudem Mayan por exclusão de partes, estarão em breve a acenar-nos novamente com estereótipos e bichos papões, como o fim do Estado e a insensibilidade social. Continuaremos a ser “fascistas” para uns e “bloquistas” para outros. E enquanto assim for, significa que estamos onde devemos estar, a defender uma ideia para Portugal que todos rejeitam, enquanto nos conduzem para a cauda da Europa.