Vivemos tempos desafiadores e conturbados. Estamos no meio de uma pandemia onde fomos e ainda somos alvo de políticas restritivas de confinamento de cariz autoritário. Com a implementação universal de certificados digitais, gradualmente vamos restringindo os nossos Direitos, Liberdades e Garantias, mas não só, pois perdemos também os nossos trabalhos, negócios e, em muitos casos, mudamos radicalmente as nossas próprias vidas.

Enquanto passamos cada vez mais tempo confinados e conetados à internet, as taxas de incidência de doenças mentais e de suicídios não param de aumentar. Paralelamente, parecem não existir gerações suficientes para pagar as dívidas públicas que, em consequência dessas mesmas políticas, igualmente não param de aumentar.

A censura, camuflada de direito à proteção contra a desinformação, e a consequente polarização política são, hoje em dia, consideradas normais. O debate e o respeito mútuo deu lugar ao “pro versus anti”, que se traduz na mentalidade de “quem não está comigo, está contra mim”. Esta mentalidade gera um efeito profundamente divisório nas sociedades ditas democráticas que, em tempos não muito distantes, eram vendidas como abertas e tolerantes.

A recente política de levantamento de restrições sanitárias por parte de alguns países europeus aparenta não passar de uma espécie de experimentação da esperança em massa, pelo que, a dessensibilização sistemática já deu início.

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Num futuro próximo, da conjugação destes fenómenos poderá vir a resultar uma mudança civilizacional profunda, com implicações e consequências tão distópicas e inimagináveis que, atualmente, a sua aproximação aparenta ser de muito difícil compreensão. Até porque a maioria das pessoas que vivem em sociedades ditas democráticas nasceram em liberdade, pelo que não tiveram oportunidade de conhecer outro tipo de realidade.

Convém, por isso, relembrar que os nossos Direitos Fundamentais não são inerentes ao ser humano como, de forma romântica, foi positivado nas convenções internacionais. Os nossos Direitos Fundamentais foram duramente conquistados pelos nossos antepassados, em sangrentas batalhas contra monarcas e tiranos. Defenderam, lutaram e morreram para transmitir às gerações futuras estes direitos alegadamente inerentes e, com isso, moldarem as atuais sociedades.

Todos sabemos que as atuais sociedades ditas democráticas estão longe de ser perfeitas, especialmente pela elevada incidência de crimes de corrupção e de branqueamento de capitais no sector político e financeiro, que, entre outros dislates e ilícitos, dizimam a economia dos países.

Não obstante, até ao ano de 2019 estas sociedades permitiam às pessoas viver as vidas que escolhiam (dentro dos limites da lei, claro), ou, pelo menos, permitiam às pessoas desfrutar da ilusão de livre-arbítrio.

No espaço de dois anos, as nossas tão sagradas e protegidas liberdades transformaram-se em meros privilégios, temporariamente concedidos com base naquilo que é qualificado de bom comportamento, ou seja, com base no cumprimento cego e acrítico de leis injustas ou inconstitucionais e recomendações completamente vazias de lógica ou de senso comum.

Atualmente, em 2022, enquanto a maioria “assobia para o lado”, estamos cada vez mais perto de perder os Direitos Fundamentais conquistados e de forma permanente. Na verdade, estamos a renunciar aos nossos direitos sem qualquer tipo de resistência ou debate, apenas porque é propagado repetitiva e insistentemente que “devemos acreditar na ciência” e que não temos outra escolha senão aceitar os certificados digitais, e isto, se quisermos ter de volta as “nossas vidas” ou, pelo menos, algo semelhante.

À primeira vista, aceitar os certificados digitais nas nossas vidas parece uma mudança trivial e sem consequências. Afinal de contas, depois destes cerca de dois anos de pandemia, todos estamos mais do que habituados a disponibilizar o nosso QR code para entrar em lojas comerciais ou participar em determinadas atividades. Mas não nos enganemos, a adoção universal e, possivelmente, permanente de certificados digitais, não será uma mudança nada trivial.

Aliada à iminente abolição geral da moeda física e à iminente implementação geral e obrigatória de uma moeda digital, é sim, uma inversão das características e fundamentos da liberdade em sociedades ditas democráticas e que pode vir a contribuir para uma restruturação radical e matricial da nossa civilização.

Tudo indica que a nossa liberdade pessoal não será mais restringida pelos limites da lei, mas sim, pelo nosso próprio smartphone, ou melhor, através de um sistema universal de identificação que, para além de registar e armazenar todos os nossos dados pessoais, pode ainda vir a ser utilizado para vigiar, autorizar ou restringir as nossas escolhas e opções e, com base nessas escolhas ou opções, para nos avaliar, qualificar e, se necessário, taxar ou punir, numa espécie de sistema de créditos sociais.

