“Todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender”
(Artigo 66º da Constituição da Republica Portuguesa)
Uma cabra com chifres de ouro habita nas nossas montanhas. Há pouco mais de duas décadas, e após uma ausência de um século, voltaram ao Gerês as Cabras-montesas (Capra pyrenaica). Esta, espécie comum e caçada em Espanha, é um troféu de luxo a nível mundial, atingindo milhares de euros. Cá é uma espécie protegida pela lei, aquela tradição alfacinha de resolver as coisas independentemente de não ter forma de garantir o seu cumprimento.
A Cabra podia perfeitamente ser uma espécie cinegética. São poucas? Era a forma de termos mais – também os Veados ou Corços eram poucos há umas décadas e hoje abundam com o investimento do sector cinegético. Poderiam mesmo regressar a locais como a Serra da Estrela. Com reflexos positivos na biodiversidade, no turismo, na gestão dos matos, etc. O furtivismo comprimia – não só havia proteção deste ativo, como vigilância nos montes. Aspetos como doenças – a sarna é um problema nesta espécie – seriam monitorizadas e, se necessário, controladas. Os interesses locais eram tidos em conta, as populações viam algumas expectativas satisfeitas, revertia receita para o mundo rural, tudo através de atividades sustentáveis.
Não obstante, quando há poucos anos se começou a falar na possibilidade de incluir esta espécie na lista cinegética, logo um elevado coro de protestos emergiu. Matar um animal raro? Pensar em dinheiro, atender às aspirações locais, lazer, etc.? Isso não é eticamente admissível. Não? O inverso, o triste espetáculo de animais mortos furtivamente, decapitados, é mais bonito?
E agora? Reforço do patrulhamento da GNR até a coisa sair das notícias e a malta se esquecer, e provavelmente mais umas leis inconsequentes. É com imposições e restrições, muitas vezes estapafúrdias, mal compreendidas ou aceites pelos afetados que se resolvem problemas? Foi assim que se limparam as ruas de beatas? Foi com os patrulhamentos que acabámos com os incêndios de verão? Proibindo a caça acabámos com o furtivismo? É isto proteger o ambiente?
Fora da bolha elitista citadina, sua soberba, preconceitos e clientelismo, e por mais que a usem como bandeira para captação de votos, não, isso não é proteção ambiental. Proteger o ambiente passa sim por mobilizar as gentes, os seus saberes, as suas práticas, por envolvê-las e apoiá-las. Mesmo quando as decisões são contrárias às vontades iniciais, esta é a forma de serem aceites e compreendidas, não à bruta, não desrespeitando componentes socio-culturais de queimadas a festivais gastronómicos, passando pela caça ou pela pecuária.
Há pouco tempo escrevi aqui um texto sobre a cor verde da Iniciativa Liberal. Algo que muita gente preocupada com o ambiente abominou. De facto, não bate a bota com a perceção pública generalizada, que associa a proteção ambiental aos partidos mais à esquerda do nosso espectro político, tomando os restantes como predadores furtivos do bem comum. Cabe aos restantes partidos desmontar as contradições destas abordagens românticas.
O ambiente é um direito consagrado na Constituição, é de todos os portugueses, não é esquerda nem direita. É então dever dos outros partidos não deixar o tema capturado pelos que o dizem defender mas de onde resultam muitos dos maus exemplos a que temos assistido por cá, que se juntam a muitos exemplos externos que facilmente evidenciam os pés de barro de muitas propostas tidas como ambientalistas.
Não sabem por onde começar? Eu aponto-vos o caminho: José Manuel Fernandes foi certeiro há dias nesta rádio dizendo algo tão óbvio como isto – a política ambiental deve ser com as pessoas e com a economia, e não contra as pessoas ou contra a economia. Inspirem-se!