A respeito da posição desfavorável do PSD na votação final do texto de substituição dos projectos-lei que visam proibir as denominadas práticas “de conversão sexual” contra pessoas LGBT, criminalizando os atos dirigidos à alteração, limitação ou repressão da orientação sexual, assistiu-se, uma vez mais, à convocação do medo junto da população LGBT contra o PSD, por parte das esquerdas parlamentares.

Nesta tentativa de provocar um clima de alarmismo, ou de forjar novos pontos focais para novas indignações, assistiu-se, por parte dos próceres do PS e da extrema-esquerda, à enésima declinação do papão da Direita, em suposta defesa (para inglês ver) dos direitos, liberdades e garantias de minorias.

Agitam-se assim os espantalhos de um eixo inexistente PSD/Chega. Anunciam-se futuras e desconhecidas batalhas culturais. Convoca-se o medo de que a Direita das cavernas virá aí para destruir todos os direitos conquistados nas últimas décadas pelas pessoas LGBT. E procura-se apascentar a comunidade LGBT no sentido de esta votar obedientemente contra o PSD (ou mesmo contra toda a Direita, incluindo a liberal).

É obvio o exagero fantasioso deste exercício, por isso mesmo condenado ao insucesso.

Aliás, basta a este propósito ler a Declaração de Voto apresentada pelo Grupo Parlamentar do PSD na Assembleia da República. O PSD não só repudia as chamadas terapias de conversão como é inclusive a favor da sua criminalização, defendendo a acuidade e o imperativo da tutela do bem jurídico que aqui está em causa, perante práticas aberrantes, desacreditadas e intoleráveis:

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  • A liberdade de autodeterminação sexual das pessoas.

Aliás o PSD votou inicialmente na Assembleia da República, em sede de apreciação na generalidade, a favor dos projectos apresentados.

E sustentou depois, com tranquilidade, ponderação e elevação, e em obediência a critérios irrenunciáveis de exigência com a qualidade das leis, o facto de ter votado contra o atamancado texto de substituição final.

Com efeito o texto final logrado na Assembleia da República é juridicamente mal concebido, circunscrevendo esta matéria no domínio da tipificação de crimes sexuais, ao invés de a ter colocado sistematicamente, como deveria, com mais dignidade e acerto, no âmbito dos crimes contra a liberdade pessoal. Acrescendo ainda a completa irrazoabilidade das molduras penais, sobretudo em cotejo com outras molduras, de outros crimes sexuais, o que naturalmente abre portas a uma possível incompreensão social em casos penais futuros.

Mas, sobretudo, legislou-se a martelo, perdendo-se, com esta precipitação inusitada, a oportunidade de exercer maior pedagogia pública contra esta barbaridade, ouvindo para o efeito interessados e especialistas na área (Ordem dos Médicos, Ordem dos Psicólogos, coletivos LGBTIQ+, Sociedade Portuguesa de Sexologia, entre outras entidades) assim se truncando desnecessariamente um processo legislativo que poderia ser mais impactante, agitando positivamente as consciências.

Mas para alguns deputados do PS que logo se apressaram a correr para as redes sociais com a grelha final dos votos, o seu objectivo táctico essencial estava afinal alcançado:

  • Chegar a 10 de Março com mais uma medalha ao peito.

Uma medalha sem préstimo.

Porque de resto não há qualquer questão política em aberto sobre os direitos, liberdades e garantias da população LGBT. O PSD defende o quadro legal e constitucional vigente e não vê qualquer necessidade na sua alteração.

Os direitos cívicos da população LGBT são direitos humanos. E nesta matéria não pode existir divisão entre Esquerda ou Direita.

A única divisão existente nesta matéria é entre quem é democrata ou quem não é democrata.

Porque os direitos humanos de uns são os direitos humanos de todos. TODOS. TODOS. TODOS, tal como proclama o Papa Francisco. Uma inclusão nos direitos independentemente da orientação sexual, género ou expressão individual de cada um.

Não há como mistificar coisas que são muito sérias.

O PSD tem uma história democrática de quase 50 anos de compromisso com os Direitos Humanos. E posiciona-se neste tipo de matérias de acordo com a sua matriz humanista e os seus valores personalistas. Sempre do lado da igual e eminente dignidade da pessoa humana.

Importa aliás recordar a História e recordar os 40 anos da descriminalização da homossexualidade em Portugal, um importante marco para a história da nossa Liberdade colectiva, que celebrámos o ano passado. Com efeito, importa por vezes relembrar que a verdadeira liberdade prometida pelo 25 de Abril, só chegaria para milhares de portugueses e portuguesas, apenas oito anos depois, já em Setembro de 1982, com a descriminalização da homossexualidade, precisamente pela mão do PSD.

É certo que a plena igualdade jurídica e o reconhecimento social da plena dignidade destas pessoas, cidadãos portugueses que eram em (quase) tudo iguais, exceto na esfera mais fundamental e íntima da expressão dos seus sentimentos, seria um caminho que duraria ainda mais algumas décadas.

