O mundo está cada vez mais intimamente ligado de tantas formas distintas e complexas que é impossível ignorar a interdependência entre países e entre organizações dentro do mesmo país.
O vírus SARS-CoV-2 trouxe à superfície problemas estruturais a todos os níveis, e se houve uma lição tremenda desta pandemia foi a de que a colaboração, internacional e interna, são cada vez mais indispensáveis. É aceite maioritariamente que a colaboração internacional é fulcral para o desenvolvimento de um país, mas dá-se consideravelmente menos importância à colaboração interna entre setores.
No meu dia a dia trabalho com os três setores, e a dinâmica de cada um, assim como os seus objetivos, embora estejam a convergir, estão longe de estarem alinhados.
Vamos olhar para cada setor. O setor público tem como missão o bem-estar público. É indiscutível a extensão do seu alcance, abrangendo 15% da população empregada (Eurostat, 2018), o que é certamente discutível é a sua eficiência.
O setor privado é garantidamente mais eficiente, embora por vezes completamente desligado do impacto social e ambiental que causa. É um setor fundamental como motor económico de um país e como forma de trazer recursos ao setor público, mas se o seu impacto for ignorado, as consequências podem ser drásticas.
O setor social, um dos grandes motores de inovação social, com alto potencial de ser usado pelo setor público ou de ajudar o privado a mitigar o seu impacto, é muitas vezes ignorado e carece fortemente de recursos.
Isto é conhecimento geral mas se são evidentes as forças e fraquezas de cada sector porque é que não há mais colaborações? Porque é que não são exploradas mais sinergias para exponenciar os pontos fortes de cada um e mitigar os respetivos pontos fracos? É aqui que me parece fundamental fazer um pacto entre setores.
Independentemente da cor partidária, estamos todos a lutar pelo mesmo – mais prosperidade económica e social, com melhores condições para todos, um apoio social mais sólido, uma educação mais promissora e um sistema de saúde mais robusto, portanto não devíamos estar todos a colaborar?
Para isso, há três aspectos primordiais a ter em atenção.
1 Transparência da informação da intervenção pública a nível local, regional e nacional
A nível de intervenção pública, seja em fundos públicos nacionais como europeus, o escrutínio de seleção tem critérios altamente rigorosos, já a disponibilização pública dos resultados e impacto fica aquém do esperado.
O INE e particularmente a Fundação Francisco Manuel dos Santos têm feito estudos valiosos sobre a situação do país e algumas intervenções públicas. Mas a nível de resultados de intervenções públicas não há praticamente nenhuma informação disponível. Na era da informação, enquanto cidadãos ou entidades da sociedade civil, continuamos a não ter disponível informação crítica sobre a forma como o setor público investe na sociedade.
Temos alguns exemplos a destacar, como o info escolas ou a plataforma One Value, mas esta transparência está longe de ser uma prática comum.
2 Medidas de estímulo ao “multilateralismo” interno
No setor privado temos iniciativas como a GRACE, que reúne mais de 160 empresas empenhadas em promover e desenvolver a responsabilidade social corporativa, ou a BCSD Portugal que é uma associação empresarial que agrega empresas com visão de futuro, trabalhando em conjunto para acelerar a transição para um mundo mais sustentável.
No setor público temos iniciativas como o LabX – Centro para a Inovação no Setor Público, que, através da colaboração e inovação, promove a renovação da oferta de serviços públicos adequados às reais necessidades de cidadãos e empresas ou a Portugal Inovação Social que é uma iniciativa pioneira do Estado português que pretende contribuir para a dinamização de iniciativas de inovação e empreendedorismo social em Portugal.
3 Iniciativas concretas de colaboração
No setor social temos iniciativas como a Casa do Impacto que é uma plataforma de inovação e de empreendedorismo social, dinamizadora de uma série de ações no domínio do empreendedorismo, destinada a apoiar projetos que permitam efetivar políticas de responsabilidade social consequentes e impacto social e ambiental positivo, ou a SEDES em que as suas posições e análises políticas, desenvolvidas por grupos de trabalho diversos nas várias áreas da sociedade, têm sido referências para a comunicação social e têm traduzido o pluralismo das intervenções.
Quero terminar com uma boa notícia, este pacto, tão necessário, já está a dar os primeiros sinais de vida e já tem iniciativas e medidas de sucesso como as que foram mencionadas.
Mas precisamos de ser mais ambiciosos. Hoje, mais do que nunca, a colaboração vai ser crítica para continuarmos a resolver os problemas atuais e olhando a uma escala nacional, é imprescindível repensarmos como os diferentes setores (privado, público e social) se interligam e se podem potenciar mutuamente.
João Duarte é Diretor Executivo e co-fundador da empresa social Impulso. Conta com experiência profissional em vários contextos, desde startups, aceleradoras a empresas sociais, na Índia, China, Dinamarca e Holanda. Foi nomeado Global Changemaker em 2016, top5 empreendedores sociais com menos de 30 anos na zona mediterrânica pelas Nações Unidas em 2018 e Young Leader da ASEM em 2021. Juntou-se aos Global Shapers em 2018.
O Observador associa-se ao Global Shapers Lisbon, comunidade do Fórum Económico Mundial, para, semanalmente, discutir um tópico relevante da política nacional visto pelos olhos de um destes jovens líderes da sociedade portuguesa. O artigo representa a opinião pessoal do autor, enquadrada nos valores da Comunidade dos Global Shapers, ainda que de forma não vinculativa.