A participação em atividades banais diárias, como, por exemplo, ir a um restaurante ou a um concerto, beber um copo, andar de transportes públicos ou de avião, aceder ao local de trabalho, ou mesmo navegar na internet ou fazer comentários numa rede social pode vir a ficar dependente de autorizações concedidas através do nosso smartphone, autorizações essas que, de um dia para o outro, podem vir a ser retiradas, dependendo se o nosso comportamento corresponde ou não aos parâmetros pre-estabelecidos pelo Estado.

Quem julgar que, por estar dupla ou triplamente vacinado, não será alvo de vigilância ou controlo, encontra-se bastante equivocado. O conceito de “não-vacinado” é mutável. A Austrália, um país com cerca de 26 milhões de habitantes que se encontra, neste momento, a administrar a terceira dose à sua população (e a “debater” a quarta), assinou recentemente contratos para assegurar mais 85 milhões de doses, totalizando, assim, cerca de 280 milhões de doses já adquiridas desde o início da pandemia.

O número de doses adquiridas equivale a cerca de uma dose de reforço a cada seis meses, desde 2021 e durante os próximos quatro anos. Isto significa que, em caso de atraso na inoculação da dose seguinte ou mesmo de uma eventual nova vacina para combater uma eventual nova variante, os nossos privilégios podem vir a ser retirados e, como tal, não teremos autorização para participar em atividades que, repita-se, outrora eram consideradas banais e de livre acesso.

Com a excepção da implementação geral da moeda digital, cujo projecto ainda está em fase de desenvolvimento, escusado será dizer que este tipo de sistema de créditos sociais é já utilizado na ditadura comunista chinesa desde 2014, facto que é ou devia ser já bem conhecido do público em geral.

As políticas restritivas associadas ao combate da pandemia de COVID-19 podem vir a ser, portanto, um mero “cavalo de Troia”. Por detrás da aparente fachada funcional e benigna do certificado digital de vacinação pode residir um sistema de identificação digital maligno de créditos sociais, construído para, com o tempo, expandir-se para outros domínios, para todos os domínios da vida social, exterminando a vida íntima e privada, as escolhas pessoais.

Não é nenhum segredo que as grandes empresas de tecnologia utilizam este tipo de tecnologias para monotorizar, recolher e armazenar todas as nossas condutas on-line. Dados provenientes de chamadas telefónicas, correio electrónico, mensagens de texto enviadas e recebidas, publicações em redes sociais nas quais colocamos like, publicações partilhadas, anúncios publicitários ou videos vistos são recolhidos e armazenados para efeitos de criação de perfis psicográficos detalhados de cada pessoa.

Estes perfis não servem apenas para determinar que tipo de produtos preferimos comprar ou para influenciar as nossas escolhas ou necessidades, mas também, para determinar as nossas preferências políticas, as nossas opiniões e crenças, e até os nossos mais profundos impulsos ou mesmo receios.

Também não é novidade que essas empresas, que aparentam conhecer-nos melhor que nós próprios, partilham dados com entidades públicas, como, por exemplo, a NSA ou CIA, que, por sua vez, criaram programas ilegais e omnipresentes de vigilância em praticamente todo o mundo, sem crítica ou controlo. Cada pormenor das nossas vidas é, hoje, monotorizado e analisado, alegadamente com vista a garantir a segurança interna do Estado ou, simplesmente, para cumprir os termos de utilização de praticamente todos os serviços e em praticamente todos os sectores de actividade, financeira, bancária, seguradora, de saúde, alimentar, etc., etc..

Com a implementação universal e permanente de certificados digitais e de um sistema de créditos sociais, cada aspeto da nossa vida, além de ser monotorizado e controlado, pode ainda vir a ser avaliado, qualificado e alvo de punição automática e imediata. A título de exemplo e por ora caricatura, enquanto serão adicionados pontos pela manifestação de apoio a governos ou a determinado partido político, serão descontados pontos em caso de divergência. Imagine-se que, por indignação e pelo seu consequente impulso, decidimos criticar as políticas praticadas pelo nosso governo através de, por exemplo, uma publicação no Facebook ou metendo um mero like numa publicação que levanta questões legítimas sobre a narrativa autoritária. Não podemos, ou serão descontados pontos. Por outro lado, imagine-se que, ainda que com máscara, não cumprimos o distanciamento de dois metros em filas de espera. Também não podemos, pois serão descontados mais pontos. E assim sucessivamente…

Intuitivamente, todos sabemos que o simples ato de observar coloca pressão sobre o observado, especialmente quando este deve realizar determinada conduta ou cumprir determinadas regras ou normas. Basta pensar no efeito psicológico e disciplinador produzido por radares de velocidade ou mesmo por câmaras de CCTV em locais de comércio ou em vias públicas em centros urbanos. Mas nem sempre…

Ainda assim, muitas vezes, esse desejado efeito dissuasor acaba por ser ignorado. Quantas vezes desconsideramos o limite de velocidade e pensamos que, depois de notificados, podemos simplesmente contestar a contraordenação? Ou quantas vezes são praticados crimes em plenos centros urbanos, repletos de câmaras CCTV, como acontece, por exemplo, no âmbito da vida nocturna na zona do Bairro Alto, em Lisboa? Constata-se, pois, que, apesar de determinadas condutas poderem vir a ser penalizadas nos termos das atuais leis em vigor, tal penalização não é imediata e, na prática, os efeitos não são produzidos imediatamente na esfera do incumpridor.