Mas a descriminalização da homossexualidade foi a primeira grande abertura na muralha legal instituída ao longo de séculos contra estas pessoas.

E convém por isso recordar que este marco de humanismo foi legislado por iniciativa do VIII Governo Constitucional, da Aliança Democrática, chefiado pelo fundador do PSD e seu militante nº 1, o Dr. Francisco Pinto Balsemão, com o Dr. José Menéres Pimentel, como Ministro da Justiça, o ministro responsável por esta reforma legal.

A propósito deste assunto importa relembrar as palavras do antigo deputado do PSD e eminente penalista, o Prof. Manuel Costa Andrade, proferidas na Assembleia da República ainda no ano de 1978, quando, ainda em vão, pugnava pela descriminalização da homossexualidade:

  • O direito penal não deve ser “guarda-noturno de uma concreta moral” e “toda a atividade praticada livremente entre adultos e em privado não deve ser objeto de repressão penal”.

Mais tarde, já em sede de adopção do novo Código Penal de 1982, o Prof. Manuel Costa Andrade, defenderia de novo na Assembleia da República, pela sua verve brilhante, “a tutela jurídico-penal da liberdade e autenticidade da expressão humana em matéria sexual, e não de quaisquer cartilhas moralistas”.

Foi assim, em 1982, que por respeito à “reserva da vida íntima”, constitucionalmente consagrada seis anos antes, na Constituição de 1976, que a homossexualidade entre adultos, livremente exercida, deixaria de ser punida, por proposta de um governo do PSD.

Foi o início de um caminho.

Uma evolução que se foi fazendo depois ao longo dos anos, eliminando-se, mais de vinte anos depois, por via jurisprudencial, alguns resquícios discriminatórios em relação aos homossexuais, ainda remanescentes no âmbito da tipificação e da qualificação de alguns crimes na legislação penal, e consagrando-se depois, mais amplamente e pela positiva, por via legal, a igualdade noutros direitos, não tendo o PSD obstaculizado algum destes ganhos, nem tendo impedido que muitos dos seus deputados fossem sucessivamente apoiando esta evolução legal positiva.

Podemos hoje dizer que todos os portugueses e portuguesas são livres. Podemos hoje afirmar, com orgulho, que a discriminação com base na orientação sexual, tanto ao nível social, como político e legal, é absolutamente inaceitável.

É um sintoma de uma sociedade melhor e mais sã.

Porque deixámos, enquanto sociedade moderna e desenvolvida, de inserir a homossexualidade no domínio da teologia e do pecado, para a encarar como mais uma variante socialmente aceite da sexualidade humana, expressão da esfera íntima e pessoal de cada um, livre de conotações de índole moral punitiva.

Em Portugal a situação jurídica dos Direitos Humanos está, portanto, resolvida e assente, e faz parte do amplo consenso social.

E isto é um bem inquestionável.

Dispensa-se assim o esforço constante, por parte da esquerda woke, da descoberta de novas e intermináveis micro-agressões no quotidiano nacional.

Pelo contrário, importa agora, em tempo de crescente polarização das sociedades ocidentais, de radicalização discursiva e da consequente pressão nas nossas Democracias, recusar o caminho perigoso das novas obsessões identitárias, preservando o essencial da coesão e da paz social no seio das nossas comunidades.

Importa unir, mais do que fracturar.

O que deve interessar agora a todos é estabelecer um rumo que garanta um futuro próspero e de igualdade de oportunidades para todos, independentemente da sua orientação sexual, género ou expressão individual. E garantir um elevador social que efectivamente funcione neste país.

A sociedade portuguesa carece assim de ser representada com uma nova ambição, e reflectindo toda a sua complexidade actual, com um novo foco no desafio da prosperidade.

As pessoas que provêm de minorias étnicas, as pessoas que fazem parte de minorias religiosas, as pessoas LGBT, as pessoas que vivem nos subúrbios indiferenciados das grandes periferias urbanas, as pessoas sem representação no discurso oficial, precisam hoje de muito mais do que de atitudes performativas ou discursos proclamatórios.

As palavras são bonitas mas quando são vazias de nada servem.

De facto, as pessoas precisam de muito mais do que de palavras. Precisam de ser realmente incluídas num projecto de mudança para o país que lhes permita poder cumprir aqui o seu próprio projecto de felicidade pessoal.

E é isto que o socialismo português não oferece ao fim de todos estes anos.

Porque a visibilidade sem medos e a igual consideração e estatuto social e cívico de todos e de todas, de pouco servirão numa democracia adulta e saudável, sem que todos e todas possam ter uma real oportunidade de prosperar num país que hoje se encontra economicamente estagnado e socialmente estratificado.

Que valem os direitos sem os meios para os exercer?

Os portugueses (todos) já são livres. Mas falta agora serem prósperos.