A presente legislatura termina e, em inevitável tempo de balanço, regresso ao seu início, para mim marcado pelo “princípio” do “fim” dos contratos de associação.

Quase quatro anos depois, sem pretender revisitar o complexo processo em si mesmo, parece-me haver já distanciamento para analisar a motivação e as consequências da decisão que o governo PS tomou, e tomou num momento concreto do tempo em que as escolhas políticas tiveram como critério decisivo o cimentar da relação com Bloco e PCP.

A motivação

Sobre esta matéria, a posição do Bloco e da CDU era conhecida há vários anos, a agenda ideológica destes partidos não só não era segredo como era bandeira desfraldada.

Já quanto ao PS o caso é diferente. Conviveu, em vários anos – no executivo e fora dele – com esta realidade, não questionando o princípio da contratualização e financiamento dos colégios, como parte da rede pública de educação.

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Talvez por isso não se encontre uma linha sobre contratos de associação quer no programa eleitoral do PS de 2015, quer no Programa do XXI Governo Constitucional, quer até nos acordos com Bloco, PCP ou Verdes.

De onde surge, então, esta “prioridade”? Viemos a descobrir, ao final de quatro anos, através de uma entrevista à sr.ª secretária de Estado Adjunta e da Educação (SEAE), Alexandra Leitão, que explica que “[esta medida] era algo que eu sabia que ía fazer assim que entrasse e que avisei que ia fazer a quem me convidou, porque não podia estar aqui e não a fazer (…) passar por este lugar e não o fazer não era para mim”.

Não se discute e legitimidade da sr.ª SEAE defender determinada uma linha ideológica. O que se deve questionar é que essa agenda não tivesse feito parte do escrutínio do voto e que não tenha sido declarada e apresentada com clareza — relembro que tudo se consumou através de instrumentos operacionais, como um aviso de abertura e um despacho, ao arrepio do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo e de contratos assinados no governo PSD/CDS.

As consequências

Comecemos pelo argumento financeiro. “Pouparam-se”, em três anos, 100 milhões de euros, segundo a SEAE que também afirmou que essa poupança foi parcialmente empregue na contratação dos mais de 10 mil mais professores que agora estão no sistema – note-se que, em muitos casos, são os mesmos que davam aulas nos colégios e que concorreram ao Estado, fazendo agora parte da sua despesa fixa.

Se essa aplicação foi “parcial”, deve perguntar-se que outro uso foi dado à “poupança”. Considerando que o investimento público na Educação tem sido despiciendo e que, ainda por cima, está muito abaixo em termos de execução – por isso não tem havido intervenção significativa na requalificação do parque escolar nem tão pouco na modernização tecnológica das escolas – resta a legítima dúvida sobre o impacto positivo desta medida que efetivamente reverteu para os alunos do sistema público.

Depois o argumento da diversidade. O Governo et al propaga a ideia de que, nos locais em que cessaram as turmas em contrato de associação, o “tecido social das escolas públicas mudou para melhor”. Pode ter acontecido em alguns casos, não questiono, mas os factos também nos demonstram que já fecharam 10 destas escolas (prevendo-se o encerramento de mais 15) porque os pais por elas servidos não têm capacidade económica para pagar uma mensalidade e que, ao mesmo tempo, o setor privado tem vindo a crescer, representando já 20% do sistema educativo. Estes factos conjugados sugerem que estes colégios perderam a diversidade, tendo saído, sem escolha, aqueles que não podem pagar.

Quatro anos depois, acaba por ser a própria SEAE quem explica de forma cristalina esta decisão de política pública:

A partir do momento em que a demografia se inverteu (…) o que foi extremamente injusto de verificar foi sentir que, à falta de alunos, os mesmos alunos eram assegurados aos colégios com contrato de associação e era a escola pública que ficava sem alunos. (…) Fui recebida por um conjunto de diretores e professores que me ajudaram muito (…) que disseram ‘finalmente alguém percebe que os outros continuam a florescer e nós a morrer porque não há procura para isto tudo’”.

O problema é real e vai agravar-se: não há procura que chegue para todas as escolas do país, porque a demografia está a reduzir significativamente o número de alunos. Só que a solução determinada não foi validar qual a melhor escola para os alunos (e fechar a outra), mas antes, e sem avaliação factual, decretar que só a escola do Estado pode ser a boa escola.

Uma decisão que, sabemos hoje, era condição assumida entre a sr.ª SEAE e quem a convidou para o cargo, ainda que não estivesse presente nos compromissos do PS com os seus eleitores, nem do Governo com os cidadãos.

Uma decisão que põe o Estado antes das pessoas. A antítese do que defendo, o fim do princípio que o CDS representa.

PS – Enquanto escrevo este artigo, recebemos a notícia do encerramento do Colégio da Imaculada Conceição (CAIC), em Cernache. Um colégio da Companhia de Jesus, com 64 anos de história, que serviu a comunidade local com tremenda aceitação e frutos. Fecha porque “a insustentabilidade financeira do CAIC tornou-se uma evidência incontornável, (…). Paralelamente, a realidade sociológica, económica e cultural em que o colégio se insere, bem com a tendência para a redução da natalidade em toda a região, tende a reforçar as fracas expectativas de que a procura pela oferta educativa do CAIC venha a aumentar de forma sustentada nos próximos anos, apesar de todo o empenho e esforços.” Registo que fecha hoje uma boa escola porque o PS, o Bloco, o PCP e os Verdes assim o determinaram. Sem atender aos pais, aos alunos, aos professores e funcionários, que agora ficarão sem projeto educativo, sem escola, sem emprego.

Deputada do CDS-PP