É exactamente este cenário que o certificado digital, em conjugação com o sistema de créditos sociais, pode vir a alterar, com a implementação de um mecanismo que imediata e automaticamente (sem apelo nem agravo) disciplinará todos os dissidentes. Tanto é que, paralelamente, no âmbito da quarta revolução industrial (“Indústria 4.0”), os significativos e céleres desenvolvimentos tecnológicos, por exemplo, em termos de redes de registo descentralizado de dados (blockchain), big data, machine learning, inteligência artificial e robótica, entre outros, podem vir a disponibilizar as ferramentas necessárias para o efeito.

À medida que o nosso crédito social for descendo, o acesso a serviços essenciais do dia-a-dia pode vir a ser, simplesmente, recusado ou taxado de forma proibitiva. E caso a nossa conduta seja passível de punição, por exemplo, através de uma contraordenação, pode vir a ser automaticamente cobrado determinado valor em dinheiro digital da nossa conta bancária, mais uma vez sem apelo nem agravo. Não existindo fundos para o efeito, segue-se provavelmente também de forma automática e imediata a execução dos nossos bens, ou seja, da nossa propriedade privada. Sem apelo, nem agravo. Conforme recentemente publicou o World Economic Forum, até 2030, “you’ll own nothing, and you’ll be happy”.

Estaremos, assim, na sombra do COVID-19, sem pensamento, debate, discussão ou consentimento informado, a um passo de permitir a criação de um mundo totalitário de controlo e vigilância total e completa (um pouco à semelhança do mundo descrito em 1949, na obra 1984 de George Orwell), ironicamente consentido e recebido colectivamente (pela grande maioria) em nome da “saúde pública” e do “esforço colectivo” na batalha contra o “vírus”.

Á medida que o decisivo espaço de debate, diferenciação e inconformismo desaparecer, assim também desaparecerá a possibilidade de, colectivamente, conduzirmos a sociedade na direção que pretendermos. A liberdade, como a conhecemos atualmente em sociedades ditas democráticas, bem como aquelas que foram conhecidas por gerações anteriores, será trucidada, excepto para uns poucos privilegiados no topo da pirâmide. Ficaremos, assim, à mercê dos nossos donos. Aqueles que decidem se somos ou não merecedores de um green pass ou, melhor, aqueles que decidem se podemos ser incluídos na comunidade ou excluídos e segregados para as precárias margens da existência em sobrevivência.

Aqui chegados, somos tentados a pensar que, hoje em dia, neste mundo tecnológico e saturado de informação, as pessoas são demasiado livres, informadas e inteligentes para serem enganadas desta forma. Aliás, as pessoas podem ter caído no feitiço do fascismo e do totalitarismo no século passado, mas esta geração é demasiado sofisticada para cair em tal armadilha.

Mas será isto realmente verdade? Olhemos à nossa volta. Repare-se na censura. Repare-se na ténue diferença que existe entre a narrativa oficial e os meios de comunicação. Repare-se na tática do medo que se encontra a ser propagada para nos cercar, limitar, controlar e confinar. Repare-se na mentalidade de divisão que se começa a formar nas pessoas. Isto tudo, em menos de dois anos.

Não devemos, pois, subjugar-nos ao receio de ser considerados ou apelidados de negacionistas, obscurantistas ou, até mesmo, de falsos profetas. Devemos sim, recear a distopia consentida que nos aguarda caso não suceda urgentemente um despertar colectivo para esta iminente realidade.

Com o tempo, talvez daqui a uma geração ou duas, estaremos tão condicionados pelo contínuo olhar da vigilância (pelo Big Brother) e pelas recompensas e punições automaticamente emitidas e executadas, que passaremos até a vigiar e a denunciar-nos uns aos outros através dos nossos próprios dispositivos móveis, em jeito de automonitorização e autocensura, num ambiente antiutópico de submissão total.

A liberdade de que hoje usufruímos ou, pelo menos, a ilusão de liberdade que atualmente nos é concedida, pode vir a ser inimaginável para os nossos filhos, netos e todas as gerações que virão. Até porque esses, presumivelmente, podem vir a passar a maior parte das suas vidas confinados e conetados no metaverse