O número de pessoas que prefere perder ou comprometer seriamente a sua independência e autonomia pela promessa de um Estado protector é colossal. Muitos esquecem, no entanto, que quando transferimos a responsabilidade de cuidar de nós próprios para o Estado não só nos tornamos escravos de um poder autoritário como deixamos de pautar as nossas decisões pela ética e pela moral passando a admitir subconscientemente a coerção como modo de conduta. O Estado deixa de estar ao nosso serviço e passamos nós a servir o Estado.
A sofreguidão do Estado em controlar as nossas vidas não espanta. Mas o que é assustador é a quantidade de gente que o aceita passivamente. Ao prometer segurança, rendimento básico e subsídios às pessoas, o Estado compra a liberdade do indivíduo e garante a futura servidão deste perante o poder. Não há almoços grátis…
Neste quadro em que as pessoas suspeitam de si próprias mas creem na virtude dos agentes públicos, o colectivo torna-se mais importante que o indivíduo. Rapidamente se passa para a filosofia da criação de uma sociedade igualitária em que as diferenças de rendimentos se definem como sendo resultado da exploração dos mais fracos, vítimas, e que por isso o Estado deve compensar as disparidades por via da redistribuição da riqueza e através do seu poder coercivo.
Entra em cena o planeamento da economia e da sociedade através da “justiça social” que pressupõe tratamento desigual de diferentes indivíduos, na formas e quantidades que os poderes públicos entendem e definem como sendo as necessárias e que são determinadas por decisões tomadas ao sabor das circunstâncias.
O Estado chama a si a tarefa de conceder direitos a todos e que vão muito para além de acudir a situações de miséria e indigência objectivas. Mesmo necessidades comprovadas não justificariam conceder ajudas ilimitadas, mas o Estado faz mais do que isso e passa a determinar a “justa” posição dos indivíduos na sociedade, substituindo-se à ordem espontânea, livre cooperação e ao ajusto mútuo voluntário entre indivíduos.
O Estado nada produz e tudo aquilo de que dispõe é fruto do trabalho das pessoas. O que redistribui é algo que foi retirado a alguém, mesmo que não haja resistência da vítima. Ou seja, tira a uns para dar a outros o que decide unilateralmente ser o merecido.
Exemplo disso são as pensões e reformas. Estas são pagas com os rendimentos de quem está no activo e não com o dinheiro de quem se aposentou, ficando estes por vezes em situação mais confortável do que os que ainda trabalham.
O manhoso esquema de cobrança das contribuições obrigatórias para a segurança social tem o claro objectivo de levar o trabalhador a crer que o imposto que paga é uma poupança que está a ser acumulada e que poderá ser resgatada por inteiro na sua velhice.
Mas mesmo que o sistema em vigor fosse o da acumulação do capital de descontos de cada beneficiário, quantos teriam tido o tempo suficiente de contribuição para auferir das pensões que o Estado agora decidiu que seria justo receberem?
O Estado atribui a todos o “direito” ao conforto às custas daqueles que não têm ainda idade para se aposentar e que só não se reformam antes também eles porque não têm a garantia de receber o mesmo nível de benefícios. Não existe incentivo à poupança, nem as pessoas sentem necessidade de colocar de lado economias para a velhice. A solidariedade intergeracional mais não é, portanto, do que a geração anterior ser sustentada pela geração seguinte. Mas um dia o esquema de Ponzi estoura…
Se não fossem compulsivamente obrigados a “descontar” para a segurança social e tivessem a oportunidade de ter mais dinheiro disponível, as pessoas escolheriam o Estado para administrar as suas poupanças?
A boa intenção de ajudar as pessoas não legitima que uns poucos se arroguem ter autoridade sobre todos os outros indivíduos, nem a urgência em acudir a situações de necessidade justifica torcer princípios morais.
Ninguém tem o direito de tirar pela força o produto do trabalho ou a riqueza acumulada dos indivíduos, mesmo que com propósito de ajudar o próximo. O facto de democraticamente se atribuir ao Estado a missão de retirar a propriedade alheia não branqueia o facto de ser praticado um roubo, nem de quem tal permite participar numa ladroagem colectiva.
Se alguém se locupletar, pela ameaça da força, do património legitimamente acumulado de um indivíduo riquíssimo, mal-educado e profundamente egoísta para acudir com esse produto a uma pessoa que por circunstâncias várias da vida foi atirada para uma situação de provação, tal não deixa de ser um roubo, mesmo se o benefício trazido ao pobre for superior ao dano material causado ao rico.
Por outro lado, o estado não pode obrigar as pessoas a serem boas, caridosas ou compassivas. A virtude e a moral só existem se forem uma escolha livre e autónoma dos indivíduos em praticar o bem. A ética e a escala de valores variam de pessoa para pessoa. Impor um código de conduta moral aos outros é totalitário.
Mas importa dizer também que egoísmo e altruísmo não são antagónicos, pois sem tratar primeiro de nós mesmos não teremos condições de ajudar os outros. Ao obrigar coercivamente a solidariedade entre pessoas o Estado não só reduz perigosamente os incentivos para a criação de riqueza deixando-nos todos mais pobres, como também encoraja a que os beneficiários da ajuda se sintam no “direito” de ser ajudados, perpetuando a mendicidade.
A compaixão e o amor ao próximo não se praticam com o dinheiro de terceiros. Quando a responsabilidade individual é menosprezada, a liberdade individual é perdida. Não existe consciência social. A consciência é individual.
Se queremos uma sociedade mais digna, a tónica tem de ser dada não à sustentabilidade do nosso estado social, mas sim à necessidade de reconquistar a nossa liberdade individual. Devemos lutar para que os poderes e âmbito de actuação do Estado sejam drasticamente diminuídos e que nos deixem tratar das nossas próprias vidas.
O roubo não pode ser justificado pela causa da igualdade.
Licenciado em Relações Internacionais. MBA; telmo.azevedo.fernandes@gmail.com