Notícia 1:

«A ministra da Ciência cancelou as Parcerias Internacionais com três universidades americanas, contrariando um parecer de personalidades independentes que recebeu em junho, mas meteu na gaveta

Notícia 2:

«Elvira Fortunato deu o dito por não dito. A ministra da Ciência cancelou os contratos de Parcerias Internacionais da Fundação Ciência e Tecnologia (FCT) com três universidades americanas, mas, perante as críticas públicas de personalidades como Nuno SebastiãoPedro Siza Vieira e Carlos Oliveira, e as iniciativas privadas de empresários e académicos ao mais alto nível do Governo, Elvira Fortunato remete, agora, uma decisão para o próximo governo.»

Há dias fomos surpreendidos pela sequência de notícias acima num momento em que o governo socialista se arrasta em pré-dissolução. Está em causa o ensino superior, área nuclear da governação, e Portugal persiste num longo ciclo em que o setor foi transformado no alvo mais agressivamente instrumentalizado pela esquerda no seu assalto ao poder. PS, PCP e BE sabem de ciência sabida que quem manda nas sociedades é quem manda nas cabeças das pessoas (eles mesmos), e as universidades são hoje o topo da pirâmide do controlo do modo como indivíduos, comunidades ou sociedades pensam. Por essa razão, nos séculos passados falava-se na Europa das Catedrais e hoje vivemos na Europa das Universidades (de esquerda).

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Desde a primeira hora, Elvira Fortunato, a ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior trocou a veste de cientista reputada pela de socialista convicta, atitude revertida: (a) na sua obsessão constante com a quantidade e sucesso estatístico, em bater recordes de estudantes inscritos e diplomados no ensino superior, não importa como, para quê e com que mercado de trabalho; (b) na sua persistente tolerância à proliferação de cursos e mais cursos numa cacofonia incompreensível, sendo que se satisfaz com a ostentação da «diversidade de cursos» sabe-se lá com que fins; (c) na sua absoluta insensibilidade às causas estruturais do descalabro financeiro do ensino superior num país sobrecarregado de impostos, descalabro que não resulta necessariamente da falta de dinheiro, antes da inconsciência da missão e dever de equilíbrio de cada instituição do ensino superior, sendo esse o resultado de constantes pressões da tutela política; entre outras atitudes.

O mandato de Elvira Fortunato acaba resumido a uma campanha eleitoral permanente de instrumentalização do ensino superior. Daí estarmos no final de (mais) um ciclo de poder socialista de oito anos que não deu respostas a nenhum dos graves problemas estruturais do setor que, por isso, não param de se agravar. Se o cenário já era mau, tornou-se aterrador. Exemplos.

(a) O assalto de certos partidos políticos às universidades continua em rédea solta, fenómeno escandaloso no caso da relação entre o Partido Socialista (PS) e o ISCTE-IUL, entre o Bloco de Esquerda (BE) e o Centro de Estudos Sociais (CES da Universidade de Coimbra) ou entre a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH-Universidade Nova de Lisboa) e esquerdas sortidas, para citar exemplos inequívocos.

(b) Vivemos dias de desproteção sem precedentes dos jovens licenciados, mestres e doutores portugueses face à abertura descuidada do país ao espaço académico lusófono, o que coloca os 11 milhões de habitantes de Portugal em disputa com mais de 200 milhões do espaço lusófono (Brasil e países africanos). Trata-se de uma orientação intencional da tutela política que está a ser uma machadada gravíssima nos fundamentos da classe média portuguesa do último meio século, em muito constituída por indivíduos oriundos de famílias desfavorecidas que melhoravam a sua condição socioeconómica quando obtinham formação superior. Os socialistas estão a matar alegremente a classe média portuguesa à custa do seu vício «globalista» alimentado pelos fantasmas da eterna culpa do «opressor-colonialista» português.

(c) A transformação do ensino superior em (mais uma) agência de imigração. Os estudantes estrangeiros que chegam e as formações que lhes serão ministradas não se submetem aos critérios-chave de rigor e qualidade, assim o exigiria o Conhecimento Académico, antes basta que venham muitos e muitos estudantes estrangeiros, como se as instituições do ensino superior fossem empresas de apanha de fruta em desespero por mão-de-obra barata. Por cima, neste caso irá saturar o mercado de emprego qualificado em Portugal e degradar seriamente os salários das classes médias num país sem grandes alternativas.

