Nas eleições para o Parlamento da UE está sempre em jogo o futuro desta organização. Uma das opções, o federalismo, é um perigo para o futuro da União Europeia. Cada vez que se avança na direcção do federalismo é mais uma fractura que se cria na construção de uma UE que deve estar ao serviço dos povos que nela queiram livremente participar.
Há quem julgue que “construção europeia” significa caminhar no sentido de uma UE federal. Nada mais errado. Apesar das intenções iniciais manifestadas quando o centro da Europa estava destruído, uma UE federal significaria hoje o abandono de tudo o que esta organização alcançou desde 1951. Pior do que isso, significaria a destruição da verdadeira democracia (não a socialista, que não é uma democracia).
A federalização da UE significaria que os portugueses, e os restantes povos dos países que participam nesta organização, seriam afastados de decisões que lhes dizem directamente respeito. E isso não é aceitável numa verdadeira democracia.
A tendência dos eleitores em escolherem cada vez mais partidos que contestam a centralização é uma evidência de que há muito que já está em perigo neste momento. O Brexit deveria ter servido de aviso para este perigo, mas em Bruxelas optou-se por fazer “ouvidos de mercador” e enterrar a cabeça na areia. Em vez de se assumir os erros cometidos são anunciadas “desgraças” para os britânicos como motivo para retirar legitimidade aos governos eleitos e às políticas públicas implementadas a nível nacional.
E cada vez que há eleições para o parlamento da UE, como as que vão ocorrer agora, voltamos a ouvir os mesmos “sermões”. O mais cómico é o que pretende que as eleições não devem servir para discutir assuntos nacionais, mas os da UE, como se as duas coisas fossem separáveis.
Os assuntos que se tratam em Bruxelas são assuntos nacionais por definição porque a participação na UE é, acima de tudo, um assunto nacional. Os defensores das tendências federalistas bem tentam escapar ao escrutínio quando fingem que estão a discutir assuntos que vão para além dos interesses nacionais, ou seja, da vontade dos portugueses.
Mas em verdadeiras democracias como as europeias, em que a legitimidade assenta numa base nacional, não existem assuntos que não se refiram ao interesse de cada país. Discutir o Pacto sobre Migração e Asilo é tratar de assuntos de interesse nacional como imigração e emigração. E ponderar o alargamento da UE é também uma questão nacional que abrange as barreiras ao comércio ou o livre movimento de pessoas e capitais. Dizer que não são assuntos que se referem às legitimas aspirações dos portugueses é pretender fugir ao escrutínio democrático.
Esta ideia é reforçada se pensarmos que os deputados eleitos para o parlamento da UE estão a representar interesses exclusivamente nacionais e não qualquer utopia difusa chamada “interesse da UE”. Se estivessem a representar qualquer interesse da UE que divergisse do interesse dos portugueses, as eleições não serviriam para nada e não faria sentido votar.
A elevada taxa de abstenção que estas eleições apresentam parece mostrar que muitos eleitores pensam que existem assuntos da UE que nada têm a ver com os assuntos nacionais. A responsabilidade por este alheamento sobre as eleições é dos federalistas que afirmam que os assuntos em causa são apenas do âmbito da UE. Por outras palavras dos que dizem que os assuntos das eleições não interessam à maioria dos portugueses.
Esta tentativa de separação entre assuntos nacionais e as eleições para o parlamento da UE serve também para que os federalistas proponham ideias bizarras. Nas eleições de há 5 anos, em 2019, abundavam ideias de carácter duvidoso como um ministro das finanças e um segundo orçamento para a zona Euro, uma pretensão federalista sem preocupação de legitimidade democrática que apenas vinha reduzir a transparência e aumentar a burocracia. Ou a proposta, inaceitável, de uma “agência europeia de proteção das democracias” em que supostos peritos nos defenderiam contra os ciberataques e “manipulações”. Há algo mais centralista do que uma agência de peritos a protegerem a Democracia? E quem nos protegeria dos peritos?
O perigo do federalismo fica bem demonstrado nas tentativas feitas por não nacionais em se imiscuírem nos assuntos que dizem exclusivamente respeito aos portugueses. A tentativa de acabar com o fim da unanimidade na definição de impostos ou na Política Externa e de Segurança Comum, ou a ideia de que a NATO deve ser menorizada por uma política de defesa na UE são exemplos de decisões federalistas que teriam consequências graves e imprevisíveis.
Mas há outros exemplos como a opacidade do funcionamento das instituições da UE e o seu distanciamento face às pessoas, o excesso de legislação e da burocracia em Bruxelas, a política industrial da Comissão Europeia que atribui subsídios às grandes empresas alemãs, francesas ou italianas, as tentativas de forçar os povos a aceitarem um “diktat” como a consagração do aborto como direito inalienável da mulher, ignorando o pai da criança, ou ainda o ridículo das tentativas para impor um fuso horário a Portugal.
A opção federalista não é mais do que fazer uma intentona para acabar com a legitimidade democrática nacional. Cada vez que se institui mais uma medida de cariz federal é mais uma racha que se abre dentro da organização que é a UE. E quanto maior o número de rachas e quanto mais elas se alargarem, mais gravemente será afectada a estrutura do seu edifício. Se nada mudar, chegará o dia em que o edifício desabará.