(d) A persistente endogamia dos que controlam as instituições do ensino superior, havendo castas académicas com afinidades político-ideológicas ou pessoais que se autorreproduzem, insensíveis a viverem misturadas com recordes de precariedade laboral e maus salários de docentes e investigadores do ensino superior.

(e) O desajustamento dos cursos do ensino superior em relação ao mercado de trabalho e já nem professores para o ensino básico e secundário as universidades conseguem formar.

(f) Investimentos em cursos dispendiosos, como enfermagem ou engenharias, para exportar mão de obra altamente qualificada em benefício de países importadores que, desse modo, se livram de tal investimento ficando apenas com as vantagens.

(g) Assédio moral, sexual e outros atropelos a coberto do poder das esquerdas nas universidades, mais o surgimento de problemas de atitudes e comportamentos desajustados entre os estudantes universitários que derivam de décadas de indisciplina que grassa no ensino básico e secundário e que vão deixando também os docentes do ensino superior desprotegidos, intimidados, impotentes.

(h) Degradação e sobrelotação do património edificado de universidades e politécnicos, incluindo o agravamento do fosso entre o aumento exponencial do número de alunos e a ausência dos correspondentes apoios financeiros, de instalações e recursos humanos necessários.

(i) Falta de apoios ao alojamento estudantil num momento em que se incentiva a vinda de estudantes estrangeiros em plena crise grave da habitação, como se tudo pudesse ser feito sem estratégia, sem sentido de responsabilidade, cada um por si em disputa selvagem como se não houvesse governo.

(j) Um país que estagna ou retrocede economicamente, assim como vê as mais variadas instituições em erosão justamente num ciclo de cerca de duas décadas do maior investimento e expansão de sempre do ensino superior que, por isso, deveria ter gerado o inverso, a prosperidade coletiva. Ninguém questiona os porquês de tamanho falhanço estrutural do ensino superior, a começar pela ministra da Ciência, como se as universidades fossem a vaca sagrada do regime, feudos imunes à crítica.

(l) Atravessamos uma das mais severas crises de credibilidade do Conhecimento Académico justamente porque a razão (académica) se deixou colonizar pelo poder (político), o que mata a autonomia das universidades. A situação vai modelando no mesmo sentido a falência da autonomia das mais variadas instituições na relação com o poder político: justiça, saúde, segurança, entre outras.

Perante tal cenário aterrador do que já foram instituições altamente prestigiadas, as universidades, a ministra socialista Elvira Fortunato conseguiu atravessar o mandato sem mexer uma palha para enfrentar tantos e tão relevantes problemas.

Porém, tentou dar mais um ar da sua graça para encerrar em «beleza» as suas funções: destruir o que de melhor funcionava. Decidiu que a Fundação Para a Ciência e a Tecnologia (FCT portuguesa) não renovaria as parcerias internacionais que mantém desde 2006 com três universidades norte-americanas de excelência: Carnegie Mellon University, MIT e University of Texas at Austin. As pressões contra a decisão da ministra não a demoveram por aí além. Limitou-se a fazer transitar a decisão para o próximo governo deixando os parceiros pendurados nos próximos meses, o que não apagará um voto de desconfiança do Governo Português a parceiros internacionais que mereciam o contrário.

 

Em estado de pré-dissolução, mas ainda em plenitude de funções, o atual governo socialista, sem reformar nada do que é decisivo para o ensino superior, tentou livrar-se de parcerias científicas entre as mais importantes de sempre para as dinâmicas académias portuguesas e na dinamização de um tecido empresarial da mais elevada qualidade e sustentabilidade, o que também inclui o potencial de modernização de setores tradicionais do universo empresarial nacional, dos poucos nichos de verdadeira excelência da economia portuguesa. A ser desfeito, o tipo de contrato em causa tornará impossível recuperar, num futuro qualquer, o enorme capital entretanto acumulado ao longo de quase duas décadas.

Não está em causa um lapso pontual, mas uma atitude que define os governos liderados por António Costa: nada reformar e arrasar com o que ainda funciona. Portugal sai do atual ciclo de governação de oito anos afundado nos piores vícios venezuelanos de obsessão com a compra de votos por quem governa disposto a tudo sacrificar para se manter no poder pelo poder.

O Senhor Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, decidiu deixar o Governo Socialista ligado à máquina por mais uns tempos em exercício pleno de funções e marcar eleições para o longínquo 10 de março de 2024. É bom que esteja especialmente atento. Há riscos demasiado sérios.